segunda-feira, 22 de julho de 2013

 Homem não caçava megafauna no Brasil

Edição 209 - Julho de 2013

© INDIANA STATE MUSEUM
Tigre-dente-de--sabre: extinção deve ter sido causada por mudança climática
Tigre-dente-de–sabre: extinção deve ter sido causada por mudança climática

Algumas espécies de animais que compunham a extinta megafauna, como preguiças terrestres gigantes e tigres-dentes-de-sabre, viveram próximas aos primeiros habitantes do Brasil por mais de mil anos no Sudeste, sobretudo em Minas Gerais e São Paulo, durante o final do Pleistoceno.

 Apesar dessa longa coexistência cerca de 11 mil anos atrás, não há nenhuma evidência confiável de que o homem caçou esses animais de forma sistemática no território nacional ou mesmo na América do Sul, ao contrário do que ocorreu na América do Norte, onde mamutes e mastodontes foram presas constantes das populações humanas. Essa é a conclusão de um estudo de revisão feito por pesquisadores brasileiros, que analisaram dados e datações referentes a 33 fósseis de megafauna encontrados no país (Earth-Science Reviews, março de 2013). “Isso indica que o desaparecimento da megafauna no território nacional provavelmente não teve nenhuma relação direta com a chegada do ser humano, como algumas hipóteses para essa extinção sugerem”, diz o arqueólogo Mark Hubbe, da Universidade Estadual de Ohio, um dos autores do estudo, ao lado de seu irmão, Alex Hubbe, que faz pós-doutorado da Universidade de São Paulo (USP). Os autores acreditam que a extinção dos animais deve ter sido desencadeada por uma mudança climática.

Registros do Cretáceo

Algas ajudaram a preservar pegadas de dinossauro na Paraíba 

IGOR ZOLNERKEVIC | Edição 209 - Julho de 2013
© FABIO COLOMBINI
Trilha fossilizada no Vale dos Dinossauros, no município de Sousa
Trilha fossilizada no Vale dos Dinossauros, no município de Sousa

Para quem quiser deixar uma marca duradoura de sua existência na Terra, fica a dica: caminhe à beira de um lago, onde houver lama ou areia fina e molhada, coberta de limo. Centenas de dinossauros fizeram isso, e suas pegadas permanecem intactas, gravadas nas rochas do sertão nordestino, no município de Sousa, interior da Paraíba, graças à ação das algas verdes e azuis do limo onde pisaram há mais de 100 milhões de anos.

A conclusão é dos paleontólogos Ismar Carvalho, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), e Giuseppe Leonardi, do Instituto Cavanis, em Kinshasa-Ngaliema, na República Democrática do Congo. Em parceria com o geólogo Leonardo Borghi, da UFRJ, eles apresentaram, em artigo publicado em maio deste ano na revista Cretaceous R  esearch, a primeira prova material da importância do limo na preservação de pegadas fósseis. O filme gelatinoso criado pelos microrganismos crescendo sobre a lama pisada teria impedido que as pegadas fossem apagadas pelo vento e pela chuva, antes que ela endurecesse e fosse recoberta por uma nova camada de sedimento que a protegeria da erosão.

“É incrível como microrganismos ajudaram a registrar a vida de alguns dos maiores animais que já viveram”, comenta Leonardi, considerado um dos principais especialistas em icnologia, o estudo de marcas deixadas por animais extintos, os chamados icnofósseis, para determinar sua postura e comportamento. Foi por meio de pegadas, por exemplo, que os paleontólogos deixaram de montar incorretamente os esqueletos fósseis nos museus. Antigamente achava-se que os dinossauros andavam como os crocodilos, arrastando o ventre e a cauda no chão. As pegadas, no entanto, mostram que as criaturas andavam com a cauda e corpo suspensos, com seu peso distribuído igualmente sobre as patas.
As pegadas de Sousa foram descritas pela primeira vez em 1924, pelo engenheiro de minas Luciano Jacques de Moraes. O estudo dessas marcas, entretanto, só começou em 1975, quando Leonardi passou um ano explorando a região. Nascido na Itália em uma família de geólogos e paleontólogos, Leonardi, 74 anos, sempre dividiu seu tempo entre a carreira de pesquisador e a de padre católico. Ele se prepara para lançar um livro sobre Sousa, escrito em colaboração com Carvalho, ao mesmo tempo que atua na educação de crianças no Congo.



As rochas de Sousa se formaram a partir de sedimentos acumulados em um vale aberto no início da separação entre a América do Sul e a África, no começo do chamado período Cretáceo. Entre 142 milhões e 130 milhões de anos atrás, o vale abrigava rios e lagos, atraindo a fauna da região. Sua lama transformada em rocha registrou a passagem de quase 400 indivíduos — dinossauros, crocodilos, sapos e tartarugas. Também há marcas de ondulações produzidas por água corrente e até pequenos buracos criados por gotas de chuva.

Cenas do passado

Não há, porém, ossadas fósseis em Sousa, ao contrário do que ocorre na bacia sedimentar vizinha do Araripe, no Ceará, local da descoberta de muitos dinossauros do Cretáceo. Leonardi explica que os sedimentos e o ambiente das bacias eram distintos. O ambiente mais ácido de Sousa corroía os ossos, enquanto no Araripe enxurradas arrastavam e soterravam rapidamente as carcaças dos animais, mantendo os ossos em condições favoráveis à petrificação.

“Em geral, os fósseis são registros da morte, enquanto as pegadas são registros da vida”, afirma Carvalho. Dificilmente as pegadas permitirão identificar a espécie do animal que as produziu. Mesmo assim, os pesquisadores conseguem classificá-las de acordo com certos grupos de dinossauros e, em locais onde há muitas delas, podem reconstruir cenas do passado.

