segunda-feira, 14 de setembro de 2015



ORIGEM DA VIDA: Como surgiram os primeiros animais?

Por: Marcus V. Cabral

            Pese a aparente estabilidade do mundo natural, as mudanças são constantes ao longo da história evolutiva do nosso planeta. Estas mudanças podem ser observadas e medidas em escalas de tempo muito variáveis e, independente disto, sabe-se hoje que cada característica de vida atual é um produto do processo evolutivo. Por esta razão a evolução de todos os organismos deve ser considerada como a pedra fundamental de todo o conhecimento biológico. 

Atualmente nossos conhecimentos avançaram em campos importantes como reprodução, desenvolvimento e genética. Além disso, o desenvolvimento de equipamentos e técnicas nos permite mergulhar de forma mais profunda e intensa na natureza dos seres vivos. Este maior número de informações associada à interdisciplinaridade que comanda as pesquisas atuais, permite um avanço significativo para responder a pergunta que inquieta a humanidade desde suas origens: de onde viemos?
O primeiro indício de vida na Terra data de aproximadamente 3,5 bilhões de anos. Estas primeiras células eram procarióticas, organismos semelhantes a bactérias. Após um grande período de diversificação evolutiva dos procariotos, organismos eucariotos unicelulares apareceram. Embora não possamos saber com certeza a origem dos eucariotos unicelulares, ela claramente envolve um processo de simbiose. Certos tipos de bactérias aeróbias devem ter sido englobadas por outras bactérias que eram incapazes de suportar o aumento das concentrações de oxigênio na atmosfera. A bactéria aeróbia possuía as enzimas necessárias para obter energia na presença de oxigênio, tendo sido, provavelmente, a ancestral das mitocôndrias. A maioria dos genes da mitocôndria, mas nem todos, viriam a residir no núcleo da célula hospedeira. Praticamente todos os eucariotos existentes hoje têm mitocôndrias e são aeróbios.

            Alguns eucariotos unicelulares ancestrais englobaram bactérias fotossintetizantes, que evoluíram originando cloroplastos; desse modo, esses eucariotos foram capazes de produzir suas próprias moléculas de alimento usando energia da luz solar. Os descendentes de uma dessas linhagens, as algas verdes, possivelmente deram origem às plantas multicelulares.

            Em alguns eucariotos que não se tornaram “residência” para cloroplastos, e alguns que se tornaram, evoluíram características semelhantes às dos animais, dando origem a uma variedade de filos coletivamente chamados de protozoários.
            Acredita-se que os verdadeiros animais tenham surgido como um grupo monofilético a partir de um ancestral protista há mais de 700 milhões de anos atrás. A dúvida está em qual protista? Há três teorias sobre a possível origem:

1. Hipótese ciliada sincicial: (ancestral: protista ciliado)

            É suportada pelas semelhanças entre os ciliados modernos e alguns turbelários atuais. Foi consolidada em 1950 por J.Hadzi e E.D.Hanson.
            Sugere que o metazoário ancestral foi um protista ciliado, multinucleado, com simetria bilateral, que teria modo de vida bentônico (rastejando no fundo com sua abertura oral dirigida para frente raspando o substrato). Em um passo evolutivo maior as superfícies nucleares são divididas pela formação de membranas celulares, produzindo uma epiderme celular contornando uma massa sincicial interna o que confinava a atividade de cada núcleo a certas regiões do corpo e assim se tornaram internamente compartimentados. O resultado disso e de outras mudanças foi um organismo acelomado semelhante a um turbelário (filo Platyhelminthes).

            Assim, esta teoria sugere que os primeiros ancestrais dos Metazoa eram acelomados e bilaterais. Esta teoria é reforçada pelas grandes similaridades entre os ciliados modernos e vermes achatados acelomados quanto ao tamanho, forma, simetria, local da boca e cílios na superfície. No entanto, alguns fatores contrariam esta idéia: não ocorre na embriologia dos turbelários nenhum processo de celularização semelhante; a teoria não explica a presença de espermatozóides flagelados nos metazoários; e, principalmente, implica que a simetria radial de cnidários seja derivada de uma simetria bilateral primária, para o que não há nenhuma evidência.

 
2. Hipótese flagelada colonial: (ancestral = protista flagelado)

            Proposta por Ernst Haeckel em 1874 e bem difundida por Hyman (1940). É a teoria mais aceita atualmente. Sugere que um protista colonial flagelado teria originado um ancestral metazoário planuloide (plânula=tipo larval básico dos cnidários).
            O protista ancestral seria uma colônia esférica de células flageladas ocas. As células individuais dentro da colônia tornaram-se diferenciadas para papéis funcionais específicos (células reprodutivas, nervosas, somáticas, etc), subordinando assim a independência celular para o bem-estar da colônia. A forma ancestral colonial seria radialmente simétrica no princípio, talvez semelhante às larvas plânulas livre-natantes dos cnidários. Esta larva é radialmente simétrica e não possui boca. Os cnidários, com sua simetria radial, poderiam ter evoluído a partir desta forma. A partir daí, desenvolveram algum grau de orientação locomotora, antero-posterior, e algum nível de especialização de células em funções somáticas e reprodutivas separadas (comum em protistas coloniais atuais), caracterizando a chamada BLASTEA. Neste cenário, o primeiro metazoa surgiu pela invaginação da blastea e o resultado seria um animal com dupla membrana, corpo como uma gástrula, denominado GASTREA. 

