quinta-feira, 27 de novembro de 2014

Bridgmanita...que mineral é esse?

Cientistas encontram primeira amostra natural do mineral mais abundante da Terra, que compõe grande parte do interior do planeta. Descoberta não veio do subsolo, mas sim de um meteorito, e permitiu a caracterização e nomeação oficial do material. 
 
Por: Sofia Moutinho
Publicado em 27/11/2014 | Atualizado em 27/11/2014
Muito prazer, bridgmanita!
O mineral mais abundante da Terra foi identificado recentemente em um meteorito que caiu no nosso planeta há 135 anos e ganhou o nome de bridgmanita. (foto: Chi Ma/ Caltech.
 
Ele é, provavelmente, o mineral mais abundante da Terra, formando 93% do manto inferior do planeta, a 2.600 km da superfície. No entanto, nunca tinha sido encontrado na natureza nem tinha um nome oficial. Isso mudou com a análise recente de um meteorito de 4,5 bilhões de anos que caiu na Austrália em 1879. Ao olhar para a rocha que veio de fora do planeta, pesquisadores encontraram a primeira amostra do tão abundante e, ao mesmo tempo, oculto mineral, agora batizado de bridgmanita.
Apesar de já ter ido para a Lua e enviado sondas para outros planetas, o ser humano ainda não foi capaz de estudar diretamente as camadas mais profundas do interior de sua própria morada. A constituição dessas regiões é apenas inferida por meio de medidas da velocidade das ondas sísmicas (originadas no movimento do magma e das placas tectônicas) e por experimentos que simulam as condições de altas temperaturas e pressão do interior terrestre.

Esse tipo de estudo sugere que o manto inferior, camada que fica entre 660 e 2.600 km de profundidade, é sólido e composto principalmente de bridgmanita, até então chamada popularmente de piroxena enstatita (MgSiO3). Tirar a prova seria impossível, pois, além da dificuldade técnica de perfurar regiões tão profundas, esse mineral é instável e se transforma em outro tipo de substância em condições ambientais normais. Por isso, cientistas têm procurado por ele em meteoritos.

Ao entrar na Terra e se chocar com a atmosfera, os meteoritos se deparam com temperatura e pressão altíssimas, muito semelhantes às encontradas no interior do nosso planeta. Daí a chance de encontrar o mineral nesses astros. No ano passado, duas equipes de pesquisadores quase chegaram lá analisando meteoritos, mas as amostras estavam muito danificadas e a estrutura do mineral não pôde ser descrita por completo.
Tschauner: “O estudo das camadas mais profundas da Terra estava incompleto e ter uma amostra natural preenche essa lacuna”
O estudo atual, publicado hoje na Science, foi o primeiro a encontrar e descrever o mineral dominante na Terra. Segundo um dos autores da pesquisa, o geólogo Oliver Tschauner, da Universidade de Nevada-Las Vegas, nos Estados Unidos, a descoberta encerra uma busca de mais de um século e torna o estudo do interior da Terra mais completo.
“Até agora, a petrologia, o estudo das propriedades químicas e físicas do manto inferior, era baseado somente em experimentos de simulação, enquanto o estudo da crosta terrestre e do manto superior se baseiam em experimentos e amostras naturais”, diz. “O estudo das camadas mais profundas estava incompleto e ter uma amostra natural preenche essa lacuna.”
Os pesquisadores usaram raios X para analisar a estrutura e a composição do mineral. Tschauner conta que a bridgmanita pura é incolor e tem um brilho vítreo e que, no interior da Terra, provavelmente apresenta uma cor marrom-avermelhada, devido à mistura com ferro e aço. A aparência, no entanto, não pode ser comprovada no meteorito. “As amostras naturais encontradas são tão pequenas que não é possível ver a cor”, conta. Segundo o cientista, os grãos identificados medem menos de 1 micrômetro, até 150 vezes menos que a espessura de um fio de cabelo.
Estrutura
Os cientistas analisaram o mineral com raios X e determinaram a sua estrutura cristalina. (foto: Chi Ma/ Caltech)
A bridgmanita já tinha sido sintetizada em experimentos anteriores, mas, para ser considerada oficialmente um mineral e ganhar um nome, era preciso ter uma amostra natural do mineral caracterizada. O pedido de batismo foi aceito pela Associação Internacional de Mineralogia em junho.

O nome bridgmanita é uma homenagem ao físico norte-americano Percy W. Bridgman (1882-1961), laureado com o Nobel de Física em 1946 por sua contribuição ao estudo de mineralogia de altas pressões. Foi ele quem tornou possível os experimentos de simulação de temperatura e pressão do interior da Terra ao criar, há mais de 100 anos, um dispositivo capaz de gerar uma pressão 100 mil vezes maior do que a que estamos submetidos ao nível do mar.

A busca continua

Segundo outro pesquisador envolvido no estudo, Chi Ma, do Instituto de Tecnologia da Califórnia (Caltech), a caracterização do mineral pode ajudar a entender melhor a dinâmica do interior do nosso planeta. “A descoberta da bridgmanita natural não só nos dá informações sobre as condições de impacto dos meteoritos, mas também pode nos ajudar a desvendar os mecanismos de transformação de minerais dentro da Terra”, afirma.
Camadas
Acredita-se que a bridgmanita seja encontrada no manto inferior da Terra. (imagem: Science)
Alguns materiais do interior da Terra, como os diamantes, chegam até a superfície, mas a maioria dos minerais das camadas mais profundas não resiste a essa jornada. Os cientistas ainda têm pelo menos dois minerais para os quais ainda não foram encontradas amostras naturais: o CaSiO3, da mesma camada que a bridgmanita, e a pós-perovskita, que ocorre entre o manto inferior e o núcleo de ferro do planeta.
“São minerais de menor quantidade na composição do manto, mas são fundamentais para entender a distribuição de calor no interior da Terra”, diz Tschauner. O jeito é esperar.

terça-feira, 25 de novembro de 2014

Onde está a anta-pretinha

Ainda controversa, nova espécie é mais disseminada na Amazônia do que se pensava
IGOR ZOLNERKEVIC | Edição 225 - Novembro de 2014
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© ILUSTRAÇÕES SANDRO CASTELLI
Nem tanto ao campo nem à floresta: a anta-pretinha é encontrada em regiões de transição entre áreas de vegetação aberta e matas mais densas
Nem tanto ao campo nem à floresta: a anta-pretinha é encontrada em regiões de transição entre áreas de vegetação aberta e matas mais densas.

A descrição de uma nova espécie de anta vivendo na Amazônia, a anta-pretinha, publicada em dezembro do ano passado na revista Journal of Mammalogy, foi celebrada por muitos como a descoberta mais extraordinária da zoologia deste século. Afinal, seria a primeira espécie de anta identificada desde 1865 e o maior animal descoberto pela ciência desde 1992, quando pesquisadores descreveram o saola, um bovino das florestas do Vietnã e do Camboja.

O trabalho foi fruto de 10 anos de esforços de uma equipe liderada por Mario Cozzuol, paleontólogo da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Ele e seus colaboradores divulgarão neste mês novos dados sobre a ecologia e a genética da anta-pretinha, espécie que descreveram e batizaram com o nome científico de Tapirus kabomani, no Simpósio Internacional de Antas da União Internacional para Conservação da Natureza (IUCN), evento que acontece em Campo Grande, no Mato Grosso do Sul. Entre os dados estão fotos, vídeos e medidas inéditas de antas-pretinhas vivendo nos estados do Pará e de Roraima, assim como na Bolívia, sugerindo que há populações do animal espalhadas por quase toda a Amazônia do Brasil e dos países vizinhos.