© ARIEL MILANI MARTINE
O cotidiano dos dinossauros de Sousa lembra a vida dos grandes mamíferos das savanas africanas de hoje. Há trilhas feitas por bandos numerosos de saurópodes, imensos herbívoros quadrúpedes, semelhantes aos brontossauros. Em certo local é possível notar que um saurópode adulto diminuiu sua marcha para acompanhar o passo de um filhote. Em outros pontos, esses bandos são perseguidos por pequenos grupos de terópodes, carnívoros bípedes parecidos com tiranossauros ou velocirraptores. Mais ativos que os herbívoros, os terópodes deixaram mais pegadas registradas, apesar de provavelmente terem sido em menor número.

“Essas marcas são estruturas tão delicadas, tão fáceis de serem apagadas pelas intempéries”, diz Carvalho. “Queríamos entender como foram preservadas.” Segundo ele, os pesquisadores costumavam concordar que, para as pegadas serem preservadas, bastava que o sedimento onde estavam impressas tivesse certas características especiais. Ele deveria ser fino, úmido e plástico na medida certa, como a argila. Todos os estudos experimentais feitos até agora, porém, demonstram que isso muitas vezes não é o suficiente.

De uma década para cá, começaram a aparecer evidências de que as pegadas menos erodidas são aquelas cobertas por limo. Em 2009, por exemplo, um grupo de arqueólogos suíços observou exatamente isso ao estudar o endurecimento de pegadas humanas impressas há poucos anos na beira de lagos no Caribe e no Oriente Médio. Carvalho notou algo semelhante na Região dos Lagos, no Rio de Janeiro. Outros paleontólogos começaram a suspeitar de que as chamadas esteiras microbianas que compõem o limo funcionariam como uma cola entre os grãos do sedimento, preservando os traços das pegadas, além de os protegerem contra o vento e a chuva. Os microrganismos ajudariam ainda na petrificação, acumulando o cálcio que endurece o sedimento.
Carvalho e seus colegas descobriram a primeira evidência material do fenômeno ao analisarem ao microscópio as lâminas de rochas extraídas de um poço na Fazenda Cedro, em Sousa. Encontraram várias camadas de microbialitos, um tipo de rocha formado a partir dos restos de esteiras microbianas do Cretáceo.

Outra evidência indireta é a presença em Sousa de fósseis de conchostráceos, um crustáceo protegido por duas conchas, aparentado de caranguejos e camarões.

Os conchostráceos existem até hoje e quase nunca ultrapassam meio centímetro de comprimento. Uma das espécies de Sousa, porém, atinge 4,5 centímetros.

Carvalho acredita que os conchostráceos de Sousa cresceram tanto por conta do ambiente de águas quentes, calmas e ricas em nutrientes que favoreceram a proliferação das esteiras microbianas nas margens dos lagos onde os dinossauros pisavam.

Mais limo, mais detalhes

As pegadas mais ricas em detalhes, que vistas bem de perto revelam de marcas de unhas a ranhuras da planta das patas e dos dedos, seriam aquelas formadas onde as esteiras teriam crescido mais. O limo teria ajudado a preservar também as rebordas que aparecem em volta de algumas pegadas. As rebordas são feitas da lama espirrada quando o animal pisou e podem informar seu peso.
Além do sedimento argiloso e das esteiras microbianas, os ciclos de deposição dos sedimentos seguindo as estações secas e chuvosas também ajudou a preservar as pegadas em Sousa. Pegadas eram gravadas e endurecidas durante a estação seca, para então serem enterradas por uma nova camada de sedimento trazida pelas chuvas. A nova camada serviria então de substrato para gravar mais pegadas na estação seca seguinte. Em um local conhecido como Passagem das Pedras, em Sousa, Leonardi escavou 25 dessas camadas com pegadas, produzidas por variações cíclicas na borda de um lago.

Carvalho, cuja pesquisa tem apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj) e do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), espera agora examinar lâminas de rochas de outros lugares do mundo com pegadas fósseis. O maior deles fica em Sucre, na Bolívia. “Tenho quase certeza de que os microbialitos estão presentes lá”, diz.

“As esteiras microbianas estão na moda”, comenta o paleontólogo Marcelo Adorna Fernandes, da Universidade Federal de São Carlos, cujo laboratório possui a maior coleção de icnofósseis do país, muitos deles coletados no interior paulista, principalmente em Araraquara, onde foram descobertas pegadas até em rochas das calçadas da cidade. Fernandes conta que espera analisar em breve o que ele acredita ser rastros deixados por invertebrados ao rasgarem esteiras microbianas crescendo no fundo dos lagos glaciais, que deram origem às rochas sedimentares conhecidas como os varvitos de Itu.

Artigo científico

CARVALHO, I. et al. Preservation of dinosaur tracks induced by microbial mats in the Sousa Basin (Lower Cretaceous), Brazil. Cretaceous Research. Publicado on-line. 10 mai. 2013.

Tamanho não é documento

Espécie pré-histórica de dente-de-sabre foi um superpredador, mas sua mordida era tão fraca quanto a de um gato 

RODRIGO DE OLIVEIRA ANDRADE | Edição Online 14:30 12 de julho de 2013
© CLAIRE HOUCK/WIKICOMMONS
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Crânio do Thylacosmilus atrox: seu enorme dente canino era maior que o de qualquer outra espécie dente-de-sabre

Um grupo de pesquisadores da Austrália e dos Estados Unidos deu um passo importante na compreensão do comportamento de caça do Thylacosmilus atrox, espécie pré-histórica de dente-de-sabre que habitou a América Latina, sobretudo a região da Argentina, há 3,5 milhões de anos. Com base em modelos computacionais tridimensionais, eles examinaram o desempenho biomecânico do animal ao atacar suas presas. Esses modelos foram digitalizados e, em seguida, submetidos a um software que simulou a força de sua mordida.