A gastrea teria uma abertura como um blastóporo, parecendo a gástrula de muitos invertebrados viventes. Ambos estágios são vistos durante a ontogenia de animais modernos; a gastrea seria o precursor de Cnidaria. Dentro desta idéia, a simetria bilateral seria derivada. A evolução de um eixo do corpo antero-posterior, o movimento unidirecional e a cefalização, provavelmente, co-evoluíram em algum grau e devem coincidir com a invasão dos ambientes bentônicos e o desenvolvimento da locomoção rastejante. Parece ser que a origem da condição triploblástica surgiu após o aparecimento das formas bilaterais.
Em 1985, Nielsen propôs uma teoria chamada Trochaea, uma ampliação da apresentada por Haeckel. Na teoria trochaea a evolução inicial dos filos animais teria comportado uma série de ancestrais holoplanctônicos, baseado no fato de que estruturas ciliadas para alimentação estão presentes em larvas de muitos invertebrados e certos animais adultos.
 

3. Hipótese da origem polifilética

            Muitos zoólogos preferem crer que os metazoários tiveram uma origem polifilética, tendo sido derivados independentemente de mais de um grupo de organismos unicelulares. Assim sendo, as esponjas, cnidários, ctenóforos e eumetazoários restantes evoluíram de forma independente não havendo um esquema único para a origem de todos eles. A principal razão é por acreditar que as esponjas evoluíram a partir de um organismo unicelular diferente dos metazoários superiores, assim os metazoa seria um táxon polifilético.
O principal argumento é que apesar dos coanoflagelados parecerem claramente relacionados com as esponjas, não é claro o grau de relação das esponjas com os demais Metazoa. É difícil de imaginar como um organismo com organização tão simples como uma esponja poderia se desenvolver em organismos com uma estrutura corpórea complexa e órgãos internos. No entanto, esta hipótese não vem sendo apoiada em estudos moleculares.

As evidencias filogenéticas recentes baseadas na unidade menor do RNA ribossômico e em similaridades de vias bioquímicas complexas corroboram a hipótese flagelada colonial, que os metazoários formam uma unidade monofilética (seguindo o esquema filogenético de Wainright et al. 1993) incluindo aos coanoflagelados. Esta hipótese também é corroborada com dados morfológicos (Nielsen, 1995). O grupo-irmão dos metazoários parece ser o dos fungos. A evidência molecular exclui a hipótese ciliada sincicial porque os metazoários são aparentemente mais próximos das algas eucarióticas e plantas do que o são dos ciliados.
            Tudo que podemos afirmar é que algum tempo, durante a Era Proterozoica, um protista (ou protozoários) desconhecido desenvolveu-se em uma forma colonial minúscula que, eventualmente, veio a ser o ancestral dos Metazoa. A verdadeira natureza deste organismo é desconhecida, já que tinha corpo mole e não deixou traços. No entanto, por estudos fósseis, morfológicos e moleculares comparados, pode-se inferir sobre este ancestral e buscar entender as relações filogenéticas entre os metazoários.
A conceituação de filos animais sofreu importantes mudanças desde suas origens com as seis classes de Linné e as 4 ramificações de Cuvier. À medida que o conhecimento sobre desenvolvimento e morfologia comparados dos metazoários foi se acumulando ao longo dos anos, o número de táxons usualmente reconhecidos como filos viventes, considerando que cada um representasse planos corporais derivados únicos, cresceu a cerca de 35 filos. Se filo for definido como um grupo de animais que compartilham um plano corporal devido a uma história comum, este deve ser monofilético, no sentido original do termo (Haeckel, 1866), mas pode ser também parafilético ou holofilético

Formas morfologicamente intermediárias que ligam filos a ancestrais comuns, não foram encontradas. Na falta de tal elo análises pré-cladísticas, baseadas na morfologia dos filos tiveram que se apoiar em eventos evolutivos hipotéticos para explicar a transição desde a forma ancestral assumida até os planos corporais descendentes que vemos hoje. Em alguns casos, especulações sobre esses eventos levaram a construção de cenários que posteriormente serviram como suposições nas quais se baseavam interpretações de toda a árvore de vida dos metazoários. No entanto, dados de estudos da morfologia comparada, em qualquer estágio de vida, foram insuficientes para estabelecer uma filogenia de Metazoa, amplamente aceita, em especial porque esses dados não são fortes o bastante para falsificar/invalidar hipóteses alternativas. As técnicas cladísticas, embora fornecessem uma abordagem renovada para as filogenias em estudo, se provaram difíceis para aplicar aos planos corporais já que homologias claramente identificáveis e informativas são raras. Assim, diversos cenários concorrentes permaneceram viáveis, alguns por mais de um século.