Essas evidências também confirmam que, ao contrário da espécie mais conhecida de anta sul-americana, a Tapirus terrestris, cujas populações escolhem entre viver no interior da mata fechada e em campos abertos, a T. kabomani prefere regiões de paisagem mais variada, onde há um mosaico de áreas abertas e fechadas. “Todos os lugares em que encontramos a espécie são assim”, diz Cozzuol. “Pode ser uma coincidência, mas talvez a T. kabomani tenha mesmo um comportamento diferente da T. terrestris.”

Nem todos os especialistas em mamíferos estão convencidos de que a anta-pretinha existe como espécie independente. Alguns pesquisadores acreditam que elas seriam apenas exemplares da espécie T. terrestris um pouco mais baixas e escuras que a média. Durante o evento da IUCN, Cozzuol participará de uma mesa-redonda sobre a validade da nova espécie. A discussão pode parecer uma questão taxonômica bizantina, mas de fato vai tentar responder a uma pergunta prática: vale a pena incluir a T. kabomani na lista vermelha de animais ameaçados de extinção da IUCN e, para protegê-la, adotar medidas diferentes das que estão sendo tomadas para preservar a T. terrestris?
Embora não sofra perigo eminente de extinção, a carne saborosa, o enorme tamanho (é o maior animal nativo da América do Sul) e o longo período de gestação fazem da anta-brasileira um animal muito vulnerável à caça excessiva e à perda de hábitat. A espécie corre sério risco de desaparecer em vários pontos do país nas próximas décadas, como já aconteceu nas regiões Nordeste e em boa parte das regiões Sul e Sudeste. Sua extinção local pode afetar toda a biodiversidade de uma região, pois, sendo um herbívoro de grande apetite, a anta ajuda a espalhar sementes nos campos e florestas.

O debate na verdade dará sequência ao vivo a uma discussão que começou por escrito, primeiro num grupo fechado para pesquisadores no Facebook e posteriormente em artigos na edição de agosto do Journal of Mammalogy. Um grupo de pesquisadores liderado por Robert Voss, zoólogo do Museu de História Natural Americana (AMNH), refez parte das análises da equipe de Cozzuol e defende que a espécie não existe.
“Teriam várias gerações de mastozoólogos neotropicais realmente falhado em reconhecer uma espécie amplamente distribuída pela Amazônia?”, perguntam Voss e coautores em seu artigo. “Sim, não reconheceram, lamento”, responde Cozzuol, que rebateu as críticas na mesma edição da revista. “Isso já aconteceu antes e vai acontecer de novo, não é pecado.”

Crânio estranho

A busca pela confirmação da existência da anta-pretinha começou por acaso, em 2002, quando Cozzuol era professor na Universidade Federal de Rondônia (Unir) e colocou sua aluna de iniciação científica Elizete Holanda, atualmente paleontóloga da Universidade Federal de Roraima, para estudar um crânio fóssil de 45 mil anos, encontrado no rio Madeira, que pertencia a uma espécie extinta de anta. Comparando o fóssil com os de outras espécies de anta extintas e vivas, Elizete descobriu na coleção da Unir outro crânio com dimensões estranhas, que não combinavam com o esperado para nenhuma espécie conhecida.
O crânio havia sido coletado em uma vila de pescadores ao norte de Porto Velho, com um furo de bala e outras marcas feitas por caçadores. O pai de Elizete, que havia sido seringueiro, comentou sobre outro tipo de anta que conhecia, uma pretinha, que caçava por ter carne mais saborosa que a da anta-comum. “Foi quando começamos a perceber que todos da região diziam que havia dois tipos de anta”, diz Cozzuol.
“A maioria dos biólogos que trabalhavam com mamíferos da região sabia disso, mas não acreditava nas pessoas”, lembra o paleontólogo. O principal motivo para os pesquisadores ignorarem o que o povo dizia é que há mesmo uma grande variação de cor e tamanho entre os exemplares de antas de uma mesma espécie. Além disso, parecia improvável para os pesquisadores que duas espécies muito semelhantes ocupassem o mesmo ambiente, pois a concorrência por alimento e espaço levaria uma delas à extinção. “Mas como sou paleontólogo e sei que há registros fósseis de espécies de antas diferentes vivendo simultaneamente em uma mesma região nas Américas, não me ative a essa suposição”, conta Cozzuol.
Era preciso verificar o que acontece hoje na natureza, mas Cozzuol não obteve licença para capturar um animal vivo da provável nova espécie e comparar com o crânio que Elizete encontrara. Só mais tarde conseguiu recursos para realizar expedições na Amazônia, em colaboração com a equipe do geneticista Fabrício Santos e do ecólogo Flávio Rodrigues, ambos da UFMG. Nessas viagens os pesquisadores combinaram com caçadores locais para que os avisassem no caso de abaterem uma anta-pretinha. Assim, os pesquisadores poderiam recolher ossos, peles e amostras de DNA da carne. Já no primeiro contato, um caçador os levou até a carcaça de uma delas, abatida algumas semanas antes. “O crânio tinha as características que esperávamos”, diz Cozzuol.

A suspeita também se confirmou durante visitas a aldeias dos indígenas Karitiana, em Rondônia, que empilham os crânios de suas caças como troféus. “Havia duas pilhas para as antas, uma delas com as medidas esperadas para a pretinha”, lembra Cozzuol, que batizou a espécie em homenagem ao nome dado a ela por outros índios, os Paumari: Arabo kabomani.

Os pesquisadores sabiam, entretanto, que precisariam de muito mais evidências para convencer seus colegas de que a hipótese de uma nova espécie merecia ser levada a sério. “Uma espécie biológica é um conjunto de populações que possuem uma história evolutiva separada das outras, não é algo que dê para observar diretamente”, explica  Cozzuol. “É preciso testar a hipótese integrando análises de genética, morfologia e de outras áreas.”

Para verificar a existência da nova espécie, os pesquisadores compararam medidas dos crânios de antas-pretinhas com as de crânios de outras quatro espécies vivas e alguns fósseis de antas. Compararam também as sequências de três genes do DNA mitocondrial de quatro pretinhas com os mesmos genes de dezenas de antas de todas as espécies, obtidas no banco de dados aberto GenBank. “A maioria dos estudos com antas usa apenas um gene mitocondrial”, explica Cozzuol. Seja pela forma de seu crânio ou pelo seu DNA, a pretinha despontava como um animal diferente das outras espécies.

A conclusão do estudo foi uma revisão da história natural das antas. As antas são consideradas fósseis vivos, pois não mudaram muito desde que surgiram há 50 milhões de anos, tendo sobrevivido à extinção da fauna de animais enormes que habitavam as Américas até 10 mil anos atrás. 

Além da nova T. kabomani, hoje existem apenas quatro espécies:

A anta-asiática (T. indicus), na Malásia; a centro-americana (T. bairdii); a anta-da-montanha (T. pinchaque), que vive nos Andes, entre Peru, Equador e Colômbia; e a anta-brasileira (T. terrestris), presente em quase todos os biomas tropicais da América do Sul. Os ancestrais da T. kabomani teriam se separado dos ancestrais das antas brasileira e de montanha há pelo menos 300 mil anos.