Os resultados foram comparados com os do Smilodon fatalis, o famoso e emblemático tigre-dente-de-sabre, extinto há 10 mil anos, e do leopardo que conhecemos hoje. Concluíram que a musculatura da mandíbula das duas espécies com dentes-de-sabre eram fracas quando comparadas à do leopardo, mas a do T. atrox surpreendeu. Apesar do tamanho – em torno de 1,5 metro e 100 quilogramas (kg) – e dos enormes dentes caninos superiores, sua mordida era tão ou mais fraca que a de um gato doméstico.
De acordo com o artigo, publicado na edição de junho da revista PloS One, isso era compensado, porém, pelos músculos de seu pescoço, responsáveis justamente pela movimentação de seus dentes gigantescos. “Os músculos da mandíbula do T. atrox eram constrangedores”, afirma Stephen Wroe, pesquisador da University of New South Wales, na Austrália, e autor principal do estudo. “Mas seu desempenho biomecânico durante as simulações sugere que ele, assim como o Smilodon fatalis, era bem adaptado às forças geradas pelos músculos de seu pescoço”.

Ele explica que seus enormes dentes, cujas raízes podiam se estender até a caixa craniana, eram frágeis. Por isso, o animal precisava abater suas presas rapidamente, de modo a não comprometer os caninos. Assim, o T. atrox tinha de imobilizá-las usando os antebraços. Em seguida, numa mistura de força e precisão, valia-se de sua poderosa musculatura e inseria os dentes na traqueia da vítima, atingindo suas artérias. “Presas de grande porte são perigosas, mesmo para superpredadores. Por isso, quanto mais depressa elas são abatidas, menores serão as chances de o predador se machucar ou de atrair a atenção de outros concorrentes”, disse o pesquisador.

Apesar da semelhança, o T. atrox não tem parentesco evolutivo com o Smilodon fatalis, o representante máximo dos mamíferos superpredadores. Na verdade, explica Wroe, o Smilodon é resultado de um de pelo menos cinco “experimentos” independentes registrados na história evolutiva dos dentes-de-sabre no decorrer da Era dos Mamíferos, que se estende por cerca de 65 milhões de anos.
“Essas duas espécies estão separadas por pelo menos 125 milhões de anos de evolução”, afirma Wroe. Trata-se de um caso clássico de convergência evolutiva, fenômeno em que duas ou mais espécies, independentemente, desenvolvem características semelhantes. “Sabe-se hoje que, do ponto de vista evolutivo, os T. atrox tem os marsupiais como parentes mais próximos”, explica.

Artigo científico

WROE, S., et al. Comparative Biomechanical Modeling of Metatherian and Placental Saber-Tooths: A Different Kind of Bite for an Extreme Pouched Predator. PloS One. v.8. jun. 2013.

BBC - O Que Nos Torna Humanos?

Título Original: BBC - What Makes Us Human?
Gênero: Biologia | Ciências | Filosofia
Tempo de Duração: 59 min
Ano de Lançamento: 2013

A Professora Alice Roberts está grávida de seu segundo filho mas, antes dele nascer, ela quer descobrir o que nos torna humanos? Os seres humanos partilham 99% do DNA com os chimpanzés e, no entanto, desde o momento do nascimento, nossas vidas são completamente diferentes. Então, seriam os humanos apenas outro animal, ou há algo de especial em ser humano?
Antes de que que seu bebê possa vir ao mundo, a Professora Roberts parte para explorar o que há em nossos corpos, em nossos genes, e, derradeiramente, em nossos cérebros, que nos diferenciam completamente de nossos parentes peludos. Afinal, o que realmente nos torna humanos?
Interessante sempre e nos faz pensar longe. . ..
Pense a respeito @:)
Bom aprendizado!
 
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terça-feira, 16 de julho de 2013

DOCUMENTÁRIO

Série; A Aventura da Vida: Evolução - BBC

Sinopse
 
Mais de 10 milhões de espécies fazem da Terra um planeta extraordinariamente vivo. Nesta superprodução da BBC, você percorrerá todos os caminhos trilhados pela evolução, do surgimento dos primeiros microorganismos nos oceanos até o aparecimento do homem. Prepare-se para a maior e mais espetacular de todas as aventuras: a Aventura da Vida.
Episódio 1: Mares de vida
Baleia azul: o maior animal que já habitou o planeta
Peixe-bruxa: a criatura que transforma água em gosma
Tubarões: caçadores perfeitos, obras-primas da evolução
Peixe-sapo: as mandíbulas mais poderosas da natureza
Golfinhos: mamíferos marinhos de inteligência apurada
Episódio 2: A conquista da terra
Rastro ancestral: pegadas deixadas há 500 milhões de anos
Caranguejos: herdeiros dos primeiros animais terrestres
Peixe-morcego: a aparência bizarra de um peixe com patas
Sapos: eles defendem a prole como nenhum outro animal
Iguanas e camaleões: verdadeiros dinossauros em miniatura
Episódio 3: Nascidos para voar
Insetos: os primeiros seres que conseguiram levantar vôo
Libélulas: ases indomáveis há mais de 300 milhões de anos
Pterossauro: monstro voador do tamanho de uma asa-delta
Beija-flores: “insetos com plumas” movidos a néctar
Cisne: a decolagem de uma das aves mais pesadas do mundo
Episódio 4: Vivendo juntos
Sexo: sem ele, o mundo seria extremamente chato e sem graça
Atração: por que as fêmeas preferem machos fortes e bonitos
Predadores e presas: a eterna batalha pela sobrevivência
e mais: animais ilusionistas, estratégias de caça, parasitas, vírus
Episódio 5: Seres Humanos
Bebês: por que nossos “filhotes” são tão frágeis e vulneráveis?
Comunicação: como nos tornamos animais falantes?
Engenharia genética: conseguiremos criar humanos perfeitos?
e mais: nosso parentesco com os macacos, o poder do cérebro.
 
