terça-feira, 11 de dezembro de 2012

À caça das tarântulas

Pesquisador brasileiro descreve nove espécies de aranhas-caranguejeiras arborícolas das regiões Nordeste, Sudeste e Centro-oeste. 
 
Por: Catarina Chagas
Publicado em 11/12/2012 | Atualizado em 11/12/2012
À caça das tarântulas
As espécies de ‘Typhochlaena’ são as menores aranhas caranguejeiras arborícolas conhecidas. Na foto, a ‘Typhochlaena amma’, de corpo escuro com brilho azul metálico. Ela vive no alto das serras do estado do Espírito Santo. (foto: Rogerio Bertani) 
 
A biodiversidade ainda nos prega peças. Muito tempo depois das viagens empreendidas pelos primeiros naturalistas ao interior do Brasil e após inúmeros estudos realizados e publicados, é difícil acreditar que ainda exista tanto a conhecer sobre a fauna e a flora brasileiras. Porém, quando nos deparamos com um artigo que descreve, de uma só vez, nove espécies de um grupo superespecífico – aranhas-caranguejeiras arborícolas da mata atlântica e do cerrado –, resta-nos admitir que ainda há muito a descobrir.

Único autor do artigo de 94 páginas que descreve minuciosamente os animais encontrados – publicado em outubro na revista Zookeys –, o biólogo Rogerio Bertani, do Laboratório Especial de Ecologia e Evolução do Instituto Butantan, levou cerca de uma década para concluir o trabalho. “Decidi trabalhar com as caranguejeiras arborícolas que ocorrem no Nordeste, Sudeste e Centro-oeste do Brasil por serem extremamente mal conhecidas”, conta. “O resultado é que existe uma riqueza de espécies muito interessante, com muitas espécies novas e exclusivas do Brasil e dessas regiões em particular”. A diversidade encontrada na mata atlântica e no cerrado, segundo o pesquisador, rivaliza com a da região amazônica, onde as espécies arborícolas são mais conhecidas.

“Decidi trabalhar com as caranguejeiras arborícolas que ocorrem no Nordeste, Sudeste e Centro-oeste do Brasil por serem extremamente mal conhecidas”
Das nove espécies descritas no trabalho, a maioria foi encontrada em coleções científicas de instituições como o Museu Nacional, no Rio de Janeiro, e o próprio Instituto Butantan, em São Paulo. Outras foram encontradas durante expedições científicas realizadas pelo próprio Bertani em áreas pouco amostradas – foi o caso da Mata do Pau-Ferro em Areia, na Paraíba, dos campos rupestres na Chapada Diamantina, na Bahia, e do Delta do Paranaíba, no Piauí. Por fim, o biólogo recebeu também a colaboração de colegas que encontraram caranguejeiras em seus trabalhos de campo e enviaram-nas ao Butantan.

Diversidade de cores, tamanhos e lares

As tarântulas descritas, todas endêmicas das regiões de coleta, foram classificadas em três gêneros. O primeiro deles, Typhochlaena, inclui as menores aranhas-caranguejeiras arborícolas conhecidas, com apenas dois centímetros de corpo. São também as mais coloridas e podem apresentar pintas rosadas, amarelas e azuis. Até agora, conhecia-se apenas uma espécie, e Bertani descreveu mais quatro, todas bastante raras: T. amma, T. costae, T. curumim e T. paschoali. “O estudo mostra que se trata de um grupo muito antigo, originado antes dos demais grupos aparentados”, detalha.

Já o gênero Iridopelma inclui espécies maiores, que medem de 10 a 12 centímetros com as patas esticadas. As que vivem na mata atlântica costumam juntar duas folhas das árvores com fios de seda, formando uma espécie de abrigo, enquanto aquelas encontradas em regiões com menos árvores vivem dentro de bromélias – é o caso da Iridopelma katiae, coletada em uma área de campo rupestre no alto da Chapada Diamantina. Desse gênero, Bertani descreveu ainda I. marcoi, I. oliveirai e I. vanini.
Iridopelma katiae
A espécie 'Iridopelma katiae' vive em uma área alta da Chapada Diamantina, na Bahia, onde há poucas árvores. Por isso, procura abrigo no interior de bromélias. O nome foi dado em homenagem à esposa do autor, Katia de Mendonça Faria, por ela ter ilustrado diversos trabalhos de descrição de novas espécies de aranhas. (foto: Rogerio Bertani)
Por fim, as bromélias são lar também das espécies do gênero Pachistopelma, incluindo a P. bromelicola, descrita no artigo e encontrada na região Nordeste, sobretudo nos estados de Bahia e Sergipe. A espécie guarda duas semelhanças com as aranhas do gênero Iridopelma: o tamanho e a aparência ao nascer – em ambos os gêneros, os filhotes têm cor verde metálica, ganhando aparência mais discreta quando adultos.

Além das nove espécies descritas, o trabalho inclui novas descrições para três espécies previamente identificadas, T. seladonia, I. hirsutum e I. zorodes. “As descrições originais, muito antigas, descreviam essas espécies muito superficialmente e não incluíam figuras que possibilitariam seu reconhecimento e diferenciação das demais espécies”, relata Bertani. “Agora, a nova publicação torna possível a identificação de todas as espécies desses gêneros.”

Até agora, 2.700 espécies de aranhas-caranguejeiras já foram descritas em todo o mundo, das quais cerca de 300 vivem no Brasil – a maioria dentro de tocas escavadas no chão, debaixo de rochas ou troncos caídos. Apenas uma minoria é formada por aranhas arborícolas, que ocupam árvores e plantas como bromélias.
'Pachistopelma bromelicola'
As aranhas da espécie 'Pachistopelma bromelicola' vivem exclusivamente dentro de bromélias da região Nordeste, especialmente na Bahia e Sergipe. Elas têm, em média, 10 a 12 centímetros de comprimento, com as pernas esticadas. (foto: Rogerio Bertani)
Em relação às outras tarântulas, as arborícolas são mais leves e têm as patas anteriores mais largas, o que lhes permite andar com facilidade em superfícies verticais. Elas não têm espinhos nas pernas como as outras caranguejeiras, mas apresentam tufos nas pontas das patas que funcionam como ventosas para se fixarem às árvores.

As tarântulas se diferenciam das outras aranhas principalmente pelo tamanho – são caranguejeiras algumas das maiores espécies do mundo, embora existam espécies pequenas – e pela posição das quelíceras (ferrões), projetadas para frente. Embora metam medo em muita gente, as caranguejeiras, em sua maioria, não representam perigo algum aos seres humanos. A única espécie cujo veneno pode causar lesões graves vive na Austrália.

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