Mais precisão na datação geológica
Artigo apresenta novo método para definir idade de rochas baseado em isótopos de platina
Por: Fernando Brenha Ribeiro
Publicado em 01/11/2005
|
Atualizado em 07-05-2016
|
A determinação da idade de materiais geológicos, como
rochas e minerais, bem como daqueles provenientes do sistema solar – por
exemplo, meteoritos e rochas lunares trazidos pelas missões do projeto
Apollo – é baseada no decaimento de isótopos radioativos de diversos
elementos químicos.
Os isótopos radioativos são caracterizados por terem
núcleos com um excesso de energia que os torna
instáveis. Para atingir a estabilidade, esses núcleos desprezam essa
energia extra, emitindo radiação eletromagnética (raios
gama) ou
partículas do tipo
alfa
(núcleos do elemento químico hélio, ou seja, dois prótons mais dois nêutrons) e beta (elétrons energéticos).
O fenômeno pelo qual o núcleo se livra do excesso de
energia é denominado decaimento radioativo. Ao decair, com a emissão de
partículas, um núcleo sofre modificação em seu número de massa (soma dos
prótons e nêutrons) e/ou número atômico (soma dos prótons),
transformando-se no núcleo de outro elemento químico.
A liberação de energia, no entanto, não ocorre de forma
desordenada. Cada núcleo radioativo de um mesmo tipo tem uma
probabilidade bem definida de emitir radiação em um intervalo de tempo
finito. Essa probabilidade de decaimento pode ser expressa de várias
formas. Uma delas é a chamada meia-vida do isótopo radioativo.
A meia-vida corresponde ao tempo necessário para que um conjunto contendo inicialmente N
o
núcleos radioativos de um mesmo tipo tenha sua população
reduzida à metade. As meias-vidas dos diferentes isótopos radioativos
naturais e artificiais variam por diversas ordens de grandeza. O isótopo
do carbono com número de massa 14 (
14
C) tem, por exemplo, uma meia-vida de 5,7 mil anos, enquanto o isótopo de potássio com número de massa 40 (
40
K) tem uma meia-vida de 1,275 bilhão de anos.
Os isótopos radioativos naturais estão presentes nas
rochas e nos minerais em quantidades normalmente muito pequenas e que
variam ao longo do tempo à medida que ocorre o decaimento radioativo. Os
métodos de determinação de idade fundamentados na radioatividade (ou
métodos radiométricos de datação) se baseiam na observação dos efeitos
da radioatividade.
Alguns desses métodos medem o número de partículas
emitidas por unidade de tempo por um elemento radioativo, como o método
de datação do
14
C. Outros medem a variação do número de isótopos
radioativos e do número dos novos núcleos produzidos pelo seu decaimento
ao longo da história do mineral ou da rocha. Um exemplo deste último é o
método de datação potássio-argônio (K-Ar). Parte do potássio radioativo
(
40
K) decai, produzindo um núcleo de argônio com número de
massa 40. Medindo as quantidades de potássio e de argônio contidos em
uma amostra e conhecendo a meia-vida do
40
K, é possível determinar a idade do material.
Os diferentes métodos de datação radiométrica podem ser
imaginados como relógios usados para marcar o tempo geológico. O pêndulo
desse relógio é a meia-vida do isótopo no qual o método se baseia. Se o
período do pêndulo é bem conhecido, o passar do tempo é medido com
precisão por um relógio. Da mesma forma, se a meia-vida do isótopo é bem
conhecida, a idade de uma amostra pode ser determinada com precisão.
Recentemente, foi proposto um novo método de datação
baseado no decaimento radioativo do isótopo da platina com número de
massa 190 (
190
Pt). Esse isótopo emite uma partícula alfa e se
transforma no isótopo do ósmio com número de massa 186. As propriedades
químicas da platina e do ósmio permitem considerar o novo método como
muito promissor para estudos geocronológicos e geoquímicos realizados em
minerais ricos em sulfetos e em alguns tipos de meteoritos.
A aplicação do método encontra, no entanto, uma dificuldade fundamental. A meia-vida da
190
Pt não é conhecida com precisão. Diferentes métodos
foram usados para determinar essa meia-vida, mas os resultados obtidos
até o momento variam entre 240 bilhões e 1 trilhão de anos. O valor
adotado atualmente é de 650 bilhões de anos. Meias-vidas assim longas
são difíceis de medir, uma vez que o número de decaimentos radioativos
que esse isótopo sofre em qualquer intervalo de tempo de observação em
laboratório é muito pequeno.
Pesquisadores do Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas
(CBPF), no Rio de Janeiro (RJ), associados a colegas da Universidade de
Roma, vêm contribuindo para a obtenção de um valor mais preciso para a
meia-vida da
190
Pt. Uma de suas contribuições consiste em uma equação
obtida teoricamente para predizer o valor da meia-vida de um isótopo. Um
dos parâmetros dessa equação não pode ter seu valor determinado pela
teoria que deu origem à equação e deve ser estabelecido a partir de
dados experimentais. Por essa razão, o modelo é chamado de
semi-empírico.
Os autores – os pesquisadores brasileiros Odilon Tavares
e Emil Medeiros, do CBPF, e a italiana Maria Letizia Terranova, da
Universidade de Roma – usaram valores de meia-vida de outros 18 isótopos
da platina, que podem ser descritos pela equação e cuja meia-vida é bem
conhecida. Com o parâmetro semi-empírico determinado, a meia-vida da
190
Pt foi calculada em (3,7 ± 0,3) x 10
11
anos, ou seja, 370 bilhões de anos, com um desvio de 30 bilhões de anos para mais ou para menos.
Esse valor é comparável com o valor experimental de 320 bilhões de anos – ou seja, (3,2 ± 0,1) x 10
11
– obtido pelos mesmos autores há alguns anos. O
resultado é uma contribuição importante para a solução do difícil
problema de estabelecer a meia-vida da
190
Pt com a precisão necessária para estudos geocronológicos e geoquímicos.
Fernando Brenha Ribeiro
Departamento de Geofísica,
Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas,
Universidade de São Paulo
Fernando Brenha Ribeiro
Departamento de Geofísica,
Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas,
Universidade de São Paulo
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