Em busca de uma teoria unificada
7/1/2011Por Fábio de Castro
Agência FAPESP – A teoria da relatividade geral explica a gravidade. A mecânica quântica explica as forças nucleares e o eletromagnetismo. Conciliar as duas teorias é um dos maiores desafios para a física.
A solução mais eficiente até agora para unificar gravitação e mecânica quântica é a chamada teoria das supercordas, que está em plena construção. Nos últimos dez anos, o esforço internacional para promover avanços nessa área tem contado com a importante participação de pesquisadores ligados ao Projeto Temático "Pesquisa e ensino em teoria de cordas", financiado pela FAPESP.
Sob coordenação de Nathan Jacob Berkovits, professor titular do Instituto de Física Teórica (IFT) da Universidade Estadual Paulista (Unesp), o projeto é o terceiro realizado sobre o tema desde 2000. Naquele ano, Berkovits apresentou uma formulação matemática inovadora, desenvolvida ao longo de 15 anos, que ficou conhecida como “espinores puros”. Esse formalismo tem sido importante, na última década, para facilitar os cálculos relacionados ao estudo da teoria das supercordas. Em 2009, ele recebeu o Premio em Fisica de TWAS (Academia de Ciencias do Mundo em Desenvolvimento) em reconhecimento deste trabalho.
Projeto Temático coordenado por Nathan Berkovits (IFT-Unesp) contribuiu nos últimos dez anos para promover avanços na teoria das supercordas e em seu ensino. Área de fronteira poderá unificar gravitação com as outras forças (Wikipedia)
Desenvolvida a partir da década de 1960, a teoria das supercordas é um modelo físico no qual os compomentes fundamentais da matéria não são os pontos sem dimensão que caracterizavam as partículas subatômicas na física tradicional, mas objetos extensos unidimensionais, semelhantes a uma corda. Dependendo do “tom” da vibração dessas cordas, elas corresponderiam a cada partícula subatômica.
De acordo com Berkovits, o Projeto Temático, que envolve uma série de parcerias internacionais, tem explorado as aplicações dos espinores puros em várias frentes no desenvolvimento da teoria de supercordas.
“A teoria de supercordas é a tentativa mais bem sucedida até agora para unificar a gravitação e a mecânica quântica, teorias cuja conciliação corresponde a uma tarefa muito difícil. Os físicos teóricos também sonham que a teoria das supercordas possa unificar todas as forças e partículas fundamentais da natureza, mas isso, por enquanto, é apenas um sonho”, disse Berkovits à Agência FAPESP.
Os avanços no campo teórico, no entanto, são bastante reais. O formalismo dos espinores puros tem sido a ferramenta mais apropriada para o estudo da correspondência AdS/CFT (sigla em inglês para espaço anti-de-Sitter / teoria do campo conformal) – também conhecida como a conjectura de Maldacena.
Essa conjectura, proposta pelo argentino Juan Maldacena em 1997, deu um impulso sem precedentes à teoria das supercordas e à pesquisa sobre a gravitação quântica. O artigo no qual Maldacena propôs a conjectura teve mais de 3 mil citações e se tornou um dos principais marcos conceituais da física teórica na década de 1990.
“Além de trabalharmos a aplicação dos espinores puros ao estudo da correspondência AdS/CFT, temos avançado na aplicação desse formalismo a outras frentes também, como o cálculo da amplitude de espalhamento”, contou Berkovits.
O estudo do espalhamento de cordas – que está relacionado ao espalhamento de partículas – enfrenta grandes dificuldades quando as partículas envolvidas são férmions. Todas as partículas elementares da matéria são férmions ou bósons, que têm spin semi-inteiros ou inteiros, respectivamente, e obedecem mecânicas estatísticas diferentes.
“Com a aplicação do formalismo dos espinores puros, o estudo do espalhamento de cordas envolvendo férmions não é mais difícil que os casos que envolvem bósons. Outra vertente na qual trabalhamos com a aplicação do formalismo dos espinores puros é a teoria de campos de cordas, que ainda está em estágio inicial de desenvolvimento”, explicou.
Segundo Berkovits, quando o físico teórico descreve uma partícula, emprega uma variável que descreve a sua posição. Mas quando se trata de uma partícula com spin – como fótons ou elétrons – a variável da posição não é suficiente para a descrição.
“Existem várias maneiras para descrever o spin e a mais tradicional foi o formalismo de Ramond-Neveu-Schwarz, concebido em 1973. Mais tarde, em 1980, foi desenvolvido o formalismo de Green-Schwarz – uma nova maneira de descrever o spin que trazia algumas vantagens. Mas trazia desvantagens também: ele não preservava a invariância de Lorentz, uma importante propriedade relacionada às rotações do espaço-tempo”, disse.
Desde 1980, portanto, os físicos teóricos vinham tentando resolver os problemas com o formalismo de Green-Schwarz. Até que em 2000 o formalismo dos espinores puros resolveu a questão da descrição do spin de partículas de uma maneira que preservava todas as simetrias presentes na teoria da relatividade.
Comunidade internacional
Estima-se que existam atualmente cerca de 2 mil pesquisadores envolvidos com o estudo de teoria das supercordas. Berkovits tem trabalhado com cerca de 50 deles. O Projeto Temático que coordena se beneficia das conexões internacionais de seus pesquisadores participantes.
“Além dos estudos feitos pelos nossos pós-doutorandos e pós-graduandos, temos muitas colaborações no exterior. Trazemos uma série de especialistas para colaborar conosco e participar de congressos que organizamos e, por outro lado, enviamos frequentemente alunos para trabalhar com equipes internacionais e participar de eventos”, disse o pesquisador que recebeu em 2009 o Prêmio de Física da Academia de Ciências para o Mundo em Desenvolvimento (TWAS).
O grupo envolvido diretamente com o Temático tem atualmente um aluno de pós-doutorado, três de doutorado, três de mestrado e um de iniciação científica. Dois professores recentemente contratados pelo IFT também atuam no projeto. Outros alunos já passaram pelo grupo e agora atuam em outras universidades do Brasil e do exterior.
“Estamos contribuindo para a formação de uma comunidade envolvida com o estudo da teoria das supercordas. É uma importante e fértil área de fronteira, mas que ainda conta com pouca gente no Brasil, em comparação com o resto do mundo”, afirmou.
O interesse pela área, no entanto, está aumentando. Prova disso foi a alta procura pela participação no evento realizado em dezembro pelo IFT e pelo Centro Internacional de Física Teórica (ICTP, na sigla em inglês), da Unesco. “Recebemos 200 inscrições e só podíamos aceitar metade”, disse Berkovits.
O curso, intitulado Escola ICTP-Capes Latino-Americana de Cordas, reuniu alguns dos principais pesquisadores do mundo na área, como Juan Maldacena e o norte-americano Joe Polchinski – ambos vencedores do prêmio Dirac – a mais importante premiação da área da física depois do Prêmio Nobel.
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