Não é preciso ser um caçador amazônico para distinguir a olho a T. kabomani da T. terrestris. A pretinha é bem menor, mais baixa e com pernas mais curtas que a T. terrestris. Sua pele é mais escura, a crina mais baixa e a testa mais larga. Os machos de todas as espécies de antas tendem a ser um pouco menores que as fêmeas e essa diferença de tamanho entre os sexos é mais acentuada entre as pretinhas. Outra diferença entre os sexos é uma mancha branca na cabeça, que se estende da bochecha até o pescoço, uma exclusividade das fêmeas. “Alguns indivíduos de T. terrestris têm manchas nas bochechas, mas elas não são tão nítidas e podem aparecer em ambos os sexos”, explica Cozzuol.

Evidências suficientes?

Nada convencidos com os indícios de uma nova espécie, Voss e seus colegas contestam todas essas conclusões. Eles reexaminaram os mesmos dados genéticos usando um método estatístico alternativo e concluíram que as diferenças entre as sequências de DNA são pequenas demais para considerar a pretinha como uma espécie separada.

Cozzuol explica que sua equipe refez a análise usando a mesma técnica que Voss, a cujos detalhes só teve acesso após a publicação do artigo e que portanto não constam de sua réplica na mesma edição da revista. Seus resultados foram diferentes e continuam a confirmar a existência de T. kabomani. “Ainda não entendi como eles chegaram aos resultados”, diz Cozzuol. Ele também reclama de criticarem seus dados de medições de crânios sem replicá-los. “O AMNH possui uma coleção muito maior de T. terrestris do que nós”, diz. “Não demoraria uma semana para tomarem os dados e verificarem nossa análise.”

“Continuo convencido de que não é uma espécie válida”, diz Voss. “A evidência genética é nula.” Ele acredita que a hipótese deveria ser testada usando também o DNA do núcleo das células, além daquele das mitocôndrias já analisado. Cozzuol e Santos estão analisando justamente isso no momento, mas já concluíram que não é possível distinguir nenhuma espécie de anta sul-americana pelos genes de DNA de núcleo normalmente usados como marcadores nesse tipo de estudo, o que significa que precisarão buscar por diferenças em sequências de DNA nuclear menos conhecidas. “Os argumentos dele não se sustentam e vão além das exigências razoáveis”, diz Cozzuol. “Não tenho dúvida de que poderíamos ter feito melhor, mas outras espécies já foram descritas recentemente com muito menos detalhes e informações.”
“A evidência etnográfica também não me convence”, afirma Voss. “Indígenas amazônicos rotineiramente superdiferenciam os animais grandes que caçam.” Para defender esse ponto, Cozzuol teve ajuda do etnozoólogo Hugo Fernandes-Ferreira, que deve concluir neste ano uma tese de doutorado na Universidade Federal da Paraíba sobre a história da caça a animais silvestres no Brasil. Fernandes-Ferreira explica que a superdiferenciação a que Voss se refere é a tendência de povos indígenas a darem nomes diferentes para animais que identificam com aparência diferente, mas que na verdade são apenas variações dentro de uma mesma espécie.
Um exemplo são as onças-pintadas claras e pretas, pertencentes à mesma espécie biológica, mas consideradas animais diferentes pela maioria dos povos da Amazônia. As antas, no entanto, são caçadas por conta de sua carne saborosa e em decorrência de partes do animal terem uso medicinal, mágico e religioso. “As pessoas analisam com mais cuidado os animais que consideram úteis”, diz Fernandes-Ferreira. “Além disso, essa diferenciação entre uma anta grande e cinza e outra pretinha é difundida em quase todos os povos da Amazônia.”
“De índios, ribeirinhos, seringueiros e fazendeiros sempre ouvi dizerem que há duas espécies de anta”, diz Cozzuol. “Os indígenas Uru-Eu-Wau-Wau, por exemplo, vivem em uma área onde só há um tipo de anta, mas afirmam que sabem que em outros lugares há dois tipos.”

De outros tempos

Fernandes-Ferreira também encontrou registros históricos de caçadores e naturalistas mencionando duas espécies de antas no Brasil. O mais antigo é de 1794, no qual naturalista brasileiro Alexandre Rodrigues Ferreira relata à coroa portuguesa a existência de duas espécies de anta na província do Grão-Pará, onde atualmente fica o estado do Amazonas.

Outro relato histórico importante é o do presidente norte-americano Theodore Roosevelt, que menciona em suas memórias da visita ao Brasil em 1912 ter caçado no Mato Grosso uma anta, “um macho muito menor do que o outro que matei” e que “os caçadores disseram ser de um tipo diferente”.
As antas abatidas por Roosevelt foram doadas ao AMNH e analisadas pelo zoólogo Joel Allen, em 1914, que considerou o animal menor apenas como uma variação da T. terrestris. “Tivemos acesso às medidas desse exemplar e elas batem perfeitamente com o que esperamos da T. kabomani”, diz Cozzuol.
“A posição que defenderemos no painel da IUCN é que, se há a mínima possibilidade de que exista uma espécie diferente e a ignorarmos, podemos acabar condenando uma parte importante da biodiversidade da Amazônia sem ainda tê-la conhecido direito”, explica Cozzuol. “Na Nova Zelândia, houve um caso semelhante: achava-se que o tuatara, um tipo de réptil primitivo parente dos lagartos, era uma espécie só, até que ações de conservação que funcionavam em algumas regiões deram errado em outras. É porque havia na verdade duas espécies de tuatara com requisitos diferentes.”
“Sim, se há realmente duas espécies válidas de antas amazônicas, então elas deveriam ser manejadas separadamente”, concorda Voss. “Entretanto, dado que não há uma estratégia eficaz de manejo para nenhum mamífero amazônico, a proteção do hábitat parece a melhor abordagem.”

Artigos científicos

COZZUOL, M. A. et al. A new species of tapir from the Amazon. Journal of Mammalogy. v. 94, n. 6, p. 1331-45. dez. 2013.

VOSS, R. S. et al. Extraordinary claims require extraordinary evidence: a comment on Cozzuol et al. (2013). Journal of Mammalogy. v. 95, n. 4, p. 893-8. ago. 2014.

COZZUOL, M. A. et al. How much evidence is enough evidence for a new species? Journal of Mammalogy. v. 95, n. 4, p. 899-905. ago. 2014.

segunda-feira, 17 de novembro de 2014

Modelos de como funciona o manto da Terra poderão sofrer mudanças.


O manto profundo , uma região que fica 670 a 2.900 quilômetros abaixo da superfície terrestre, é improvável de se chegar e difícil de se "ver" claramente com sinais sísmicos. Sabe-se sobre o manto mediante estudos de ondas sísmicas, que aceleram e retardam, levando a uma base de conhecimento de como elas viajam através de diferentes camadas no interior da Terra. A parte mais profunda do manto tem "manchas estranhas" e
zonas de sismicidade lenta que têm intrigado muitos cientistas.

Modelos de como funciona o manto da Terra poderão sofrer mudança graças a dois novos estudos que recriam as condições extremas acima do núcleo do planeta. Os dois novos estudos oferecem  possíveis explicações para esse comportamento sísmico estranho.
Nos estudos, os pesquisadores reproduziram as condições no interior do manto profundo em experimentos de laboratório. A trabalhar de forma independente e em continentes diferentes, as equipes deram tiros lasers em minúsculas amostras de rocha espremidas entre bigornas de diamante.
Uma das equipes de cientistas concluiu que a ideia de como certas rochas se comportam no manto profundo, que responde por cerca de metade do volume da Terra, era equivocada. A outra equipe encontrou evidências que pequenas quantidades de rochas mais comuns na superfície terrestre, a exemplo de o basalto, se agrupavam em forma líquida na fronteira manto-núcleo. 
Os resultados foram publicados no dia 22 de maio na revista Science. 
 "Estes resultados são um novo passo frente a reprodução em laboratório do que está ocorrendo no manto muito profundo", disse Denis Andrault, principal autor de um dos estudos e cientista da Universidade Blaise Pascal, na França.