Informações
 
Tamanho: 700 MB (cada)

Legendas: Português

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Por que todos os macacos não evoluíram para humanos?



Uma das perguntas que mais se ouve sobre a evolução humana é: “se o homem evoluiu do macaco, por que os macacos não evoluíram para humanos?”. Essa pergunta pode parecer que faz sentido para um leigo que pensa que os humanos são o pináculo da evolução, mas não tem lógica para biólogos. É o equivalente a perguntar “por que todas as bananas não evoluíram para maçãs?”.
Os seres humanos não evoluíram de macacos, orangotangos, gorilas ou chimpanzés. Somos todos – humanos, gorilas, símios, orangotangos – espécies modernas que seguiram diferentes caminhos evolutivos, apesar de termos compartilhado um ancestral comum com alguns primatas, como os símios africanos.
A linha do tempo da evolução humana é longa e controversa, com lacunas significantes. Os especialistas não chegaram a um acordo sobre a maioria dos pontos de início e fim de várias espécies, então o gráfico envolve estimativas importantes.
Dizer que somos mais “evoluídos” que nossos primos peludos é um erro do ponto de vista biológico – experimente ver quanto tempo você dura pelado no coração do Congo sem sequer uma faca, e então volte para dizer quem é que está em vantagem evolutiva. Nesse e em muitos outros casos, a evolução não “conduz” os outros símios a se tornarem mais humanos. Portanto, é um erro pensar que somos o ápice da evolução, ou o objetivo da evolução dos outros animais. Os macacos, orangotangos e outros primatas não foram extintos pela mesma razão que todo o resto da vida no planeta: são adaptados a seus respectivos ambientes.
A ideia que macacos querem todos ser humanos é pretensiosa demais e está enraizada no conceito fundamentalmente errado de que os seres existem para evoluir e os humanos seriam o ápice da vida animal. A evolução maximiza a reprodutividade, não inteligência. Os símios pelo mundo ainda existem porque seu ambiente encorajou o sucesso reprodutivo de indivíduos com material genético diferente do nosso.
A ideia de que uma espécie vive para evoluir é colocar o carro na frente dos bois. Mutações genéticas acontecem o tempo todo, sem fanfarra e geralmente sem nenhuma mudança mensurável no estilo de vida do organismo. Em geral, as mutações que têm mais probabilidade de serem passadas para as futuras gerações são as que são úteis para a sobrevivência do indivíduo ou da espécie.


A “utilidade” de uma mutação depende bastante de fatores ambientais como comida, predadores e clima, além de pressões sociais. A evolução é uma questão de preencher nichos ecológicos e sociais.


Em resumo, a evolução é um processo contínuo de tentativa e erro, do qual os primatas modernos ainda fazem parte — assim como as bananas e as maçãs — mas cada um está sujeito às pressões do seu ambiente natural e social próprios, e são estas pressões que fazem a diferença na evolução, além das mutações.

O que é Seleção Natural?




A seleção natural é um dos núcleos da Teoria Sintética da Evolução, mas muita gente não sabe exatamente o que ela é.
Nas palavras de Stephen Jay Gould, a seleção natural é mal compreendida, mal ensinada e mal citada, o que gerou muitos equívocos, sendo o pior deles o darwinismo social: a ideia de que a ciência poderia ser utilizada para justificar a eliminação sistemática de grupos humanos “indesejados”.
Confira aqui alguns fatos sobre essa teoria famosa:

1 – A Teoria da Seleção Natural não nasceu junto com a Teoria da Evolução
 
Charles Darwin, quando começou a esboçar sua Teoria da Evolução em 1842, não estava inventando nada novo. Outros já haviam demonstrado o fato da evolução, como Lamarck, e Darwin estava palmilhando caminho já trilhado. Porém, ainda não se tinha um mecanismo para explicar como as espécies se modificavam.
A inspiração veio do trabalho do Reverendo Malthus (1766 – 1834): a ideia de que os recursos crescem em progressão aritmética e os consumidores em progressão geométrica leva à conclusão imediata: não é possível que toda a prole dos consumidores sobreviva para passar seus caracteres adiante. E quem é que sobrevive? Como cada animal tem uma ligeira variação em relação aos de sua espécie, sobrevive quem tem alguma vantagem sobre a concorrência, na competição pela sobrevivência e reprodução. E, ao reproduzir, passa adiante suas características.

2 – A Seleção Natural não se chamava isso originalmente
 
Darwin tinha um grande receio de passar a ideia errada sobre a sua descoberta, e evitava termos que levassem a uma compreensão teleológica (ou seja, de que tudo tem um objetivo) das coisas. A expressão “seleção natural” não aparece em seus livros, mas sim “sobrevivência do mais apto” (“survival of the fittest”).
Curiosidade, o geneticista japonês Motoo Kimura sugeriu outro nome, a “sobrevivência do mais sortudo”. Os sortudos que nascessem com o gene “certo” acabavam sobrevivendo.

