terça-feira, 12 de janeiro de 2010

Explosão de biodiversidade explicada
Microfósseis de conodontes revelam variações da temperatura do mar há quase 500 milhões de anos


A história de nosso planeta foi marcada por vários momentos em que houve um notável aumento da biodiversidade. Um desses episódios ocorreu durante o período Ordoviciano, entre 490 e 443 milhões de anos atrás. Nesse momento, surgiram os principais grupos que dominaram os mares durante os 250 milhões de anos seguintes, como subgrupos de braquiópodos, equinodermas, trilobitas e corais.

Esse aumento da biodiversidade já era conhecido pelos pesquisadores, mas os fatores por trás dele ainda não eram bem compreendidos. Chegou-se a postular que a queda de um asteróide poderia ter influenciado esse fenômeno. Agora, o mistério – ou pelo menos parte dele – acaba de ser resolvido com um trabalho conduzido por Julie Trotter, da Universidade Nacional da Austrália (Canberra), e publicado na prestigiosa revista científica Science.

A conclusão veio de análises isotópicas realizadas em fósseis de um grupo de animais marinhos do Ordoviciano – os conodontes. A partir desse estudo, o grupo de Trotter concluiu que a temperatura dos mares teria diminuído dos cerca de 40ºC que havia há 490 milhões de anos até valores semelhantes aos atuais (entre 32 e 27ºC) entre 470 e 445 milhões de anos atrás.

Já no final do Ordoviciano (depois de 445 milhões de anos), houve um novo resfriamento dos mares (para menos de 26 ºC), o que desencadeou uma extinção em massa. Não custa lembrar que, naquele momento, os vertebrados eram escassos e ainda não haviam conquistado a terra firme, e que, nos mares, os conodontes eram o grupo mais comum.

Ilustres desconhecidos

Mas o que são afinal esses organismos? Talvez o leitor não acredite, mas ninguém sabia ao certo até há bem pouco tempo. O grupo Conodonta, muito abundante em depósitos marinhos do Cambriano ao Triássico, é conhecido desde 1856. Seu nome é derivado da união dos termos gregos kônos (= cone) e odontos (= dentes).

Até recentemente, esses vertebrados eram conhecidos apenas por pequenas estruturas compostas de apatita (fosfato de cálcio) assemelhadas a dentes (daí o nome), com tamanho entre 0,25 e 2 milímetros. Esses microfósseis têm sido estudados já há bastante tempo e funcionam como uma importante ferramenta na datação relativa de rochas sedimentares e na indústria do petróleo.

Por muito tempo, os pesquisadores debateram se os elementos conodontes pertenciam a vermes, moluscos ou mesmo a plantas. Para se conhecer a resposta, foi preciso esperar até 1983, quando foram encontrados os primeiros registros completos desses animais, mais precisamente de rochas do Carbonífero inferior (com cerca de 340 milhões de anos) da Escócia.

Esses achados estabeleceram que aquelas estruturas pertenciam a peixes bem primitivos, de corpo alongado semelhante ao de vermes, mas com notocorda, estruturas parecidas com barbatanas e um par de olhos bem desenvolvidos. Em geral, os conodontes possuem um tamanho em torno de 4 cm – quase um terço do comprimento de uma caneta esferográfica. Apesar de raros, espécimes completos também foram registrados nos Estados Unidos e na África. No Brasil, elementos conodontes são encontrados particularmente na bacia do Amazonas.

Técnicas e equipamento precisos

Apesar do diminuto tamanho desses seres, a equipe de Julie Trotter conseguiu realizar os estudos isotópicos em mais de 100 exemplares coletados de 20 depósitos distintos, graças a técnicas e equipamentos cada vez mais precisos.

Com isso, foi possível obter uma melhor avaliação da variação da temperatura do mar durante o Ordoviciano. Agora é necessária uma amostragem mais ampla que mostre se a variação foi global ou se há regiões que divergem e como isso se refletiu na biodiversidade.

Como se pode perceber com esse estudo, a vida nos diferentes períodos geológicos era bem distinta. Mesmo que os conodontes tivessem tamanho minúsculo, a contribuição científica que eles trouxeram para o entendimento das variações que ocorreram no nosso planeta pode ser considerada gigantesca! Em resumo, nem só de dinossauros vive o paleontólogo...


Alexander Kellner
Museu Nacional / UFRJ
Academia Brasileira de Ciências
05/08/2008

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