sábado, 7 de março de 2015




A posição atual das massas continentais em relação ao globo terrestre é o reflexo do trinômio Tectônica de Placas + Espalhamento do Fundo Oceânico + Deriva Continental.
Nos primeiros 500 milhões de anos de sua orígem (4.560 a 4.000 milhões de anos) a superfície da Terra era muito pouco rígida. A individualização da crosta que constitui os continentes ocorreu a aproximadamente 4.000 milhões de anos. Desde então as massas continentais vem  mudando de posição e de forma, sofrendo processos de orogenias, rifteamentos e granitização.
 
A maioria dos autores acredita que a tectônica de placas venha atuando desde o início do Proterozóico (2.500 milhões de anos). Algumas evidências sugerem que esse processo deve ter ocorrido já no Arqueano ( a partir de 3.800 milhões de anos) só que de uma maneira diferente da atual, já que o fluxo térmico global era muito mais alto.
 
Geometricamente, essas massas continentais à deriva, tendem a se aglutinar de tempos em tempos (segundo Bley, et al, 1995 seriam ciclos de 500 a 600 milhões de anos) formando supercontinentes, que, com a continuidade dos processos tectônicos, se quebram em vários pedaços, recomeçando o ciclo.
 
Segundo Park, 1997 durante o Arqueano, havia em torno de 20 áreas cratônicas já se estabelecendo, como por exemplo o Escudo Báltico (atual Europa), partes da América do Norte e da China e, no Brasil, o Craton Amazônico e o Craton do São Francisco, que apresentam idades que vão até 3.400 milhões de anos.
 
Rogers, 1996 sugere que o primeiro grande continente tenha sido formado a aproximadamente 3.000 milhões de anos. Esse continente se chamava Ur (o nome vem do alemão Ur, original, e também da cidade de Ur, uma das mais antigas do mundo), e era constituído  de cinco crátons e seus extensos depósitos de sedimentos, todos muito próximos: Kaapvaal, na África, Dharwar, Bhandara e Singhbhum, na Índia e Pilbara, na Austrália, e mais três pequenas áreas estáveis na Antártica.

 

Configuração sugerida por Rogers, 1996 para o supercontinente Ur.
Modificado de Rogers, op. cit.


No final do Arqueano (2.500 milhões de anos) várias áreas cratônicas já tinham se estabilizado, e alguns autores sugerem que a maior parte dessas áreas cratônicas estaria aglutinada em um supercontinente chamado Kenorano (Mason, 1995 e outros) sendo que os dados ainda não são totalmente conclusivos.
 
Segundo Brito Neves et al. 1995 a dinâmica interna da Terra desfavorece o estabelecimento de continentes gigantes, e os mesmos têm vida muito curta (em torno de 100 milhões de anos), uma vez que enquanto algumas áreas ainda estão sendo coladas, outras já estão começando a se romper. Assim sendo, o supercontinente Kenorano rapidamente se fragmentou em diversos blocos continentais menores.
O Paleoroterozóico (2.500 à 1.600 milhões de anos) é marcado pela  construção de plataformas continentais em torno dos núcleos arqueanos estáveis associadas à magmatismo.
 
De 2.300 a 1.800 milhões de anos ( Períodos Riaciano e Orosiriano) evidências geológicas, geofísicas e geocronológicas sugerem processos de aglutinação de massas continentais, granitização e colagens orogênicas (Bley et al, 1996 e outros).Esses processos de colagem de terrenos deixaram registros em diversos locais do mundo e recebem várias denominações: Eburneano, Barramundi, Aravalli, Penoqueano, Hudsoniano, Rinkiano, Svecofeniano, etc. No Brazil essa sucessão de colagens é chamada de Evento Transamazônico. Como resultado dessas colagens temos a formação dos continentes Ártica (partes da América do Norte + Groenlândia + Sibéria) e Atlântica (partes da América do Sul e África).
 



Configuração proposta por Rogers, 1996 para os continentes Atlântica, Ártica e Ur, A disposição correspode à
posição que esses continentes ocuparam no Supercontinente Pangea (~300 Ma).
Modificado de Rogers, op. cit.



Após esse período em que os continentes só cresciam, no período Estateriano (1.800 à 1.600 milhões de anos) teve início uma fase de extensão (tafrogênese), que viria a resultar na quebra desses grandes continentes em vários blocos menores.
 
Ao longo do Mesoproterozóico (1.600 à 1.000 milhões de anos) uma nova sucessão de colisões entre placas e orogeneses denominada Colagem Grenville foi responsável pela fusão de praticamente todas as áreas continentais (Atlântica, Ur, Báltica e Antártica) em um gigantesco continente chamado Rodínia (McMenamin & McMenamin, 1990 à partir da palavra russa: Rodina = terra mãe, e Hoffman, 1991), com uma área de 120 x 106km2.
Segundo Rogers, 1996 entre 900 e 700 milhões de anos o supercontinente Rodínia aparentemente iniciou sua fase de quebras, e se fragmentou ao longo de dois grandes riftes, gerando tres blocos principais: Gondwana Leste, Laurentia e Gondwana Oeste.


Configuração provável da distribuição dos blocos continentais após a quebra do Supercontinente Rodínia.
Modificada de Rogers, 1996.