            As moléculas proveram um avanço operacional importante para esclarecer problemas sobre a origem dos filos animais. Evidências moleculares relativas ao desenvolvimento e comparação gênica ofereceram certo discernimento das bases genéticas da evolução dos planos corporais. As evidências moleculares filogenéticas da topologia da ramificação não estão relacionadas aos dados de desenvolvimento ou morfológicos, fornecendo testes independentes de hipóteses prévias. As afinidades indicadas pelas árvores moleculares são assunto de interpretação, e muitas perguntas sobre os relacionamentos entre os filos ainda permanecem, porém as filogenias moleculares também foram significantemente capazes de favorecer nosso conhecimento sobre os padrões de ramificações dos descendentes entre muitos dos filos. Não obstante, moléculas só podem ser obtidas de membros viventes dos filos. Filogenias moleculares indicam divergências entre os últimos ancestrais comuns dos filos atuais, mas não indica suas morfologias. Assim, os fósseis são uma importante fonte de dados para estudar a evolução inicial dos animais. Em contraste com as moléculas, interpretações dos registros fósseis iniciais é dependente da morfologia. Estudos fósseis revelaram inúmeros táxons importantes, porém extintos, que podem ser associados com filos viventes no campo morfológico, ou que são tão distintos que não podem ser associados a nenhum grupo vivente. O que os fósseis ainda não revelaram foram séries morfológicas intermediárias que liguem filos viventes aos seus ancestrais comuns.

            Com tudo que foi exposto, há uma nova gama de cenários evolutivos que tentam explicar a origem e radiação dos filos metazoários. Alguns elementos desses novos cenários guardam uma enigmática semelhança com aquelas teorias das escolas pré-cladísticas, com filogenias baseadas em morfologia.
As classificações mais recentes costumam separar os Metazoa em Eumetazoa (considerando a presença de tecidos verdadeiros) de outros grupos como as esponjas e, as vezes, também Placozoa, os quais são denominados Parazoa. Esta separação implica a parafilia dos organismos diploblásticos. Diversos estudos foram realizados, e dados moleculares com mecanismos para reduzir a atração dos ramos longos, assim como estudos morfológicos, defendem a monofilia de Metazoa e a parafilia dos diploblásticos. Por esta hipótese, conhecida como hipótese Eumetazoa, Placozoa estaria agrupado com os Eumetazoa (Cnidaria, Ctenophora e Bilateria), deixando apenas Porífera em outro clado. Morfologicamente esta hipótese é mais parcimoniosa que a monofilia de Diploblásticos, já que esta implicaria em diversas aquisições independentes entre, por exemplo, Cnidaria + Ctenophora e Bilateria, ou, como outra alternativa, que a simplicidade das esponjas fosse derivada e não primitiva. Não obstante, análises moleculares recentes (Ender & Schienwater, 2003) não concordam com a proximidade entre cnidários e placozoários.

            Dessa forma, Porífera aparece como um grupo de suma importância sendo considerado o primeiro animal multicelular a surgir no planeta. Pela ideia de que um plano corporal corresponde a um filo (Valentine, 1992) as esponjas sempre foram consideradas um único filo. A sinapomorfia apresentada por este grupo seria a presença de um sistema de circulação de água através de seu corpo do qual dependem praticamente todas as funções fisiológicas destes animais. Não obstante, devido a grande diversidade de seus representantes, a monofilia de Porifera foi várias vezes questionada, desde o ponto de vista molecular e também morfológico. A confirmação de que Coanoflagelados seria um grupo irmão de Metazoa, leva a crer que o ancestral dos metazoários seria um organismo similar a uma esponja, o que indica que vários caracteres de Porífera seriam plesiomórficos entre Metazoa e assim as esponjas seriam provavelmente parafiléticas. De fato, estudos recentes demonstram que Porifera é uma reunião parafilética de, pelo menos, duas linhagens basais de Metazoa (Borchiellini et al., 2001). 

Isto também reforça a idéia dos coanoflagelados como grupo irmão de Metazoa o que representa que a similaridade entre este grupo e os coanócitos das esponjas representariam homologias. Assim, metazoários não espongiários derivariam de uma esponja ancestral que perdeu seus atributos, em especial coanócitos e sistema aqüífero. A descoberta de demosponjas da família Cladorhizidae, altamente derivada, reforça esta idéia. Este grupo mudou seu plano corporal para adequar-se ao oceano profundo, perdendo o sistema aqüífero e desenvolvendo um eficiente sistema de captura de presas. Algo similar poderia ter ocorrido na origem dos Metazoa. De fato, foram descobertos alguns fósseis pré-cambrianos similares a esponjas, porém sem nada parecido a câmaras coanocitárias.
            Dentro de Porífera, a confirmação da parafilia, trouxe consigo mais informações sobre as relações entre as tradicionais classes. A classe Hexactinellida aparece como a mais basal em estudos paleontológicos e moleculares. Esta classe exibe alguns caracteres morfológicos bem particulares como, por exemplo, a organização sincicial, o que levou a alguns autores proporem a separação desta classe das demais. No entanto, estes caracteres são autopomórficos, não dando indicações sobre a posição filogenética de Hexactinellida. Nenhum estudo conseguiu até o momento assegurar a parafilia das esponjas silicosas (Hexactinellida e Demospongiae). Não obstante, a posição da Classe Calcarea foi claramente definida por Borchiellini et al (2001). Este estudo demonstrou que os representantes da Classe Calcarea estão mais proximamente relacionados com Eumetazoa que com as demais esponjas. Com as novas descobertas, a filogenia leva a necessidade de definir classificações mais modernas. Neste contexto, segundo os autores, o táxon Porífera, parafilético, não deverá mais ser usado. A antiga Classe Calcarea deverá ascender ao status de Filo (Filo Calcispongia, reunindo as classes Calcinea e Calcaronea). 