3 – A Seleção Natural demorou a ser aceita
 
Praticamente 80 anos. Desde a publicação da primeira edição, em 1859, até a década de 1940, a seleção natural não foi aceita por um número expressivo de cientistas. Não que não houvesse uma demonstração da seleção natural. O trabalho de James William Tutt, em 1846 (borboletas Biston Betularia), já havia demonstrado a seleção, coisa que voltou a ser feita por Haldane em 1924.
Outras propostas existiam para explicar como as espécies surgiam com o tempo, como o pontualismo, e mesmo teorias criacionistas, mas o fato é que antes so biólogo e geneticista Theodosius Dobzhanksy fazer a síntese do trabalho genético de Mendel com a Teoria da Evolução, a seleção natural conforme proposta por Darwin foi rejeitada por uma boa parte dos biólogos evolutivos.
Uma das razões para esta rejeição era que a ideia de um processo não direcionado, e que não levasse a um progresso garantido, ia contra a ideologia otimista vitoriana, que queria ver progresso em todas as transformações e alterações, mesmo as naturais. De certa forma, Darwin estava bem adiante de seu tempo.

4 – A Seleção Natural não é “a sobrevivência do mais forte”
 
Este é um erro comum: colocar a seleção natural como a sobrevivência do mais forte. A seleção natural não privilegia, necessariamente, o mais forte, mas o mais apto. E o mais apto pode ser o mais forte, ou o mais rápido, ou o maior, mas nem sempre é este o caso.
Em 1977 aconteceu uma seca nas Ilhas Galápagos. As plantas produziram sementes menores e mais duras. No mesmo período, os cientistas observaram que os bicos dos tentilhões Geospiza fortis estavam 5% maiores que antes da seca. Em 1983 houveram chuvas torrenciais e as plantas produziram sementes mais macias. O tamanho médio do bico dos tentilhões voltou ao que era antes da seca. Neste caso, a seleção natural deu vantagem aos bicos mais fortes durante a seca. Depois da seca, um bico mais forte custa mais, em termos de metabolismo, e não dá vantagem nenhuma, assim o bico menor prevaleceu novamente.
Outro exemplo é o dos animais de cavernas. Em um ambiente escuro, animais que têm olhos não têm vantagem alguma, e qualquer espécime que tivesse a sorte de nascer sem olhos estaria em vantagem, por que para desenvolver e manter os olhos, é preciso desviar um pouco da escassa energia obtida na caverna com a alimentação. Fora da caverna, quem nasce sem olhos está em desvantagem, por que não vê (o perigo) e é visto (pelos predadores), sendo eliminado pela predação.

5 – A Seleção Natural continua agindo no ser humano
 
Durante algum tempo se questionou se o ser humano, vivendo em um ambiente artificial e sem predadores naturais, continuaria sofrendo a ação da seleção natural (e por conseguinte da evolução).
Entretanto, pesquisas recentes demonstraram que o ser humano continua sendo selecionado. Por exemplo, a idade do primeiro filho mudou nos últimos 150 anos de 26 para 22 anos em uma região da Finlândia. A pesquisa conseguiu demonstrar que se trata de um traço genético, não cultural, e só tem uma maneira de uma característica genética se tornar comum ou predominante: através de processos de seleção natural e hereditariedade – evolução.
Existem outras adaptações na raça humana. Os povos Inuit, que vivem nas regiões árticas, tem o corpo curto, atarracado, e membros pequenos, o que diminui a perda de calor. Os etíopes, por outro lado, são altos, longilíneos, com extremidades longas, para perder calor mais rapidamente.
Outra característica genética é a manutenção da capacidade de digerir leite na idade adulta. Normalmente os mamíferos perdem esta capacidade quando crescem, mas em alguns seres humanos esta característica permanece, permitindo que eles tenham acesso a mais uma fonte de proteínas, gordura e açúcares.
Finalmente, existem casos em que uma doença genética pode ser favorecida. Algumas pessoas possuem uma doença hereditária, uma mutação que altera a forma das hemácias, a “anemia falciforme” e a “talassemia”. Esta é uma condição que pode causar a morte na infância, além de sérios problemas, mas em ambientes onde a malária é endêmica, estes indivíduos têm vantagem, por que o parasita não consegue se adaptar a eles.

6 A Seleção Natural só funciona até a idade reprodutiva
 
Um dos questionamentos que existem é por que temos o dente do siso, que se não tratado pode causar a morte do seu portador por septicemia. Ou do mal de Alzheimer, que causa demência.
A resposta para isto é que os genes do dente do siso, do mal de Alzheimer e outras doenças genéticas degenerativas não são selecionados por que estes males se manifestam depois que a pessoa já teve filhos. Ou seja, os genes que determinam estas características são passados adiante, sem sofrer seleção.
Outro erro comum é pensar que a Seleção Natural aumenta a longevidade, já que os humanos, por exemplo, tem vidas em média cada vez mais longas. Na realidade ela maximiza a reprodutividade e as características que são importantes até a idade reprodutiva.

7 – A Seleção Natural não “pega” tudo
 
Uma das contribuições do biólogo Motoo Kimura para a Teoria da Evolução foi a Teoria Neutralista da Evolução, que diz que a maioria das mutações a nível molecular não tem influência na adaptação e seleção natural do indivíduo, e acabam se tornando comuns na espécie por um mecanismo chamado de “deriva genética”.
De acordo com Kimura, a deriva genética é um mecanismo evolutivo que acontece sem seleção natural. Um gene se torna comum em uma população simplesmente por sorte: ele não aumenta nem diminui a adaptação dos indivíduos e acaba sendo passado adiante “de carona” com o resto do código genético que está sujeito à seleção natural.
Entretanto, as mutações que hoje são neutras podem não ser amanhã. Uma mudança no ambiente e uma característica que antes era neutra pode passar a se constituir em vantagem ou desvantagem na luta pela sobrevivência, sendo então passível do mecanismo da “seleção natural”.