« Mutações minerais no Manto » 
O estudo que examina rochas mantélicas descobriu que um mineral chamado perovskita, que compõe cerca de 80% do manto profundo, se comporta de maneira diferente em profundidades superiores a 2.200 km do que acima desse nível. Ocorre que, na parte mais baixa do manto inferior, a perovskita tem duas fases - diferentes formas de organização de seus átomos. Uma fase, H-phase ou fase H, contém ferro e uma estrutura hexagonal, enquanto a outra forma é isenta de ferro. 
Segundo o principal autor desse estudo, Li Zhang - cientista do Centro de Pesquisa de Ciência de Alta Pressão e Tecnologias Avançadas em Xangai, a fase H é mais estável a temperaturas e pressões encontradas perto do núcleo, e é provavelmente mais comum do que a forma de perovskita livre de ferro. Sabe-se que mudanças litológicas possuem relação direta na classificação das camadas do interior da Terra, e muitas vezes são indicadas por mudanças bruscas na velocidade das ondas sísmicas. 
Os pesquisadores acreditam que a descoberta citada irá desencadear mais pesquisas do interior da Terra nos locais onde a perovskita muda até a fase H. Isso porque descobrindo a nova fase H, também abre possibilidades para melhorar os modelos de interior da Terra , conforme conta Quentin Williams, professor da Universidade da Califórnia, Santa Cruz, que não esteve envolvido no estudo.
Pesquisadores agora podem explorar melhor como a transição de uma fase mineral para outro ciclo de convecção influencia no sistema de tectônicas de placas do planeta, e se existe um sinal sísmico da mudança. 
 "A idéia de que, 1.000 km acima do núcleo da Terra, o material pode ser separado em minerais ricos em ferro e pobre em ferro, é muito nova", disse Williams. 


« Da crosta ao núcleo »
O segundo estudo, pela equipe da Universidade Blaise Pascal, indica que fragmentos de crosta oceânica podem derreter no limite manto-núcleo. Esta não é uma simples conclusão; basalto pode derreter facilmente debaixo de vulcões em erupção, mas no manto profundo as rochas podem se comportar estranhamente devido a pressões submetidas que podem ser chegar até um milhão de vezes maior do que na superfície da Terra, e temperaturas no manto profundo são escaldantes: estimatima-se em 1.530 ºC a 3.700 ºC. 
Os resultados vão influenciar o debate sobre fundição de fragmentos da crosta perto do núcleo e como as novas evidências podem influenciar as teorias sobre as plumas mantélicas que alimentam hotspots e transferência de calor dentro da terra. 
Ilustração do arranjo experimental utilizado para reproduzir a intensa pressão nas profundezas da Terra
Crê-se que o manto profundo é como um armário de armazenamento da Terra. Alguns pesquisadores acreditam que esses "bolsões de rocha derretida" por cima do núcleo poderiam existir lá desde quando o planeta se formou a 4,5 bilhões de anos. Outros cientistas também acreditam que o ciclo de convecção que move as placas tectônicas regularmente traz material antigo até a superfície, fazendo com que "os líquidos" do manto profundo estejam mais para tanques de armazenamento de curto prazo do que um ponto de acumulação.

Espinossauro

© Davide Bonadonna
© Tyler Keillor, Lauren Conroy e Erin Fitzgerald
Nome científico: Spinosaurus aegyptiacus, S. marocannus.
Significado do Nome: Lagarto Espinho Egípcio e Lagarto Espinho do Marrocos.
Tamanho: 15 a 18 metros de comprimento e 5,5 a 6 metros de altura aproximadamente.
Alimentação: Carnívora. Peso: 7 a 20 toneladas.
Viveu: Egito, Marrocos, Argélia e Tunísia - África e talvez Brazil.
Período: Cretáceo Inferior e Superior.
Veja onde viveu o mais longo dos terópodes!
© Patrick Król Padilha
Veja quando viveu o Spinosaurus!
© Patrick Król Padilha!
Você está lendo agora a terceira versão deste artigo. A primeira edição tinha apenas o intuito de melhorar a qualidade do texto, mas esta nova edição realmente se deve à novas descobertas. Se você está lendo este texto no dia ou mesmo na semana em que foi publicado, deve estar ciente que o dinossauro Spinosaurus acabou de ser totalmente transformado por um novo estudo. Nossa visão desse enorme predador era baseada em fósseis precários, alguns dos quais nem existem mais, além de noções impregnadas em nossas mentes pela mídia e indústria cultural (você mesmo Jurassic Park 3!). Sempre foi reconstruido como um predador de topo, 18 metros de comprimento, ágil e forte ao mesmo tempo, versátil, capaz de caçar em terra e na água, comendo desde carniça até peixes. 
Os primeiros registros desse animal já tem mais de 100 anos. Vários fragmentos desse gênero já foram encontrados, mas pouco se tem de material fóssil de tal predador, sendo que a maioria é bem fragmentário. Vamos ver a seguir os principais espécimes.