            Uma vez esclarecida a posição basal dos poríferos entre os metazoários, nos resta analisar agora as relações entre os eumetazoários. Na base deste grupo se encontram organismos que, assim como algumas esponjas, apresentam simetria radial. A separação dos grados segundo a simetria parecia ser pouco discutida já que simetrias distintas implicariam em organizações corporais bem diferentes. Além do mais, a posição mais basal dos radiados reflete uma das teorias mais aceitas sobre a origem dos metazoários, que implica na simetria radial precedendo organismos bilaterais, como já foi discutido. Os radiados pareciam ter derivado de um ancestral comum que não estaria na nossa linha direta de descendência. Todos os radiata possuem tecidos diferenciados, mas normalmente não apresentam mais que um tecido interno (endoderma) e outro externo (ectoderma) com certo nível de especialização. Desde o ponto de vista embriológico eles não sofrem gastrulação e por isso não apresentam mesoderma, um tecido que caracteriza todos os demais animais. A maioria é radialmente simétrico. Seu plano corporal está baseado em um cilindro aberto em uma extremidade, com esta abertura servindo tanto para a alimentação como para a eliminação de partículas.


            A transição para um corpo vermiforme é um dos eventos mais importantes na evolução animal, levando à impressionante radiação dos Bilateria. No entanto, havia grande dificuldade em identificar o grupo irmão de Bilateria, com várias hipóteses propostas.  Wallberg et al. (2004) utilizando um grande número de táxons reavalia estas hipóteses e parece ter colocado fim a discussão. Eles analisam as 3 hipóteses que propunham a relação entre os táxons Ctenophora, Cnidaria e Bilateria (denominados por eles como Epitheliozoa). A primeira hipótese, mais antiga, considerava a simetria radial na base dos eumetazoários e une os chamados Coelenterata (Cnidaria + Ctenophora).  Vale salientar que aqui, não cabe mais a terminologia radiata, pois no seu sentido original, este clado incluiria também as esponjas, as quais já estão claramente definidas na base de Metazoa. A hipótese Coelenterata era a hipótese de Haeckel amplamente difundida por Hyman. A segunda hipótese, com base em análises cladísticas de caracteres morfológicos, apontava os ctenóforos como grupo irmão dos bilaterais. Este clado, denominado Acrosomata compartilhava diversos caracteres morfológicos, incluindo a presença de acrosoma nos espermatozóides, o que deu nome ao clado. A terceira hipótese, baseada nas análises da unidade menor do RNA ribossômico apontava os ctenóforos como grupo irmão do clado Cnidaria + Bilateria. Esta idéia, denominada pelos autores como Planulozoa foi confirmada com evidências bem robustas no trabalho. Esta hipótese dos Ctenóforos ocupando uma posição mais basal entre os eumetazoários já era defendida por outros autores (Cavalier-Smith et al. 1996; Kim et al. 1999 e Borchiellini et al. 2001) e implica que vários caracteres considerados sinapomórficos entre Ctenophora e Bilateria devem ser revistos. A semelhança superficial entre eles deve ser devida a homoplasias. De fato, já foi visto acrossoma em espermatozóides de Porífera e Cnidaria. Por estas análises, Epitheliozoa e Planulozoa constituem agrupamentos monofiléticos.


            Estabelecer as relações filogenéticas não é tarefa fácil. Trabalhos que levam em conta a morfologia apenas, às vezes não apresentam argumentos forte o bastante para refutar hipóteses contrárias as que eles próprios tentam comprovar. Por outro lado, análises moleculares também têm a desvantagem de não poder incluir grupos fósseis que podem representar a chave para as homologias, além de apresentar algumas dificuldades metodológicas. Uma das maiores dificuldades encontradas nos estudos mais recentes de filogenia é evitar os artefatos criados nas árvores pelo fenômeno de atração das ramas longas. Este é um dos maiores problemas para entender a filogenia na base de Metazoa. O clado composto pelos organismos bilaterais forma uma rama longa, podendo a sua posição representar um artefato em algumas análises. Alguns autores chegam a admitir e alertar para este problema questionando os próprios resultados (por exemplo: Collins & Valentine, 2001) e outros buscam usar mecanismos e técnicas que diminuam o problema (por exemplo: Borchiellini et al., 2001).

            Desta forma, considerando os últimos estudos realizados, Cnidaria estaria mais relacionado com os Bilateria que com Ctenophora. No entanto, definir qual dos grupos de cnidários é mais basal é uma tarefa que ainda parece estar longe de ser concluída. Hyman (1940) sugeriu que Hydrozoa seria o ancestral do grupo. Por várias décadas, pesquisadores concordaram com esta hipótese baseados na morfologia e características de desenvolvimento. Por outro lado, considerando algumas teorias para a origem dos metazoários, como a de um ancestral colonial, somado a estudos do genoma, a idéia de Anthozoa como grupo mais basal passou a ser defendida por alguns autores. 


