sexta-feira, 9 de setembro de 2011

Parentes de 1,977 milhão de anos

Espécie de hominídeo descoberta na África do Sul é mais antiga do que se estimava. Segundo estudo publicado na ‘Science’, o ‘Australopithecus sediba’ viveu antes de qualquer indivíduo do gênero ‘Homo’ conhecido até hoje.
Por: Célio Yano
Publicado em 08/09/2011 | Atualizado em 08/09/2011
Parentes de 1,977 milhão de anos
A geóloga Robyn Pickering com amostra da rocha que permitiu a datação dos fósseis de ‘Australopithecus sediba’. Os ossos foram encontrados em uma caverna da África do Sul em 2008. (foto: Warrick Joe)
Os dois fósseis da espécie Australopithecus sediba, apresentada no ano passado como possível ancestral do homem, são mais antigos do que se pensava. Ambos têm 1,977 milhão de anos, com margem de erro de dois mil para mais ou para menos. A estimativa anterior sugeria entre 1,95 milhão e 1,78 milhão de anos.
A nova datação, bastante precisa em termos paleontológicos, foi feita por um grupo de pesquisadores liderado pela geóloga Robyn Pickering, da Universidade de Melbourne, na Austrália. O dado, que será publicado amanhã (9/9) na revista Science, revela que esse hominídeo primitivo viveu na mesma época em que as primeiras espécies do gênero Homo surgiram.
Outros quatro artigos publicados na mesma edição da revista revelam novos detalhes de cérebro, pélvis, mãos e pés de A. sediba e mostram que várias características presentes no Homo sapiens já se manifestavam no australopiteco. Mas os paleontólogos pedem cautela aos ansiosos por saber de onde viemos: nada disso garante que A. sediba seja ancestral direto do homem.
Os paleontólogos pedem cautela aos ansiosos por saber de onde viemos: nada disso garante que A. sediba seja ancestral direto do homem
Outras espécies hominídeas primitivas, como Homo habilis e Homo rudolfensis, também apresentam características morfológicas que indicam uma evolução para Homo erectus, a mais antiga espécie que se comprovou ser ancestral do homem e que teria surgido por volta de 1,9 milhão de anos atrás.
Como explicam os autores do trabalho, nenhuma das três espécies (A. sediba, H. habilis e H. rudolfensis) tem um conjunto completo dessas características, mas, quando vistas conjuntamente, as três parecem formar ‘um mosaico adaptativo’.
“Parte do problema é que os registros fósseis de H. habilis e H. rudolfensis são incompletos”, explica à CH On-line o paleoantropólogo Darryl de Ruiter, um dos autores do trabalho e integrante da equipe que descreveu os fósseis de A. sediba. “Embora tenhamos crânios e dentes dessas duas espécies do gênero Homo, sabemos muito pouco sobre seus esqueletos, o que torna difícil a comparação com os ossos de A. sediba.”
Ruiter lidera um grupo na Universidade Texas A&M, nos Estados Unidos, que está trabalhando na comparação entre crânios e dentes de todas essas espécies. “Esperamos ter uma resposta mais detalhada [sobre a linha evolutiva do homem] em breve.”

Datação precisa

Para o paleontólogo Alexander Kellner, pesquisador do Museu Nacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro e colunista da CH On-line, a grande importância da pesquisa está no trabalho preciso de datação dos fósseis.
A confirmação de ancestralidade entre uma espécie e outra só pode ser feita a partir de características anatômicas e nada tem a ver com a relação de idade entre elas
“Mas a confirmação de ancestralidade entre uma espécie e outra só pode ser feita a partir de características anatômicas e nada tem a ver com a relação de idade entre elas”, diz. A. sediba pode ter sido um antecessor de H. habilis ou H. rudolfensis, ou ter evoluído diretamente para H. erectus.
Os fósseis de A. sediba apresentados no ano passado foram descobertos em 2008 na caverna Malapa, localizada no chamado ‘berço da humanidade’ – um conjunto de sítios arqueológicos próximo a Joanesburgo, na África do Sul. Os ossos pertenciam a dois indivíduos – uma mulher adulta e um menino que teria entre 10 e 13 anos de idade.
Para estimar o tempo que os corpos jazeram no local, os pesquisadores fizeram a datação de rochas próximas, inicialmente utilizando uma técnica conhecida como urânio-chumbo. Esse procedimento consiste na medição da quantidade de energia emitida por elementos radioativos ao longo dos milhares de anos.
Robyn Pickering prepara rochas
Robyn Pickering prepara rochas para o processo de datação urânio-chumbo na Universidade de Melbourne, na Austrália. (foto: Warrick Joe)
O passo seguinte foi analisar os registros de reversões paleomagnéticas, períodos da história da Terra em que os polos norte e sul invertem suas posições relativas. “Houve um evento de reversão de aproximadamente 3 mil anos de duração que ocorreu exatamente entre as datas que obtivemos na datação por urânio-chumbo”, explica Darryl de Ruiter. “Isso nos permitiu fazer a datação de forma extraordinariamente precisa.”

Hominídeo de transição

A. sediba representa uma forma de hominídeo de transição entre os gêneros Australopithecus e Homo. Enquanto o primeiro grupo é caracterizado por um cérebro pequeno, braços longos e um bipedalismo relativo (embora pudesse se sustentar sobre os pés, utilizava os braços para caminhar), o segundo tem cérebro grande, braços mais curtos que as pernas e bipedalismo completo.
A. sediba
Um dos dois crânios do 'A. sediba' encontrados na África do Sul. O fóssil tem 1,977 milhão de anos. (foto: Brett Eloff e Lee Berger/ Universidade de Witwatersrand)
Por causa dessa diferenciação é que A. sediba foi incluído no gênero Australopithecus. “Mas, ao mesmo tempo, ele apresenta características do Homo, como um cérebro reorganizado, ainda que pequeno, uma pélvis com formato mais próximo ao do homem do que ao de qualquer australopiteco, mãos com polegares longos e pegada precisa, e o osso do tornozelo igual ao humano”, diz Ruiter.
Tudo isso levou os pesquisadores a considerarem A. sediba o último australopiteco que antecedeu o gênero Homo.

Célio YanoCiência Hoje On-line/ PR

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