BSP 1912 VIII 19: este foi descoberto por Richard Markgraf em 1912 e descrito por Ernst Stromer em 1915. Originário da Formação Bahariya, tornou-se o holótipo com a criação do gênero e espécie. O material consistia dos seguintes pedaços, a maioria incompletos:
  • Partes da maxila
  • Partes da mandíbula com 75 cm de comprimento
  • 20 dentes
  • 2 vértebras cervicais
  • 7 vértebras dorsais
  • 3 vértebras sacrais
  • 1 vértebra caudal
  • 4 Costelas
  • Elementos da gastrália
A descrição original de Stromer indicava que o fóssil representava um único indivíduo, cujo esqueleto havia sido desarticulado e preservado sem qualquer vestígios dos membros. O crânio estaria presente, porém foi erodido em sua parte posterior, portanto somente parte da mandíbula e fragmentos da maxila restaram.
Das nove espinhas neurais (que formam a vela) a mais longa, associada com uma vértebra dorsal, tinha 1,65 metros. Stromer afirmou que o espécime viveu no Cenomaniano, cerca de 97 milhões de ano. Esse espécime foi destruído na 2ª Guerra Mundial, especificamente na noite de 24 para 25 de abril de 1944, quando um bombardeio britânico acertou Munique. O ataque prejudicou severamente os prédios da Paläontologische Staatssammlung München (Coleção de Paleontologia do Estado Bavário). No entanto, desenhos detalhados e descrições do espécime permanecem. O filho de Stromer doou os arquivos de seu pai para o Paläontologische Staatssammlung München em 1995 e Smith et al. analisou duas fotografias do holótipo descobertas no arquivo em 2000. Com base nas fotos da mandíbula inferior e uma foto do espécime todo montado, Smith concluiu que o desenho original era levemente incorreto. Em 2003, Oliver Rauhut sugeriu que o Spinosaurus de Stromer era uma quimera, composto de vértebras e espinhas neurais de um carcarodontossaurídeo parecido ao Acrocantossauro e dentes de Barionix ou Suchomimus. Essa análise foi rejeitada.
Única foto da mandíbula
© Acervo do Paläontologische Museum
Única foto do holótipo exposto antes do bombardeio
© Acervo do Paläontologische Museum
Reconstrução do Spinosaurus feita por Stromer em 1936
© Ernst Stromer
Mandíbula do holótipo
© Ernst Stromer
Vértebras do holótipo
© Ernst Stromer
Fósseis do holótipo
© Ernst Stromer
NMC 50791: mantido no Museu da Natureza Canadense, é uma vértebra cervical que tem 19,5 centímetros de comprimento coletada nas jazidas Kem Kem - Marrocos. É o holótipo do S. maroccanus tendo sido descrevido por Dale Russel em 1996. Outros espécimes referidos ao S. maroccanus no mesmo artigo eram duas outras vértebras cervicais (NMC 41768 e NMC 50790), um fragmento dentário anterior (NMC 50832), um fragmento dentário do meio (NMC 50833) e um arco neural dorsal anterior (NMC 50813). Russel afirmou que "somente informação geral sobre localidade poderia ser fornecida" para o espécime e portanto poderia ser datado apenas como possivelmente originário do Albiano. Vale ressaltar que, enquanto muitos aceitem a validade de S. maroccanus, grande parte da comunidade científica o classifica como sinônimo júnior de S. aegyptiacus ou até nomen dubium.
NMC 41852: um grande úmero descrito por Russel em 1996, como terópode indeterminado é atribuído ao gênero Spinosaurus por Ibrahim et. al. (2014) com base em similaridades morfológicas com Baryonyx e dado que o tamanho do osso é grande demais para pertencer a qualquer outro terópode encontrado na região de Kem Kem, uma vez que Spinosaurus é o mais longo dinossauro terópode encontrado na área.
MNHN SAM 124: pertence ao Museu Nacional de História Natural de Paris. É um focinho composto de pré-maxila parcial, maxila parcial, vômer e fragmentos dentários. Foi descrito por Taquet e Russell em 1998, media 13,4 a 13,6 centímetros de largura, porém não foi divulgado o comprimento do fóssil. Encontrado na Algéria, seria da época Albiana. Taquet e Russell acreditavam que o espécime, assim como um fragmento de pré-maxila (SAM 125), duas vértebras cervicais (SAM 126-127) e um arco neural dorsal (SAM 128) pertenciam a S. maroccanus.
MNHN SAM 124 
© FunkMonk
BM231: localizado na coleção do Instituto Nacional de Minas, Túnis, foi descrito por Buffetaut e Ouaja em 2002. Consiste de um fragmento dentário anterior de 11,5 centímetros de comprimento do Albiano inferior, da Formação Chenini - Tunísia. O fragmento dentário, que incluía quatro alvéolos e dois dentes parciais, era supostamente similar ao material de S. aegyptiacus.
BM231
© Buffetaut e Ouaja, 2002
UCPC-2: mantido na Coleção Paleontológica da Universidade de Chicago, consiste principalmente de dois ossos nasais estreitos conectados com uma crista sem crânio que seria localizada entre os olhos. O espécime que tem 18 centímetros de comprimento, foi localizado em rochas do início do Cenomaniano, parte das jazidas Kem Kem do Marrocos, em 1996. Foram descritas em 2005 por Cristiano Dal Sasso e colegas, do Museu Cívico de História Natural de Milão.
BM231
© Dal Sasso et al. (2005)
MSNM V4047: Este fóssil está no Museu de História Natural de Milão e foi descrito por Dal Sasso e colegas em 2005. Composto de focinho com premaxila parcial e ossos nasais parciais totalizando 98,8 centímetros de comprimento é proveniente das jazidas Kem Kem. Assim como UCPC-2, imagina-se ter vindo do Cenomaniano. De acordo com Dal Sasso et. al. (2005) o exemplar apresenta a sutura sagital fundida dorsalmente, o que é caracaterístico de um indivíduo adulto. Segundo o autor, esse fóssil foi encontrado em 1975 na cidade de Taoua, no Marrocos, em rochas da área de Kem Kem. Essas rochas fazem parte de um depósito continental que hoje se apresentam como red beds subjacentes ao Platô Hammada du Guir. Permaneceu em coleção particular até 2002.
MSNM V4047
© Ghedo
Simone Maganuco e o fóssil MSNM V4047
© Simone Maganuco
Outros exemplares conservados pelo Museu de Milão incluem os seguintes fragmentos:

MSNM V6353: Falange pedal III-1
MSNM V6849: Vértebra caudal distal
MSNM V6872: Vértebra dorsal anterior (D3-D4)
MSNM V6874: Vértebra Cervicodorsal (C10-D1)
MSNM V6877: Vértebra Cervicodorsal (C10-D1)
MSNM V6881: Vértebra dorsal anterior (D2)
MSNM V6886: Falange manual proximal
MSNM V6888: Falange pedal
MSNM V6893: Metacarpo direito III
MSNM V6896: Quadrado esquerdo (sub-adulto)
MSNM V6897: Falange pedal
MSNM V6900: Ílio esquerdo (sub-adulto)
MSNM V7142: Metatarso, porção distal
MSNM V7143: Vértebra dorsal anterior (D1-D2)

UCRC PV4: armazenado na Coleção de Pesquisa da Universidade de Chicago. Seção medial do dentário esquerdo com raízes de dentes, porém faltando as coroas (sub-adulto).

UCRC PV5: segundo a nova pesquisa de Ibrahim et. al. (2014) esse fóssil, armazenado na Coleção de Pesquisa da Universidade de Chicago, é uma vértebra caudal medial. No estudo somente há uma reconstrução em 3D, provavelmente obtida por escaneamento do fóssil.
Modelo 3D digital de UCRC PV5
© Ibrahim et. al. 2014

UCRC PV6: armazenado na Coleção de Pesquisa da Universidade de Chicago. Vértebra caudal distal.
UCRC PV7:
armazenado na Coleção de Pesquisa da Universidade de Chicago. Vértebra caudal dorsal.
UCRC PV8:
armazenado na Coleção de Pesquisa da Universidade de Chicago. Falange I do dedo I da mão esquerda.

UCRC PV601: outro fóssil apresentado por Ibrahim et. al. (2014), também pertence à Coleção de Pesquisa da Universidade de Chicago. É uma vértebra dorsal.
Modelo 3D digital de UCRC PV601
© Ibrahim et. al. 2014

FSAC-KK 11888: Foi adquirido pela Universidade de Casablanca, onde está armazenado. Esqueleto de um indivíduo sub-adulto encontrado na região de Kem Kem em 2008, quando Ibrahim estava liderando uma coleta, sendo que a identificação provisória como Spinosaurus foi feita por Ibrahim e Zouhri. Aparentemente elementos do mesmo espécime surgiram em Milão no ano de 2009 e Dal Sasso juntamente com Maganuco contataram Nizar Ibrahim relatando sobre os fósseis levados para a Itália. Em conjunto, os três pesquisadores (Dal Sasso, Maganuco e Ibrahim) contataram o coletor do fóssil e encontraram o sítio original da coleta. Em 2013 foi feito o trabalho de escavação completa do sítio que resultou na coleta de várias partes do esqueleto, contanto com a participação de Ibrahim, Zouhri, Dal Sasso, Sereno, Martill entre outros.