8 – A Seleção Natural é o ambiente moldando o ser
 
Em qualquer ambiente que você for, vai encontrar animais adaptados a ele, por que a seleção natural não para nunca, e começou desde sempre. Ambientes desérticos contam com animais que conseguem guardar mais água. Ambientes aquáticos contam com animais com corpo fusiforme, que gasta menos energia ao nadar. Ambientes de savana têm mais animais que conseguem ver melhor à grandes distâncias. A existência de predadores favorece os animais que conseguem ver mais em todas as direções, por isto a maioria das presas tem os olhos dos lados da cabeça, com praticamente nenhum ponto cego na visão. A existência de predadores rápidos favorece também as presas que são mais rápidas.

Todo animal guarda no corpo e nos genes as informações sobre o ambiente em que vive. Mudando o ambiente, as informações mudam também. É a seleção natural que dá aos seres vivos o aspecto de terem sido projetados, “analisando” cada mínima alteração e adaptação do indivíduo, eliminando do jogo da vida todos os indivíduos que não estão tão aptos quanto seus concorrentes. Cada nova geração foi afiada um pouquinho mais nesta pedra de moer carne e sangue; a luta pela vida.
Com o passar das gerações, as mudanças se espalham na população. Novas mutações acontecem e os corpos são mais uma vez burilados. Se uma asa um pouquinho maior permitia voar uma distância maior ou então gastar menos energia para voar a mesma distância, milhares de gerações depois o animal parece ter sido projetado para voar daquela forma.

Sir Charles Darwin, com o mecanismo da sobrevivência do melhor adaptado, conseguiu uma ferramenta simples e ao mesmo tempo poderosa para explicar como as espécies se alteram com o passar do tempo, mas não foi o único mecanismo. Darwin também propôs a revolucionária ideia da seleção sexual, “tão revolucionária” que só foi aceita a partir da década de 1970, um século depois da publicação de “A Origem das Espécies”, depois que o homem já havia dividido o átomo e pisado na lua.

terça-feira, 9 de julho de 2013

Cynognathus
Posted: 08 Jul 2013 09:14 PM PDT
© Luis Rey
© Artista desconhecido
Caso conheça informe nos comentários
Nome científico: Cynognathus crateronotus.
Significado do Nome: Mandíbula de Cão.
Tamanho: cerca de 1 a 2 metros de comprimento e 50 centímetros de altura.
Peso: 50 quilos aproximadamente.
Alimentação:
Carnívora.
Período: Triássico Inferior e Médio.
Local: Argentina, África do Sul, Antártica e possivelmente China.

Onde viveu o Cinognato
© Patrick Król Padilha
Quando viveu o Cinognato
© Patrick Król Padilha
O artigo de hoje é sobre o Cinognato, um réptil-mamífero primitivo da ordem Therapsida, pertencente à classe Synapsida. Portanto é válido afirmar que o Cinognato ou Cynognathus é um sinapsídeo, o primeiro a ser apresentado aqui no Ikessauro! Este animal bizarro que parece uma mistura entre um réptil e um cachorro é muito primitivo viveu no começo da Era Mesozoica, no período Triássico
O Cynognathus é um gênero de cinodonte terápsido, um grupo de animais bem conhecidos por sua aparência estranha e primitiva,  indicando uma transição entre réptil e mamífero, mas que de fato é considerado oficialmente como um réptil.
O gênero Cynognathus tem este nome derivado do Grego, Cyno = cão, cachorro e Gnathus = mandíbula, significando então "Mandíbula de Cão" devido ao formato de sua mandíbula se assemelhar vagamente a de um cachorro moderno. A espécie Cynognathus crateronotus é a única válida do gênero, sendo que no passado restos desse animal encontrados em locais diferentes foram nomeados com outros nomes, incluindo os seguintes:

  • Cynognathus crateronotus: encontrado na África do Sul, na Formação Burgersdorp datando do Anisiano (Triássico Médio) é hoje a única espécie considerada como válida.
  • Cynognathus berryi: Encontrado no mesmo local de C. crateronotus, foi considerado sinônimo da espécie supracitada.
  • Cynognathus minor: Um crânio encontrado na Formação Rio Seco de la Quebrada na Argentina, cujo horizonte representa ambiente terrestre do Anisiano.
  • Cynognathus platyceps: Proveniente da África do Sul, do mesmo local mencionado nos dois primeiros espécimes. 
Além destes nomes, parece que outros gêneros foram usados para se referir este animal, sendo eles Cistecynodon, Cynidiognathus, Cynogomphius, Karoomys, Lycaenognathus, Lycochampsa, Lycognathus e Nythosaurus. No entanto tais nomes não parecem ter mais validade, suponho que após estudo mais cuidadoso se percebeu que todos os animais eram pertencentes ao gênero Cynognathus ou animais completamente diferentes que receberam novos nomes e foram desligados do gênero aqui abordado. Não há grande disponibilidade de informações sobre este gênero online ou em fontes impressas de fácil acesso, portanto algumas informações estão incompletas. O gênero parece ter sido criado em 1895 por Harry Govier Seeley em uma revisão sobre répteis primitivos, porém esta informação carece de mais confirmações.
Existe certa discordância entre pesquisadores diferentes se de fato todos os restos encontrados são realmente pertencentes a uma única espécie, mas de acordo com a revisão de Cynodontia de Hopson e Kitching (1972) a única espécie válida é mesmo C. crateronotus. Enquanto revisões mais detalhadas desse grupo não forem realizadas, será impossível saber com certeza.