O fato preponderante é a presença em Anthozoa de genoma mitocôndrial circular semelhante a outros animais, enquanto que Hydrozoa e os outros grupos com medusa apresentam o genoma mitocôndrial linear. Análises da subunidade menor do RNA ribossomal (SSU) colocam a Hydrozoa na base, porém não refuta a outra hipótese. Assim, o subfilo Anthozoa é alternativamente considerado o grupo mais basal ou o mais derivado. A primeira hipótese posiciona aos pólipos como forma original e a medusa (e a metagênese) como forma derivada (Fig. 1A). A segunda teoria indica que no típico ciclo de vida metagênico, a medusa é gametogênica e constitui o estádio definitivo ou adulto com um pólipo que atua como uma larva persistente. Assim é razoável que o pólipo evoluiu secundariamente e perdeu a forma original do corpo, a medusa, localizando aos antozoários como o táxon mais derivado (Fig. 1B). Willmer (1991) sugeriu que os antozoários e sua condição bilateral representariam o estado primitivo do filo Cnidaria, baseado em evidencias dos organismos viventes e fosseis. Analisando os registros fosseis é impossível predizer quem é mais primitivo se o pólipo ou a medusa, ambas formas foram encontradas em depósitos pré-cambrianos (Glaessner, 1984).


Definir a filogenia dentro de cnidaria é fundamental para entender a evolução dos metazoários. Segundo a teoria de origem de Metazoa, o grupo mais basal em Cnidaria seria diferente e a origem dos Bilateria seria bem estabelecida. A maior parte dos autores atuais aceita a condição radial como primitiva, colocando assim os pólipos, e com isso a classe Anthozoa na base do filo. Isto é corroborado por estudos morfológicos e moleculares. No entanto, a ultima teoria da possível origem dos cnidários foi publicada, faz horas apenas, por Seipel & Schmidt (2005) baseada em estudos moleculares da musculatura e na ontogenia da formação da medusa. O trabalho conclui que o ancestral dos cnidários seria um organismo triploblástico móvel. Em conseqüência, a condição diploblástica teria evoluído secundariamente nas larvas e pólipos dos cnidários, qual era suportado pela Teoria Sincicial de Hadzi em 1953. 


Antes de seguir discutindo e inferindo sobre a evolução dos metazoários devemos considerar um grupo de organismos bem particulares, os myxozoários. Estes endoparasitas microscópicos de peixes e invertebrados com corpo amorfo e plasmodial sempre foram considerados protozoários, ate que em 1970 ganharam a condição de filo pela descoberta da multicelularidade de seus esporos infectantes. Devido a grande similaridade dos nematocistos com as cápsulas polares dos myxozoários Sidall et al, 1995, baseados em caracteres morfológicos e moleculares, propuseram que Myxozoa pertencia a Cnidaria. Trabalhos posteriores não suportaram esta nova posição filogenética (Kim et al, 1999). Somado a isto, Anderson et al, 1998 e Ferrier & Holland, 2001 demonstraram que os myxozoários possuíam Hox genes, um tipo de genes totalmente ausentes dentro dos diploblásticos. Esta discussão seguiu até que Okamura & Canning (2003) apresentaram um trabalho que confirmava que os myxozoários não são cnidários, sugerindo que algumas espécies de myxozoários possuíam duas formas morfológicas alternativas, uma vermiforme e outra plasmodial. A forma vermiforme descrita anteriormente como Buddenbronckia e não alocada em nenhum filo, apresenta clara simetria bilateral. Desta maneira, o DNA ribossômico, os Hox genes e os dados estruturais considerados em seu conjunto, indicariam que os myxozoários não são cnidários e que formariam parte da linhagem dos Bilateria no reino animal. Dessa forma, algumas hipóteses bem robustas colocam Myxozoa e alguns vermes acelomados como os primeiros clados bilaterais, assegurando a posição dos Myxozoários na base de Bilateria (por ex. Telford et al. 2003).


Já dentro dos Bilateria, tradicionalmente os filos são divididos em Protostômios e Deuterostômios. Esta divisão não implica apenas a diferença na origem da abertura oral, mas também uma série de distinções na embriologia. Organismos caracterizados como protostômios normalmente são associados ao conceito de que o blastóporo, ou a região próxima a ele, irá originar a boca do organismo. No entanto, diversas outras características estão implícitas neste conceito. A clivagem do tipo espiral, principalmente determinada, a formação do celoma por esquizocelia, ou seja, a partir de bandas mesodérmicas, e a origem do endomesoderma a partir de um blastômero especial (4d) são outras características do desenvolvimento dos protostômios. Por outro lado, organismos deuterostômios apresentam a boca sendo formada de uma região diferente da do blastóporo, a clivagem sendo principalmente radial e geralmente indeterminada, o celoma formado a partir da fusão de bolsas enterocélicas (exceto nos cordados) e o endomesoderma a partir de bolsas enterocélicas (exceto nos cordados). Considerando este conjunto de características, nem sempre é fácil determinar a posição de alguns táxons que possuem características dos dois tipos de desenvolvimento misturadas (por exemplo, os filos conhecidos como lofoforados). Alguns autores acreditam que podem, através da análise da forma de gastrulação de organismos basais em cada divisão (por exemplo, poliquetos entre protostômios) poderia levar a inferir sobre o tipo de gastrulação do ancestral do grupo. Comparações usando marcadores moleculares entre a parte oral e o blastóporo em protostômios basais e deuterostômios basais sugeriram que o ancestral destes grupos (comumente chamado de Urbilateria) usava o mesmo set de genes para formar a boca e o ânus desde lados opostos ao blastóporo (Lartillot et al. 2002). Assim, a divisão entre protostômios e deuterostômios não é marcada pela forma independente e diferente de formar a boca (como conceituado por Grobben, 1908). Em realidade Deuterostomia seria um modo derivado de gastrulação, que facilmente teria evoluído desde a Protostomia. Estas considerações foram analisadas em um estudo de Technau & Scholz (2003) avaliando a origem e evolução do endoderma e mesoderma. Além de proporem que a invaginação/epibolia deve ser a forma de gastrulação ancestral, os autores, considerando a Anthozoa como o grupo mais basal entre os diploblásticos supõe que o processo de dobras epiteliais que dá origem aos mesentérios dos antozoários deve ter ocorrido de forma similar na origem do mesoderma a partir de evaginações no Urbilateria. Eles sugerem que os genes que especificam o endoderma e mesoderma em Bilateria deve ter evoluído suas funções a partir de papéis ancestrais na regulação básica celular como mobilidade celular, adesão e proliferação.