Pé de Spinosaurus reconstruído
© Ibrahim et. al. (2014)

Este fóssil apresentou-se bem mais completo que os espécimes previamente conhecidos desse gênero, apresentando porções do crânio e esqueleto pós craniano parcial, incluindo:
  • Crânio - porções fragmentárias
  • Coluna Vertebral - fragmentos
  • Manus (mão)
  • Cintura pélvica
  • Membros posteriores
Do crânio, os ossos identificados são porções dos ossos nasais, pré-frontais, esquamosais, quadratojugais, maior parte dos quadrados, partes do osso dentário, dentes isolados e possível lacrimal. Do esqueleto pós-crânio foram identificadas vértebras cervicais, dorsais, sacrais e caudais, costelas cervicais e dorsais parciais e chevrons parciais. Os membros dianteiros são representados por duas falanges do segundo dedo e base da falange 3. Ambos os lados da cintura pélvica e membros posteriores foram encontrados incluindo fêmures, tíbias, fíbulas, falanges pedais, ílio, ísquio e púbis. Um pé quase completo foi preservado, embora nenhuma parte dos tornozelos tenha sido encontrada.
Sendo este esqueleto bem mais completo que os demais, Ibrahim et. al. (2014) definem FSAC-KK 11888 como o Neótipo para Spinosaurus.

Quando um novo gênero é descoberto, o fóssil principal usado como base para sua descrição, geralmente o mais bem preservado disponível no momento do estudo, é designado como o espécime tipo ou holótipo, que servirá como referência para comparações com futuras descobertas. A partir dele é que se sabe se novos achados pertencem ou não ao gênero. O holótipo do Spinosaurus encontrado em 1912 e descrito por Stromer (1915) não mais existe, por isso Ibrahim et. al. (2014) justificam que seguindo as recomendações do Artigo 75.3 da Comissão Internacional de Nomenclatura Zoológica (ICZN) é necessária a atribuição desse novo espécime ao posto de neótipo. O Artigo 75.3 da ICZN diz que pode-se criar um neótipo quando é demonstrado que:
  • É excepcionalmente preciso;
  • Se trata de um táxon distintivo;
  • Existem detalhes permitindo o reconhecimento do espécime;
  • O holótipo foi destruído e as razões levaram a isso;
  • A evidência do neótipo é consistente com o que se sabe dos tipos já estudados;
  • Há evidências de que o neótipo provém de um local mais próximo possível da localidade do holótipo original;
  • O exemplar neótipo está localizado em instituição que pode preservar e disponibilizar o espécime para estudo.
UFMA 1.20.070, UFMA 1.20.443, UFMA 1.20.444 SL: Esses fósseis brasileiros estão na Universidade Federal do Maranhão, totalizando de acordo com Medeiros, (2006) 275 dentes incluindo exemplares completos e fragmentários. Alguns deles foram atribuídos ao gênero Spinosaurus, sendo que as bases de comparações foram descrições de materiais originais do gênero, inclusive de Stromer. Isso poderia indicar a possível presença do gênero no Brasil.
Além destes fósseis, outros fragmentos e dentes foram descritos ou mencionados, originados de diversas partes da África. No entanto tais fósseis são demasiadamente inconclusivos para poder com segurança atribuí-los a uma espécie já definida de Spinosaurus e muito menos para cunhar uma nova. A título de curiosidade, a classificação do Espinossauro é a seguinte: Animalia > Chordata > Reptilia > Dinosauria > Saurischia > Theropoda > Megalosauroidea > Spinosauridae > Spinosaurinae > Spinosaurus.
Vale mencionar aqui que Ibrahim et. al. (2014) consideram a espécie Spinosaurus aegyptiacus como a única válida, sendo S. maroccanus considerado nomen dubium. Também atribuem caráter de sinônimo júnior de Spinosaurus ao dinossauro Sigilmassasaurus brevicollis.
Esses fósseis forneceram aos paleontólogos informações suficientes sobre o animal para montar uma reconstrução razoável do bicho. Desde a descoberta em 1912, as vértebras dorsais chamaram mais atenção, pois eram diferentes das dos outros terópodes. As longas vértebras com suas espinhas neurais alongadas levaram Stromer a escolher o nome Spinosaurus, vindo do latim, significa "Lagarto Espinho", sendo que as várias vértebras alongadas eram dispostas verticalmente sobre o dorso e recobertas de pele formando uma espécie de "vela" ou "barbatana". Os dentes encontrados, 20 no total, eram lisos, cônicos e não possuíam serras como nos tiranossaurídeos ou carcarodontossaurídeos, além de serem mais finos e arredondados, algo incomum em um dinossauro predador. Os primeiros fósseis não deram uma noção precisa do formato do crânio do animal, por isso as primeiras ilustrações dele o mostravam com um crânio curto similar ao de outros terópodos e assim ele foi reconstruído por muitos anos, até bem recentemente para falar a verdade.
Spinosaurus, ilustração de 1975
© Giovanni Caselli
No geral sempre tivemos uma visão muito especulativa sobre a aparência desse dinossauro, pois a falta de material bem preservado impedia uma reconstrução mais fiel. Estranhamente, mesmo sem conhecer os braços desse dinossauro e antes da descoberta do Barionix, textos já afirmavam que ele possuía braços fortes e poderia andar em posição quadrúpede. 
Depois que novos espinossaurídeos foram encontrados e alguns fósseis adicionais do próprio Espinossauro surgiram, nossa visão sobre seu crânio mudou. Passamos a vê-lo com um crânio alongado similar ao de um crocodilo. Até agora acreditávamos que sua estrutura corporal deveria ser similar à de outros terópodos, com a diferença do crânio alongado e vela dorsal. Sempre foi retratado com pernas longas adaptadas para caminhar em terra firme, braços longos para segurar as presas, fossem dinossauros ou peixes. Imaginávamos o Espinossauro andando em terra firme a maior parte do tempo e de vez em quando parado à beira de um lago ou rio, ou mesmo com as pernas na água rasa, procurando peixes descuidados. 
Spinosaurus: reconstrução tradicional
© Damir G. Martin
Spinosaurus pescando
© Todd Marshall
Não preciso nem lembrar que muito do que o público leigo e até os fascinados por paleontologia entendiam como um Espinossauro deriva da reconstrução feita pela Universal Studios para o filme Jurassic Park 3 (2001). Um dinossauro enorme, robusto e feroz, ágil, capaz de nadar e predar em terra, até mesmo a ponto de matar um Tiranossauro (veja mais sobre isso mais ao fim do artigo).
Porém esse novo estudo publicado no último dia 11 de setembro por Ibrahim e colegas acabou virando de cabeça para baixo nossos conceitos sobre este predador, fazendo com que sua aparência seja reproduzida de agora em diante de forma muito diferente, como você deve ter notado na imagem do começo do post. O novo conceito para o Espinossauro é de um terópode longo, de membros curtos e atarracados, corpo comprido e focinho esguio, adaptado à vida aquática e à predação de peixes, além de sugerir uma postura quadrúpede quando em terra firme.
Spinosaurus com a nova postura em terra
© Luis V. Rey
O novo esqueleto parcial do Espinossauro encontrado traz ossos que jamais haviam sido encontrados antes, dos membros! As pernas desse dino enigmático nunca tinham sido encontradas, nem seus pés, por isso não sabíamos qual o comprimento delas e a tendência era retratá-lo com base no Barionix, Suchomimus entre outros animais mais completos.
Mas em vez de irmos direto às pernas, vamos começar analisando a cabeça dele, afinal, é uma área bem distintiva entre os dinossauros deste grupo. O crânio, como indicado por UCPC - 2, possuía uma crista fina entre os olhos bem no meio do crânio. O focinho, como se nota em MSNM V4047 apresenta um diástema, uma espécie de abertura ou concavidade próximo à ponta da boca, sendo que na frente havia 6 a 7 dentes de cada lado, e depois dessa concavidade haviam em média 12 dentes, sendo que o segundo e terceiro dentes de cada lado eram especialmente grandes. Esse tipo de dentição levou os pesquisadores a imaginar que em vez de matar presas grandes ele comesse peixes, assim não necessitando de dentes serrilhados para rasgar carne. Esses dentes pertenciam à mandíbula também diferenciada, fina, estreita nas laterais e alongada, deixando o Spinosaurus com cara de crocodilo, mais uma característica indicando hábitos piscívoros.
Reconstrução de Ibrahim et. al.: em azul a parte conhecida
© Davide Bonadonna
O crânio MSNM V4047 do Museu de Milão é parcial e tem 98 centímetros, porém as estimativas de seu comprimento total chegam a 1,75 metros com base da parte posterior de crânios já conhecidos de outros espinossaurídeos, especialmente Irritator. No entanto alguns pesquisadores alertam que essa medida pode não ser exata devido à variação de forma entre crânios de diferentes espécies de espinossaurídeos, embora ainda seja a medida mais correta disponível. O crânio apresenta as narinas em posição elevada, próximas dos olhos, o que facilitaria a respiração quando sua cabeça estivesse na água em busca de alimentos.
© Davide Bonadonna
Outro fato intrigante é que nesse fóssil há uma vértebra de peixe presa num dos alvéolos, entre um dente e a parede do alvéolo (orifícios onde se fixam os dentes) que no trabalho os autores identificam como sendo do gênero Onchopristis, um tipo de peixe serra abundante nas mesmas rochas de onde vem o Spinosaurus.
Espinossauro tradicional captura Onchopristis
© Mahamad Haghani
Onchopristis
© BBC
Com o tempo mais e mais estudos indicavam os hábitos aquáticos do Espinossauro, como por exemplo Amiot et. al. (2010) que analisou a quantidade de isótopos de 18O (Oxigiênio 18) no esmalte dentário de vários espinossaurídeos e comparou com a quantia do mesmo isótopo em animais terrestres (mamíferos, dinossauros) e aquáticos (crocodilos, tartarugas) para saber se havia diferenças. Animais que passam muito tempo na água tendem  ter menor quantidade desse isótopo impregnado nos dentes e ossos. O resultado indicou que a maioria dos dentes de espinossaurídeos de fato possuía menor quantia do isótopo, indicando que estes animais passavam muito tempo na água. No entanto os autores na época não podiam observar adaptações anatômicas à vida aquática em nenhum espinossaurídeo, portanto levantaram hipóteses de que estes animais deveriam entrar na água para fazer regulagem de temperatura. 
O estudo de Ibrahim et. al. (2014) acaba de complementar estas evidências com um novo achado que fortalece a ideia de que pelo menos o Spinosaurus era capaz de nadar. No estudo uma nova reconstrução esquelética do dinossauro é proposta com base nos fósseis encontrados em 2013 e em alguns outros já conhecidos, o que permitiu a montagem de um esqueleto bem completo do animal.
A nova reconstrução utilizou fósseis de vários indivíduos de idades e tamanhos diferentes, porém segundo os autores foram feitas correções para compensar as diferenças e manter o resultado proporcionalmente correto.
© Tyler Keillor, Lauren Conroy e Erin Fitzgerald
Como pode observar no esqueleto acima, são vários indivíduos utilizados, escaneados por tomografia computadorizada a fim de produzir modelos digitais em 3 dimensões. Em vermelho estão os ossos do novo esqueleto (neótipo), encontrado em 2013. Em laranja os ossos do espécime de Stromer, em amarelo ossos isolados de Kem Kem, em verde ossos emprestados/baseados em Suchomimus, Baryonyx, Irritator e Ichthyovenator. Finalmente, em azul o ossos recriados por inferências a partir dos ossos adjacentes. O pequeno ponto vermelho perto da coluna à frente das pernas mostra o centro de massa (ponto de equilíbrio).