A espécie Cynognathus crateronotus apresenta diversos sinônimos, listados abaixo:
  • Cistecynodon parvus
  • Cynidiognathus broomi
  • Cynidiognathus longiceps
  • Cynidiognathus merenskyi
  • Cynognathus beeryi
  • Cynognathus minor
  • Cynognathus platyceps
  • Cynogomphius berryi
  • Karoomys browni
  • Lycaenognathus platyceps
  • Lycochampsa ferox
  • Lycognathus ferox
  • Nythosaurus browni

Os gêneros Karoomys, Cistecynodon e Nythosaurus são conhecidos apenas a partir de restos juvenis pequenos, enquanto que Lycognathus cucullatus parece se tratar de restos de uma cobra identificados erroneamente.
O Cinognato apresentou distribuição quase cosmopolita, ou seja, viveu por quase todo o mundo. Seus fósseis foram encontrados na África do Sul, América do Sul e Antártica. Algumas fontes citam a China como a origem de algum espécime, porém  não encontrei confirmação segura desses dados em fontes mais confiáveis.
Esse réptil mamífero é considerado como tendo porte grande se comparado com seus parentes, pois os demais cinodontes eram menores. Algumas fontes por sua vez, dão estimativas diferentes, indicando que o Cinognato media na média 1 metro, porém poderia chegar a até 2 metros de comprimento.
Ele viveu no começo da era dos dinossauros, durante o Triássico inferior, época Olenekiana e Triássico médio, época Anisiana. Há pequenas variações sobre a exata faixa temporal em que viveu esse animal, mas no geral se restringe ao Triássico Inferior e começo do Triássico médio, entre 249 a 237 milhões de anos atrás.
Não se engane com a aparência fofa de mamífero ou a postura simpática desse animal. Ele foi um predador bem sucedido que tinha um crânio enorme repleto de dentes afiados para caça. Seu crânio em média tinha 30 centímetros de comprimento, quase um terço do comprimento total do animal, sendo que a mandíbula era predominantemente composta de um único osso, o dentário, onde se prendem os dentes inferiores, indicando a evolução dos répteis em direção à formas mais mamalianas (mais sobre isso logo adiante).
Crânio do Cinognato
©
AMNH/R. Mickens

Por falar em dentes, o osso dentário estava equipado com dentes diferenciados que sugerem um animal capaz de processar comida antes de engolir. Ele possuía três tipos diferentes:
  1. Incisivos: esses dentes se situavam na frente da boca, eram levemente curvados para trás e responsáveis por agarrar e cortar a comida.
  2. Caninos: eram os dentes grandes e pontudos, os maiores de todos, situados atrás dos incisivos após um diastema. Um diastema é um espaço entre um dente e outro na boca, podendo aparecer no crânio (em cima) ou na mandíbula (em baixo), formando uma fresta onde nunca nascem dentes. Aparecem em diversos animais, inclusive em mamíferos atuais como Roedores entre outros animais. Pode ser um espaço estreito ou pode, como no caso do Cinognato, sem bem mais visível. O Cinognato possui quatro caninos, dois superiores e dois inferiores, que tinham como principal função perfurar profundamente a presa, provavelmente auxiliando na caça servindo para matar a presa através de asfixia ao perfurar a traqueia ou hemorragia perfurando artérias.
  3. Molares: os molares do Cinognato eram afiados e se situavam após os caninos e serviam principalmente para cortar a carne das presas em pedaços menores, rasgar nacos de alimento para poder engolir facilmente.
Outra característica marcante do crânio desse animal é que possuía os espaços para músculos bem avantajados, indicando uma mordida poderosa, além de uma articulação mandibular adaptada para que a boca pudesse ser aberta de maneira bem ampla. Isso facilitaria em muito a captura de presas, pois o Cinognato certamente poderia abrir a bocarra enorme e com seus músculos poderosos agarrar e segurar a presa.
Provavelmente suas presas mais comuns deveriam ser animais robustos como os répteis herbívoros dicinodontes, cujos membros eram grossos, assim para um predador seria extremamente útil a capacidade de abrir a boca o máximo possível.
Crânio, reconstrução muscular e em vida
© Roman Yevseyev
Aqui é importante lembrar porque esse animal é considerado um réptil mais do que é considerado um mamífero. Embora sua aparência lembre a de um mamífero, o que diferencia um réptil de um mamífero é a forma e quantia dos ossos do crânio e da mandíbula. Nos répteis, como é o caso do Cinognato, a fenestra pós orbital (buraco do crânio atrás do olho) e a própria órbita estão separados. Nos mamíferos essa fenestra se uniu ao buraco do olho, sendo assim mamíferos modernos apresentam somente uma abertura. Outra característica dos répteis é que sua mandíbula é composta de vários ossos e embora a do Cinognato seja predominantemente composta pelo dentário, os demais ossos ainda não estão fazendo parte do ouvido. Nos mamíferos verdadeiros esses ossos restantes evoluíram e se tornaram ossos do aparelho auditivo, sendo encontrados muito atrofiados, porém úteis, dentro do ouvido.
O crânio do Cinognato era adaptado com um palato secundário na boca, que fazia o ar da respiração chegar ao fundo da boca por um canal secundário sem passar pelo meio da boca. Isso indica que o Cinognato era capaz de comer e respirar ao mesmo tempo, assim como fazem os mamíferos de hoje em dia. Nós humanos temos a mesma estrutura, mas normalmente não prestamos atenção em um ato tão automático como respirar ou mastigar. Faça o teste, por um breve instante bote um biscoito ou qualquer alimento na boca, e, enquanto mastigar continue respirando normalmente. Perceberá que o ar entra pelas narinas e sai direto na sua garganta. A separação entre a boca e esse canal é o palato secundário, nos humanos popularmente chamado de "Céu da Boca".
A região estomacal, na parte da barriga do animal não possuía costelas como em outros tipos de vertebrados da época, o que sugere que o animal deveria ter um diafragma eficiente para respiração. Esse detalhe junto com o palato secundário indicam um animal de sangue quente, pois os animais endotérmicos precisam de fluxo de ar constante em seus pulmões para manter seu metabolismo.
Seus membros traseiros estavam dispostos diretamente sob o corpo, mas os membros dianteiros ainda se mantinham em posição lateral, semelhante a posição dos membros de répteis. Essa combinação de membros mantidos verticalmente com membros articulados lateralmente ainda é vista em alguns mamíferos vivos hoje.
O Cinognato não mantinha as patas apoiadas na chão apenas na ponta dos dedos, como fazem certos animais (ex: cachorro, dinossauros, cavalos), pelo contrário, ele mantinha a pata toda colada no solo, ou seja, era um animal plantígrado, como o ser humano e os ursos, por exemplo.
Cinognato dando um passeio
©
Julius T. Csotonyi