A divisão dos Protostômios segundo a presença de uma cavidade corpórea celomática também vendo sendo discutida sob alguns aspectos. De forma geral se considera três possibilidades:

1. Acelomados (sem cavidade celomática) - A mesoderme forma uma massa de tecido mais ou menos sólido (Mesênquima), às vezes com espaços (lacunas), entre o tubo digestivo e a parede do corpo.
2. Celomados ou eucelomados - Há o desenvolvimento de uma cavidade (celoma) preenchida de líquido entre a parede do corpo e o tubo digestivo. Tal cavidade está dentro da própria mesoderme e está completamente envolvida por um tecido fino, o peritônio (derivado da mesoderme), de forma que os órgãos do corpo não são livres dentro do espaço celômico, mas separados dele pelo peritônio.

3. Pseudocelomados ou blastocelomados - Possuem cavidades pequenas ou grandes do corpo, que nem sempre são formadas a partir da mesoderme e não são envolvidas por peritônio ou outra forma de tecido mesodermal. É assim chamada de falsa cavidade. Os órgãos ficam livres na cavidade do corpo mergulhados diretamente no seu fluido. Em muitos casos o espaço representa remanescentes persistentes da blastocele embrionária e aí não há nada de falso. Por esta razão, alguns autores preferem usar o termo blastoceloma.
            Acredita-se que a origem do celoma esteja relacionada com o modo de vida bentônico assumido por alguns organismos bilaterais, pequenos. Nesta condição, um esqueleto fluido (hidrostático) seria essencial para certos tipos de movimento. A evolução de uma cavidade do corpo cheia de fluido, contra o qual os músculos poderiam operar, ofereceria uma grande vantagem locomotora adicional proporcionando uma circulação média e espaço para o desenvolvimento de órgãos.

Há teorias que sugerem o aparecimento do celoma de uma só vez, outras em duas vezes.

  1. Teoria enterocélica
O celoma teria originado pelo estreitamento e isolamento do divertículo estomacal embrionário.

  1. Teoria gonocelômica
Um primeiro espaço celômico surgiu pela parede das cavidades gonadais derivada mesodermicamente e que persistiu subseqüentemente pela liberação dos gametas.

  1. Teoria nefrocelômica
Protonefrídio dos vermes achatados expandiriam para as cavidades celômicas, argüindo que o celoma derivou de estruturas ectodérmicas derivadas. Certamente as cavidades celômicas de muitos animais estão relacionadas a funções excretoras.

Não obstante, alguns estudos recentes consideram que a divisão dos animais bilaterais segundo a cavidade corporal é arbitrária já que resultaria em grupos que não são monofiléticos. Assim, estudos filogenéticos moleculares recentes (Aguinaldo et al., 1997; Balavoine & Adoutte, 1998) têm proposto uma hipótese filogenética diferente para os Bilateria. Os resultados transferem a quatro filos considerados tradicionalmente como Protostomia para Deuterostomia (Brachiopoda, Chaetognatha, Ectoprocto e Phoronida). Além disso, os grandes agrupamentos dos protostômios em acelomados, pseudocelomados e eucelomados parecem, realmente, não ser monofiléticos. As evidências sugerem que algum tempo depois que o ancestral deuterostômio divergiu do ancestral protostômio, no Pré-Cambriano, os protostômios dividiram-se novamente em dois grandes grupos monofiléticos (ou superfilos): os Ecdysozoa, contendo os filos que passam por uma série de mudas durante seu desenvolvimento, e os Lophotrochozoa, incluindo os filos de lofoforados e os filos cujas larvas são assemelhadas as trocóforas.