O Bloco Laurentia é constituido de partes da América do Norte e Europa, Groenlândia e Sibéria). O bloco Gondwana Leste, compreendendo parte da África e Antártica (Craton Kalahari- Grunehogna), Madagascar, Índia e Austrália permaneceu praticamente coeso até o Mesozóico. Já o bloco Gondwana Oeste foi precocemente dividido em diversas áreas cratônicas: Amazônia, África Leste, Rio de la Plata, e vários blocos menores: Pampia, Central de Goiás, Juiz de Fora, Luis Alves, entre outros (Unrug, 1996).
 
Nos espaços entre esses blocos se desenvolveram riftes, aulacógenos e braços e/ou pequenos oceanos (Bley, 1999). Nesse contexto, uma feição que merece destaque no nosso continente é o desenvolvimento do Oceano Adamastor (Hartdany et al., 1985) entre o sudeste da América do Sul e o Sudoeste da África, representado pelos sedimentos da Faixa Dom Feliciano e parte da Faixa Ribeira. Já a separação entre Laurentia e Gondwana Leste a 720 milhões de anos (Powell et al., 1993) deu orígem ao Oceano Pacífico atual.
 
Durante o Neoproterozóico (1.000 a 545 milhões de anos), os blocos constituintes de Gondwana Leste e Oeste se movimentaram ao redor do globo e vieram estabelecer o megacontinente Gondwana ( = terra dos Gonds, antigo povo da Índia), durante um estágio de colagens chamado Evento Pan-Africano/ Brasiliano. Esse evento se iniciou a 750-730 milhões de anos e teve suas últimas manifestações a 490 -480 milhões de anos, durante o Período Ordoviciano.

Como representantes dessas colagens no Brasil temos as faixas móveis Brasília (colisão entre o Craton Amazônico e o Cráton do São Francisco - Pimentel & Fuck, 1992) e Ribeira (na sua porção central representando uma colisão entre a Microplaca Serra do Mar e o terreno Juiz de Fora com o Craton do São Francisco - Heilbron et al., 1998), dentre outras.

 

Mapa esquemático do continente Gondwana.
Modificado de Trompette, 1994.



No início da Era Paleozóica nos deparamos com mais um processo de reorganização das massas continentais, com um padrão complexo de movimento que inclui até rotação de continentes. Tem inicio, então, uma nova fase extensional, fragmentando Laurentia, Báltica, Sibéria e Gondwana e gerando o Oceano Iapetus (entre Laurentia e Gondwana).
 
No interior dos continentes os processos extensionais também atuaram, gerando subsidência de várias regiões e permitindo o desenvolvimento de extensas bacias deposicionais, que no nosso continente podem ser exemplificadas pelas bacias do Parnaíba, Amazonas e Paraná.
Com o decorrer da Era Paleozóica, a acreção de pequenos blocos litosféricos e colisões como a Orogenia Appalachiana (colisão entre Laurentia e Gondwana) e a Orogenia Uraliana (colisão do bloco da Sibéria com Laurentia) resultaram em um grande continente chamado Pangea (do grego pan = toda + gea = terra). Esse continente tinha uma disposição alongada, se extendendo do polo norte ao polo sul. O restante da superficie da Terra era coberto por um grande oceano chamado Panthalassa (do grego pan = todo + thalassa = oceano), com excessão de um pequeno mar à leste de Pangea, chamado Tethys (que hoje é representado pelo Mar Mediterrâneo).
 
O mesmo processo fusão/fissão, que possibilitou a união do Pangea, trata agora de rompe-lo e separa-lo em blocos novamente. A separação desses blocos durou aproximadamente 100 milhões de anos, se extendendo pelos períodos Jurássico e Cretáceo.
A primeira grande "quebra" separou Pangea em 2 blocos: Laurásia (América do Norte+Europa +Ásia) e Gondwana (América do Sul, África, Antártica, Austrália e Índia).
Esses dois grandes continentes foram se subdividindo em blocos menores, e no final do Jurássico tinhamos quatro grandes blocos: Laurásia, Índia, América do Sul + África e Austrália + Antártica.

 

Posição dos blocos continentais no supercontinente Pangea.
Modificado de Rogers, 1996.



Conforme os blocos continentais recém-partidos reiniciavam o processo de deriva continental, recomeçavam as colisões. No final do Período Cretáceo tem início as orogenias Alpina, na Europa (colisão entre África e Europa), Laramide, na América do Norte ( colisão entre a placa do Pacífico e a América do Norte) e Mirano, na América do Sul (colisão entre a placa de Nazca e a América do Sul.
 
Com relação aos estudos desses megaprocessos de formação e quebra de continentes no bloco que hoje constitui a América do Sul, é necessária uma menção especial aos artigos de Benjamin Bley de Brito Neves e colaboradores, inúmeras vezes citado no presente trabalho. Esse autor vem trabalhando de forma sistemática há pelo menos 10 anos nesse assunto, e sua pesquisa gerou diversos artigos, dentre eles: Brito Neves, 1990, 1992, 1993, 1998, 1999; Brito Neves & Cordani, 1991, Brito Neves & Sato, 1998 e Brito Neves et al., 1995, 1996, 1998.
 
 
  

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