Estudos com tomografia computadorizada revelaram espaços no crânio do Espinossauro que possivelmente abrigariam órgãos sensíveis à pressão, similares aos vistos em crocodilos modernos, usados para sentir presas debaixo da água sem mesmo vê-las. As narinas situadas mais próximas dos olhos indicam que frequentemente mantinha a cabeça na água. 
Funcionamento do órgãos sensoriais
© Davide Bonadonna
Em laranja os canais da rede neurovascular
© Ibrahim et. al. (2014)
Segundo Ibrahim e colegas, as vértebras em sua maioria tem seu centro alongado, o que contribui para um corpo mais comprido, facilitando assim a mobilidade do pescoço e torso, principalmente em sentido vertical. Isso proporciona melhor movimento para captura de presas debaixo da água. Curiosamente, as vértebras da base da cauda seriam mais curtas com arcos neurais reduzidos, por sua vez facilitando a movimentação lateral da cauda, que deveria ser usada para impulsionar o animal durante a natação.
Ainda análises dos membros dianteiros indicaram a capacidade muscular elevada, adaptada para realizar flexões e extensões poderosas, além da mão se mostrar mais longa que em espinossaurídeos mais antigos.
Os membros traseiros se mostraram muito mais curtos que o normal para dinossauros bípedes, embora os espinossaurídeos sejam conhecidos por apresentar membros traseiros mais curtos, o que foi observado nesse caso é bem mais extremo do que o esperado. E é aqui que a comunidade virtual interessada em paleontologia, incluindo paleontólogos, paleoartistas e leigos ficaram estupefatos e intrigados, pois jamais um terópode foi reconstruído com proporções tão dramáticas, que em si indicam quadrupedalismo obrigatório em terra.
O paleoartista Scott Hartman, especializado em reconstruir esqueletos fósseis que publica em seu site, Skeletal Drawing, publicou um artigo falando sobre  nova descoberta aqui. Ele escreve comentando que embora o estudo seja muito bem feito, e na maior parte traz ótimas informações sobre a espécie, houve erro na ilustração e reconstrução do esqueleto, sendo que baseado nas medidas do quadril relacionadas às vértebras, cujas medidas são dadas pelos autores, o esqueleto deveria ter pernas pelo menos 27% maiores do que retratado. Ele mesmo editou o esqueleto fornecido de forma rápida para demonstrar como essa diferença mudaria tanto o centro de massa quanto parte da ecologia do animal. Na imagem abaixo você confere acima o esqueleto como originalmente publicado pelos autores do estudo e abaixo a correção feita por Hartman. As linhas foram adicionadas por mim para facilitar a visualização das diferenças.
Esqueleto corrigido por S. Hartman
© Ibrahim et. al. (2014)/ modificado por Hatman

De qualquer forma o fato de que as evidências realmente apontam para um animal aquático e piscívoro são muito fortes, somente o quadrupedalismo obrigatório, na opinião de Hartman, deveria ser revisto. Se a proporção dos membros estiver incorreta ele ressalta, o erro causaria erros de interpretação em toda a ecologia do animal. Precisamos agora é esperar mais análises para saber se realmente as proporções apresentadas são as mais corretas ou merecem revisão.
Os autores indicam que os membros apresentam proporções que lembram cetáceos primitivos (baleias) e mamíferos semi-aquáticos atuais, que usam as pernas para gerar propulsão na água.
Hábitos aquáticos: note as membranas interdigitais
© Davide Bonadonna
Análises dos pés que apresentam estrutura mais plana, inclusive nas garras, sugerem que o pé poderia ser adaptado para pisar em substrato mole no fundo da água, não permitindo que o animal se atolasse ou ainda que possivelmente poderia suportar uma membrana interdigital (vide imagem acima) para melhor empurrar a água durante a movimentação.
Ossos de mamíferos atuais que estão em processo de transição de habitats terrestres para aquáticos tendem a apresentar maior densidade, menor ou quase nenhum espaço interno para medula, a fim de produzir melhor controle do corpo na água, que afunda com mais facilidade, mantendo o animal estável sob a água quando mergulha, como é o caso dos Hipopótamos. De forma muito similar os ossos do Spinosaurus apresentam a mesma característica, praticamente nenhum espaço medular nos espinhos neurais e ossos longos como fêmur, o que proporciona um aumento de 30% a 40% na densidade do animal se comparado com os demais terópodes. Observe abaixo os cortes transversais do fêmur direito de Spinosaurus e do fêmur direito de Suchomimus, enquanto que o Espinossauro apresenta osso denso praticamente maciço, Suchomimus apresenta osso oco com grande canal medular (área preta no dentro do osso).
Fêmur de Spinosaurus (A) e Suchomimus (B)
© Ibrahim et. al. (2014)