Dessa forma, três clados principais nos Bilateria aparecem desde cedo nos registros fósseis do Cambriano: Deuterostomia, Lophotrochozoa e Ecdysozoa. De todas as hipóteses filogenéticas recentes, a divisão dos protostômios parece ser uma das mais importantes. A evidência do clado Ecdysozoa, caracterizado pelo hábito de muda, foi comprovado morfologicamente (Barnes et al., 1993), pelo RNA ribossômico (Aguinaldo et al., 1997; que deu nome ao clado) e por características no Hox genes (de Rosa et al., 1999). Ecdysozoa apresenta uma grande diversidade morfológica, incluindo desde vermes pseudocelomados (Priapulida) ou com pseudocele reduzida (Nematoda) até filos superiores e complexos como Arthropoda, que é basicamente hemocélico, porém com pequenos espaços intramesodermais. Mesmo com esta disparidade, diversos estudos recentes suportam a monofilia do clado. Considerando que a grande maioria dos animais viventes é Ecdysozoa, é fundamental compreender as condições e oportunidades que se combinaram para originar os fatores principais deste clado. 

Acredita-se que tanto o ancestral dos Protostômios e Deuterostômios como o ancestral comum entre Ecdysozoa e Lophotrochozoa, eram organismos simples, e provavelmente paracelomados. Este último termo se refere a organismos pseudocelomados e acelomados (Valentine & Collins, 2000). O fóssil mais antigo é da Idade Neoproterozóica (cerca de 570 Milhões de anos), são rastros pequenos com características paracelomadas. Representa a evidência mais antiga de locomoção animal, parecendo ter sido criado pela ação de músculos pedais ou das paredes de organismos bilaterais. Também poderiam ser rastros deixados pelo sistema de locomoção mucociliado comum em invertebrados para a alimentação e limpeza de superfícies e para a locomoção em pequenos animais, como os usados até hoje em alguns cnidários, Lophotrochozoa e Deuterostômios.
Animais que apresentam mudas não tem cílios ectodérmicos móveis e, em conseqüência não podem usar sistemas mucociliares ectodérmicos. O clado Ezdysozoa evoluiu a partir de animais que se ancoravam com a cutícula e se movia por ondas peristálticas e/ou pela introverte. Eram provavelmente rastejantes ou enterradores. Dessa forma, a muda deve ter evoluído entre o ancestral Ecdysozoa/Lophotrochozoa ou no último ancestral comum em Ecdysozoa. A função hidrostática do Euceloma no tronco de vários protostômios (ex: anelídeos) e Deuterostômios (ex: cephalopoda) é reduzido em Ecdysozoa a fluidos no compartimento da blastocele, como pseudoceloma ou hemoceles. Da mesma forma, a função hidrostática na luz dos tentáculos de alimentação de alguns protostômios (ex: Phoronida) e deuterostômios (Ex: Pterobranchia) não aparece em Ecdysozoa. A evolução de tentáculos ciliados neste clado foi impedida pela ausência de tratos mucociliados. É possível que a ausência de um compartimento celômico no tronco em Ecdysozoa também esteja associado ao hábito de muda. Uma vez que a muda permite não apenas aumentar estruturas cuticulares como espinhos ou apêndices que funcionam como estruturas de locomoção auxiliares, mas também promovem um fortalecimento da cutícula. Os espaços celômicos blastocélicos provêm resistência e apoio para a ação dos músculos da parede do corpo, reforçados pela cutícula que os envolve. A presença deste sistema deve haver inibido a evolução de uma compartimentalização adicional para dar suporte as atividades de Ecdysozoa.


A origem e conseqüência da muda são assim, fundamentais para entender a história do clado. Em Ecdysozoa, apresentar muda significa uma obstrução das estruturas ciliares ectodérmicas. Segundo evidências filogenéticas e fósseis, os primeiros membros de Bilatéria seriam pequenos, vermiformes e, provavelmente, tinha desenvolvimento direto. Em geral organismos pequenos apresentam baixo esforço reprodutivo e a presença de larva aumentaria a mortalidade e a reprodução seria inviável. Dessa forma, o desenvolvimento de larvas planctônicas ocorreu de forma independente mais de uma vez (ao menos 3) dentro de Bilatéria. Clados sem muda evoluíram larvas que nadam e se alimento por tufos de cílios ou bandas ciliadas, incorporando essas formas aos seus sistemas de desenvolvimento muito cedo. Por outro lado, dentro de Ecdysozoa, larvas alimentares não tem tratos ciliados alimentares e evoluíram pela modificação, durante estágios iniciais, empregando setas ou apêndices para gerar correntes de alimentação. É provável que a muda tenha evoluído como uma adaptação que permitisse o aumento, durante o crescimento do animal, de estruturas secretadas pela cutícula como espinhos e outras, utilizadas para a locomoção auxiliar. Entre os Ecdysozoa ocorrem táxons com desenvolvimento direto (como Nematoda) e outros com estágios bentônicos prematuros com introverte que lembra um pouco o adulto (como Loricifera). Este último pode ser considerado larva, porém é mais provável que se trate de elaborações de juvenis produzidos em um desenvolvimento direto ancestral. De todos os modos, nada que se assemelhe a larva planctônica primária ciliada. Os cílios em Ecdysozoa, quando presentes, são exclusivamente sensitivos (sensilla).