Outra característica reptiliana era sua coluna vertebral, incapaz de articular-se para cima e para baixo, somente sendo capaz de movimentos laterais. Isso não impedia que o Cinognato fosse rápido, pelo contrário, deveria ser ágil como um lagarto, porém fazia com que seu movimento realmente parecesse o de um réptil correndo, ondulando o corpo lateralmente.
Na realidade não sabemos como era a aparência em vida do Cinognato, porque somente fósseis de seus ossos foram encontrados. Não há registro de tecido mole como pele ou pelos preservado, por isso sua aparência peluda e mamaliana é baseada em detalhes anatômicos do crânio.
Pequenas perfurações e canais no osso do focinho sugerem que havia grande concentração de nervos e vasos sanguíneos. Essas estruturas em mamíferos permitem que pelos sejam usados como órgãos sensoriais, na forma de bigodes, iguais aos vistos nos cachorros atuais e em muitos outros mamíferos.
Cinognato: observe os detalhes dos bigodes
©
Pietro Antognioni
Isso demonstra que o Cinognato já possuía um tipo de pelo complexo desenvolvido e pode indicar que o resto do corpo também possuía uma cobertura do mesmo tipo, auxiliando no isolamento térmico, impedindo a perda de calor. Isso pode indicar que fossem também animais de sangue quente, capazes de manter a temperatura corporal estável não precisando do calor ambiental para esse tipo de regulação.
Registros de tocas fósseis encontradas na África e na Argentina demonstram que os cinodontes viviam em buracos escavados no solo. Não se sabe se o Cinognato também vivia em tocas, mas é muito razoável supor que sim, uma vez que foi encontrado na África e recentemente publicado um fóssil de um cinodonte Thrinaxodon, um primo do Cinognato, dentro de uma toca junto com um anfíbio do gênero Broomistega, que estava ferido. Talvez o Thrinaxodon tenha morrido na toca por algum motivo e o anfíbio aproveitou a toca para esconder-se de algum predador diferente, tendo morrido também. A postura dos fósseis e falta de sinais de predação do cinodonte no anfíbio não sugerem que o réptil mamífero tenha capturado o anfíbio como presa, a fim de comer mais tarde. Sabe-se que anfíbios atuais utilizam tocas de outros animais para esconder-se e esse pode ter sido o caso com estes dois animais que viveram tão distante de nós.
Sendo um animal muito aparentado dos mamíferos e apresentando possível metabolismo endotérmico é de se supor que o Cinognato era um animal social, assim como a maioria dos mamíferos modernos. Talvez fosse um animal monógamo, que encontra um parceiro e permanece a vida toda com o mesmo ou pelo menos enquanto ambos estiverem vivos.
Um casal de Cinognatos descansa tranquilo
©
John Xerdeson Oliveira
Pensando em comportamento social, pode ser que o Cinognato costumasse caçar em grupos, como fazem os lobos atuais, a fim de poder abater presas fortes, o que seria inviável para um único indivíduo.
Um trio de Cinognatos devora um dicinodontídeo
©
Mark Hallett
Além de suposições, pouco se pode dizer sobre esse animal tão intrigante. Não sabemos se produziam leite como os mamíferos modernos, mas acredita-se que eram animais vivíparos, ou seja, davam cria a filhotes já formados dentro do corpo da mãe.
O Cinognato é um dos cinodontes mais bem conhecidos, mas não parece ter muita popularidade entre o público leigo em geral, apesar de tudo. Raramente se fala dele em documentários, porém foi mencionado brevemente na série "Paleoworld", no episódio "A Tail of a Sail". E em filmes de puro entretenimento suas aparições ou menções são praticamente nulas. Essa espécie, assim como algumas outras da mesma época e local, é famosa por ter colaborado na confirmação da teoria da deriva continental, uma vez que a presença de fósseis da mesma espécie em diversos continentes indica que um dia num passado distante estes continentes estiveram ligados permitindo o tráfego livre dos animais para qualquer direção.
O Cinognato apareceu no famoso álbum de figurinhas "Dinossauros", criado pela empresa Nestlé como item promocional do então popular Chocolate Surpresa. No álbum é retratado já no começo, na figura número 01, retratado com uma farta cobertura de pelos comendo uma carcaça qualquer debaixo de uma chuva forte. Termino esse artigo deixando a figura abaixo para que você confira e mate a saudade naquela época! Curta a nostalgia!
Figurinha do Cinognato
© Nestlé
Aos artistas contribuintes do Ikessauro, eu deixo um grande e sincero agradecimento pela permissão do uso de suas obras e aos leitores sugiro que confiram as páginas de cada artista, sem eles os artigos aqui seriam muito menos interessantes. Valorizem as ilustrações e os profissionais que as produzem, sejam brasileiros ou não! Vale lembrar que algumas imagens foram utilizadas sem autorização devido ao desconhecimento do nome do autor da imagem, encontrada por acaso em pesquisas via Google ou porque não obtive respostas do artista quando solicitado um contato.