Densidade óssea de Spinosaurus
© Ibrahim et. al. (2014)
O cálculo do centro de massa do animal sugere que ele não seria capaz de caminhar de forma bípede em terra, portanto os autores sugerem hábitos de quadrúpedes fora da água, não deixando de lembrar que o centro de massa posicionado mais à frente, como calculado, tenderia a auxiliar no equilíbrio natatório do animal.
Nadando
© Davide Bonadonna

Por último, os autores ainda tratam da questão da vela dorsal, que segundo eles era coberta apenas com um camada justa de pele e não com músculos ou gordura como sugerido. Embora já tenha-se cogitado que a vela serviria para diversas funções incluindo regulação da temperatura, Ibrahim et. al (2014) afirmam que baseando-se em comparações feitas com uma espécie de camaleão atual (Trioceros cristatus) e marcas de estrias nos ossos e no fato que as espinhas são extremamente densas e pouco vascularizadas, não seriam efetivas para realizar controle de temperatura, sendo principalmente uma estrutura visual para display, que durante o nado ficaria visível acima da superfície da água.

Basicamente o Spinosaurus foi o mais longo terrestre já registrado, com seus aproximados 18 metros de comprimento era maior que o afamado rei dos dinossauros, o Tiranossauro rex e também maior que o Carcharodontosaurus saharicus e Giganotosaurus carolinii. Em seu estudo, Dal Sasso et. al. (2005) comparou o tamanho do Espinossauro com o do Suchomimus, usando-o como modelo para estimar o tamanho total do corpo do S. aegytiacus e sua estimativa chegou a 18 metros de comprimento e 7 a 9 toneladas, por isso muitos questionam tais medidas.

Por outro lado, em 2007 François Therrien e Donald Henderson recalcularam as medidas do dino, diminuindo seu comprimento para 12 a 14 metros e seu peso sendo, por sua vez, aumentado, para 12 a 20 toneladas. Mas devido terem usado tiranossaurídeos e outros carnossauros como base para seu estudo, muita credibilidade foi perdida, pois tais dinossauros tem proporções diferentes de espinossaurídeos.
Por fim, Ibrahim et. al. (2014) afirmam apenas que o esqueleto completo montado durante a pesquisa após impresso a partir dos modelos em 3D passaria dos 15 metros de comprimento, embora não explicitem valores exatos.
Comparação entre maiores terópodes 
© Davide Bonadonna/ Matt Martyniuk
O Espinossauro Conviveu com grandes saurópodes como Paralititan e Aegyptosaurus e também com o Carcharodontosaurus, outro enorme predador do cretáceo superior. Deltadromeus e Bahariasaurus, que podem inclusive ser sinônimos, também viviam no mesmo ambiente, assim como o crocodilo Stomatosuchus e o Celacanto Mawsonia, além é claro do peixe serra Onchopristis prováveis presas do terópode. Nas mesmas rochas onde o novo esqueleto foi achado já foram coletados Rebbachisaurus, um tipo de abelissaurídeo e o já citado Deltadromeus. Onde hoje é o Egito, seria uma área costeira no Cenomaniano, com manguezais onde o Espinossauro poderia pescar, com entre-marés alagando a região.
Além da vértebra de peixe serra presa no crânio como já mencionado, não há evidência direta de que presas o Espinossauro comia, mas imagina-se que tal espécie fosse muito oportunista, variando a dieta conforme a disponibilidade de tipos alimentares. A nova pesquisa de Ibrahim et. al. (2014) sugere dieta predominantemente piscívora, no entanto não creio que havendo uma carcaça de dinossauro em seu caminho, o Spinosaurus deixaria de aproveitar. Dentes de espinossaurídeos foram achados em pterossauros aqui no Brasil, porém os espinossaurídeos brasileiros não parecem ter as mesmas proporções extremas e seriam mais ágeis em terra firme. Na Inglaterra foram achados restos de peixes (escamas parcialmente digeridas) e ossos de Iguanodon no estômago do Barionix, o que indica que espinossaurídeos deveriam comer um pouco de tudo.

É intrigante pensar que após mais de um século finalmente temos uma melhor visão da estrutura anatômica desse dinossauro e que mesmo antes de termos fósseis mais completos como agora já se supunha a postura quadrúpede.
O Espinossauro geralmente é retratado como sendo bípede, porém na década de 1970 era comumente mostrado apoiado em todas as quatro patas, o que foi supostamente apoiado pela descoberta dos fósseis do Baryonyx, que tinha braços mais reforçados. No entanto, as mãos dos Terópodes não podiam ser apoiadas viradas para trás, pois as palmas ficavam viradas em direção uma da outra. O novo estudo indica essa postura quadrúpede embora não apresente evidências em relação aos braços serem adaptados a tal função, nem explica direito o modo como a mão seria apoiada no solo. As ilustrações e modelos digitais produzidos para divulgação da descoberta no entanto mostram o animal apoiado estranhamente nas "costas" da mão, de modo similar ao que os Gorilas fazem.
Spinosaurus em pose quadrúpede anterior ao estudo
© TopGon

O Espinossauro há muito tempo vem sendo estudado e recentemente classificado como um dos maiores terópodes, mas isso só veio a público quando foi retratado em Jurassic Park 3 (2001) com 18 metros de comprimento. No longa o Espinossauro vence uma luta contra o T.rex, tido por muitos como rei dos dinossauros, o que fez com que o "Rex" ganhasse um rival na popularidade. 
No entanto, precisamos lembrar que apesar de maior, a maioria das especulações diz que seria improvável que o Espinossauro viesse a ganhar a luta da maneira mostrada no filme, afinal, suas mandíbulas mais finas não teriam força para segurar um T.rex. A situação fica pior ainda agora que o Espinossauro passa a ser retratado como um dinossauro aquático de pernas curtas que mal consegue se manter ereto em terra firme. Na verdade estes dois dinos nunca se encontraram, viviam em locais e tempos diferentes.
Espinossauro de Jurassic Park 3
© Universal Pictures

Também aparece frequentemente em livros e miniaturas colecionáveis, como action figures, revistas de coleção, desenhos animados como Dinossauro Rei, Dinosaur Train entre outros meios de mídia. O documentário "Criaturas Titânicas" mostrou um episódio sobre o Espinossauro, mas muitos erros foram cometidos. Confira mais sobre este documentário clicando aqui.
Spinosaurus de Criaturas Titânicas
© Discovery Channel

Ainda temos muito a aprender sobre o Espinossauro e as descobertas que o futuro nos reserva são imprevisíveis. Como esse novo achado nos mostra, na paleontologia muita coisa pode mudar de um dia para outro. Parece que a partir de agora, imagens como esta abaixo devem se tornar mais e mais raras.
© Sérgio Pérez