quarta-feira, 6 de abril de 2011

Do fundo do oceano

Bactérias encontradas em regiões pouco exploradas do Atlântico sul revelam-se potencialmente úteis a vários setores industriais. Estudo dos microrganismos, iniciado em 2009, deverá ser concluído em 2012. 
 
Por: Katy Mary de Farias
 
Publicado em 04/04/2011 | Atualizado em 05/04/2011
Do fundo do oceano
Diferentes bactérias (ainda não identificadas) coletadas no Atlântico sul, a uma profundidade de cerca de 5 mil metros. As imagens foram obtidas com o auxílio de uma lente close-up. (fotos: André de Souza Lima/ Univali)
Iniciada há pouco mais de um ano, pesquisa feita por microbiologistas brasileiros começa a render frutos. A equipe, que coletou cerca de 250 diferentes bactérias na porção sul do oceano Atlântico, a uma profundidade de 5 mil metros, constatou que algumas delas têm aplicação na indústria de medicamentos e na produção de biocombustíveis e de plástico biodegradável.

Os microrganismos foram extraídos da água e de sedimentos da Dorsal Atlântica, cadeia de montanhas submersa localizada entre a América do Sul e a África. Segundo o biólogo André de Souza Lima, que coordena o estudo, as primeiras análises já feitas das amostras revelam que de 10% a 15% das bactérias coletadas podem produzir enzimas de interesse biotecnológico.
Colônias de bactérias
Para avaliar o potencial biotecnológico das bactérias, os pesquisadores adicionam às colônias o corante Vermelho do Nilo. Se o microrganismo é capaz de produzir bioplástico, o corante se liga ao polímero, tornando o complexo fluorescente – como se vê à esquerda. (foto: André de Souza Lima/ Univali)
Uma delas é a lipase, que tem aplicação na produção de biodiesel. Os pesquisadores esperam encontrar também espécies produtoras de celulase, que tem utilidade na fabricação de bioetanol a partir de resíduos de celulose.

“Sabemos que a queima desses combustíveis tem um impacto muito menor na produção de gases de efeito estufa”, diz Lima, da Universidade do Vale do Itajaí (Univali), em Santa Catarina. Segundo ele, é provável que algumas bactérias possam produzir enzimas úteis também à indústria têxtil e de alimentos.

Outra face

O potencial de produção de enzimas por essas bactérias tem uma explicação. Segundo o biólogo da Univali, é nos mares profundos que se encontram espécies com maior estabilidade no que diz respeito a salinidade, pressão e temperatura.
“Por se tratar de um ambiente de temperaturas baixas e pobre em nutrientes, essas enzimas podem apresentar uma temperatura de atividade diferenciada e elevada afinidade pelo substrato, entre outras características vantajosas.”
Placa com enzimas de bactérias
Placa usada para avaliar a produção de celulase, enzima útil na obtenção de energia a partir de biomassa. Cada compartimento contém uma amostra das enzimas produzidas pelas bactérias, à qual se adiciona um reagente. Quando a substância é quebrada, a mistura muda de cor e se torna fluorescente, indicando a presença de celulase. (foto: André de Souza Lima/ Univali)
A pesquisa faz parte do projeto ‘Mar-Eco: Atlântico Sul’, que por sua vez integra o Censo Mundial da Vida Marinha. Para obter o material que atualmente está sendo investigado, os pesquisadores permaneceram em alto-mar durante um mês, em 2009.

A coleta foi feita com o auxílio de dragas e redes, que ficavam cerca de três horas na água depois de terem sido lançadas.

A perspectiva é de que até o fim do ano as análises estejam concluídas. Para Lima, além de possibilitar a identificação de novas enzimas, o estudo apresenta outra face de grande importância: conhecer a diversidade de um ambiente que ainda não havia sido explorado.

Katy Mary de Farias

Especial para CH On-line/ PR

Este texto foi atualizado para incluir a seguinte alteração:

O terceiro parágrafo dizia que os pesquisadores esperam encontrar entre os microrganismos extraídos da água e de sedimentos da Dorsal Atlântica espécies produtoras de lactase. No entanto, como retificou o pesquisador André de Souza Lima, a enzima em questão é a celulase e não a lactase. (5/3/2011)

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