Se as larvas planctônicas, de fato, surgiram mais de uma vez entre os Bilatéria, então hipóteses evolutivas que se apóiam no fato de larvas planctônicas serem plesiomórficas para estes clados, tanto presente no clado ancestral como larva (por ex. Nielsen, 1995) ou representando elas mesmas os ancestrais (Por ex. Davidson et al., 1995 e Petterson et al., 1997) devem ser revistas. Apesar de toda esta discussão, as considerações sobre a origem independente de larvas planctônicas dentro de Bilatéria ainda não são conclusivas (Valentine & Collins, 2000). 


Dentro de Ecdysozoa a filogenia ainda não está bem definida. Nielsen et al., 1996, usando caracteres morfológicos une Arthropoda + Tardigrada + Onychophora em um único clado, também apoiado por evidências moleculares. O filo Nematoda apresenta uma rama muito longa, sendo difícil a utilização do 18S RNA ribossomal. No entanto, Aguinaldo et al., 1997 conseguiu ramas mais curtas e uniu este filo aos Ecdysozoa. Alguns estudos colocam este filo junto com Nematomorpha (Nielsen et al., 1996). Os filos Priapulida e Kinorhyncha conformariam um clado irmão aos demais Ecdysozoa (Aguinaldo et al., 1997). Já o filo Loricifera ainda não apresenta amostras do gene 18S, sendo duvidosa sua localização. Não obstante, por evidências morfológicas deve estar entre os Ecdysozoa, aliado, provavelmente a Priapulida + Kinorhyncha. O filo Chaetognatha também forma rama longa e é difícil definir sua posição filogenética. Alguns estudos o consideram dentro de Ecdysozoa, porém sua posição é ainda instável e duvidosa.
Concluindo, Ecdysozoa seria grupo irmão de Lophotrochozoa (Anelídeos, moluscos e lofoforados). Estes dois clados formam o agrupamento Protostomia, o qual é irmão de Deuterostomia (Aguinaldo et al., 1997 e Littlewood et al., 1998). Protostomia e Deuterostomia formam Bilateria. Este, juntamente com Cnidaria forma um clado, no qual também estaria inserido Placozoa, segundo algumas classificações, o qual unido a Ctenophora, cuja posição é mais basal forma o grupo Eumetazoa. Dentro de Metazoa Porífera forma um agrupamento parafilético na base deste grupo.


Como foi visto até aqui, entender a origem e as relações filogenéticas dos animais não é tarefa fácil. Mesmo considerando apenas os invertebrados marinhos a tarefa não se torna menos árdua. A primeira e mais óbvia dificuldade que surge é a de tratar da origem e evolução em um agrupamento totalmente artificial que, ao contrário do que se esperaria em uma boa filogenia, reúne táxons que possuem em comum uma ausência. Pois bem, a ausência de coluna vertebral define os invertebrados. Proposto por Lamarck em 1801, este termo, apesar de não constituir um clado ou um táxon nem representar qualquer categoria hierárquica reconhecida no sistema de Linneaus, segue em uso na grande maioria dos livros didáticos e nos programas de cursos de graduação e pós-graduação. Nenhuma característica positiva é capaz de abranger todos os seus representantes. A diversidade de formas, habitats, hábitos é tão grande que pode ser exemplificada quando consideramos seus representantes. Os chamados Invertebrados são formados por cerca de 35 filos e mais dois subfilos do Filo Chordata, o mesmo que contém os seres humanos e demais vertebrados. É assustador! Mais ainda se considerarmos que os invertebrados constituem cerca de 97% dos organismos viventes! Daí a grande dificuldade de estabelecer teorias e classificações que reflitam a filogenia do grupo. É quase como discutir a origem e evolução do reino animal. 


Nos oceanos e mares há uma enorme variedade de formas de vida, e um número de táxons superiores muito maior do que no ambiente terrestre. Segundo as estimativas, o mar apresenta apenas 20% de todas as espécies animais, mas estas representam  90% ou mais de todas as classes ou filos (MAY, 1988). Basta lembrar que a maioria dos filos conhecidos são exclusivamente ou principalmente marinhos. Dos 35 filos de invertebrados não cordados, 16 são exclusivamente marinhos e apenas 2 não apresentam representantes marinhos (Pentastomida, parasita de vias respiratórias aéreas de vertebrados, e Onychophora, exclusivamente terrestre).


É lógico que, depois de tudo que foi visto, estamos longe de por um ponto final no tema. Se nas últimas 3 décadas a grande quantidade de artigos publicados sobre a evolução dos metazoários nos levou a discutir, refletir e reconsiderar antigos conceitos, certamente, no mínimo mais 3 décadas serão necessárias para esclarecer os pontos ainda não conclusivos e a posição filogenética de alguns grupos na grande árvore dos metazoários. Certamente todos este progresso na compreensão da origem e evolução dos animais, em especial dos invertebrados marinhos, base para todo o resto, leva a inúmeras modificações nos sistemas de classificação em uso. É de se esperar que todo este conjunto de informações leve um tempo para ser incorporado aos sistemas em uso, em especial devido a inúmeras divergências que surgem entre trabalhos com metodologias e/ou dados diferentes. Apenas aquelas hipóteses amplamente testadas e corroboradas por mais de um tipo de dado devem ser incorporadas de forma definitiva nas classificações. Há muita coisa por fazer, e ainda estamos longe de desvendar os mistérios da origem dos animais e, com isso, entender a nossa própria origem.

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