segunda-feira, 14 de setembro de 2015

Os primeiros que chegaram
Livro enfoca pesquisas arqueológicas no norte do Estado de São Paulo
[14/09/2015]
O livro “Os primeiros que chegaram”, editado pela Canal 6 Editora, organizado por Neide Barrocá Faccio reúne artigos resultantes das pesquisas e extensões desenvolvidas pelo LAG- Laboratório de Arqueologia Guarani do Departamento de Planejamento, Urbanismo e Ambiente da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Unesp, Câmpus de Presidente Prudente.
Busca apresentar o estado da arte da pesquisa arqueológica no Estado de São Paulo, com especial ênfase na sua região norte. Os três capítulos do livro foram organizados de forma a manterem certa independência entre si, o que facilita os fins didáticos da publicação.

No primeiro artigo, ‘O índio: da origem do homem aos grupos indígenas brasileiros’,  Neide busca apresentar sinteticamente as teorias e os estudos científicos realizados nas áreas da paleontologia humana e arqueologia brasileira, a fim de proporcionar uma melhor compreensão a respeito da presença da espécie humana antes de 1492/1500 no continente americano e no Brasil.
A pesquisadora conta que, com uma origem que remonta a 120 mil anos atrás, o ser humano ocupa essa área do planeta desde pelo menos 50 mil anos. Os homens que aqui chegaram, provavelmente vindos da Ásia (via Estreito de Bering ou Oceano Pacífico), há 9 mil anos, já haviam ocupado todo o território americano.

As primeiras pesquisas arqueológicas no Brasil foram iniciadas entre 1830 e 1840, por iniciativa do naturalista dinamarquês Peter Wilhem Lund, em grutas da região de Lagoa Santa (MG). No Século XIX, foram criados o Museu Nacional (Rio de Janeiro/1818), o Museu Paulista (São Paulo/1893) e o Museu Paranaense (Paraná/1876), que deram um cunho oficial e científico às pesquisas arqueológicas de forma efetiva.
Contudo, até 1950, muitos amadores coletaram indiscriminadamente materiais arqueológicos para suas coleções particulares. Somente em 26 de julho de 1961 foi criada a Lei Federal n° 3924, visando proteger o patrimônio arqueológico brasileiro. A partir dessa data, impulsionou-se a formação de arqueólogos, sob a orientação de pesquisadores estrangeiros.

Esses pesquisadores, de volta ao Brasil, orientaram a formação de outros arqueólogos. Eles  realizam escavações na área de sítios arqueológicos e, para isso, aplicam técnicas específicas da arqueologia, trabalhando em íntima cooperação com uma equipe interdisciplinar (geógrafos, etnólogos, botânicos, zoólogos, cartógrafos).

Neide lembra que a ocupação indígena mais antiga pesquisada até o momento está no Sudeste do Piauí e foi datada de 48 mil anos antes do presente. Além dessa ocupação indígena, cita outras ocupações, também bastante antigas, como o Sítio Abrigo da Lapa Vermelha, localizado na região de Lagoa Santa em Minas Gerais, datado de 25 mil anos antes do presente e o Sítio Alice Boer, localizado na região de Rio Claro, SP, datado de 14.200 anos antes do presente.
O segundo capítulo, ‘Breve etno-história do Estado de São Paulo’, de Luís Antonio Barone, também professor da FCT em coautoria com Neide, traz uma abordagem etno-histórica que dialoga com a arqueologia pré-histórica, mas foca no contexto do encontro/choque/entrecruzamento de culturas (notadamente amerínidas, africanas e europeias) que formam o povo brasileiro e paulista.
Os pesquisadores mostram que, antes da chegada dos europeus (espanhóis, portugueses, mas também franceses) nas chamadas terras baixas da América do Sul, cuja maior porção constitui o Brasil, uma população muito grande ocupava os diferentes quadrantes desse subcontinente.
No Brasil, grandes populações habitavam o imenso litoral, assim como as espaçosas várzeas da vasta rede hidrográfica. Essa população autóctone, contam os autores, era bastante diversificada, expressando características que conformavam tradições ceramistas específicas e troncos linguísticos distintos, dos quais o mais conhecido é o tupi-guarani.
A convivência dos colonos portugueses e brasileiros com a população indígena configurou, como é narrado no livro, um misto de exploração, absorção e extermínio. Os mamelucos paulistas, responsáveis pelo movimento bandeirante, sempre que possível, se valeram dos caminhos indígenas, conhecidos pelos guaranis como peabirus, que margeavam o rio Paranapanema, seguindo para o Oeste.

Nessas investidas de preação de índios para a escravização, que se intensificaram durante o século XVII, os paulistas destruíram as Missões espanholas do Paranapanema, provocando um despovoamento do vale por quase dois séculos. Durante esse longo período, apenas Kaingangs e Xavantes, etnias hostis aos colonizadores, circulavam pelos antigos caminhos guaranis.
A região entre o Paranapanema e o Tietê teria sido palco de expedições de apresamento, desde o final do século XVI. No século XIX, com a construção da Estrada de Ferro Noroeste na região, povoações de agricultores eram implantadas ao longo do seu percurso. Foi, contam os autores, a época dos “bugreiros”, profissionais em extermínio de populações indígenas.

A expansão decisiva da sociedade brasileira sobre o vale do médio Paranapanema e a região hoje conhecida como Pontal do Paranapanema deu-se a partir do terceiro quarto do século XIX, tendo o povoado de Conceição de Monte Alegre, hoje distrito do município paulista denominado Paraguaçu Paulista, próximo aos municípios de Assis, Marília e Presidente Prudente., como principal referência.
Os Kaiapó meridionais (ou bilreiros), aformam os pesquisadores, teriam resistido à invasão colonizadora do século XVI, sendo denominados genericamente de Tapuias, nome dado, pelos colonos, aos nativos de língua não Tupi. No século XVIII, pressionados pelo movimento minerador, reagiram violentamente, o que praticamente levou ao seu extermínio.
Completa a obra o capítulo ‘Arqueologia do norte do Estado de São Paulo’. Escrito pela organizadora com Gabriel Cerdeira, licenciado em Geografia da FCT e atualmente finalizando o bacharel no mesmo curso da instituição, enfoca as pesquisas arqueológicas realizadas no norte do Estado de São Paulo.
Informa-se inicialmente que a área Norte do Estado de São Paulo é conhecida como território dos Kaiapó. Os vestígios das ocupações desses grupos indígenas têm sido associados à Tradição Arqueológica Aratu-Sapucaí, associada a povos agricultores. Entre os objetos da cultura material dessa tradição, estão objetos confeccionados em argila e em rocha.

Quanto ao Laboratório de Arqueologia Guarani (LAG), os autores apontam atuação a partir de 2009 na região norte do Estado de São Paulo, com desenvolvimento de trabalhos acadêmicos e a identificação de 25 sítios arqueológicos associados ao Sistema Regional de Povoamento Aratu-Sapucaí, além de um sítio arqueológico histórico. A descoberta desses sítios tem garantido o desenvolvimento de uma série de trabalhos acadêmicos, tornando maior o número de dados sobre a região.

O livro conclui que a região norte do Estado de São Paulo deve ser mais estudada, pois há uma forte presença do sistema regional de povoamento Aratu-Sapucaí. Lembra ainda que, na mesma região, foram encontrados vestígios associados a outras tradições, o que permite que seja considerada uma área de fronteira, rica em diversidade cultural durante o período pré-colonial.
Como um todo, a obra constitui um trabalho para alavancar estudos relacionados à introdução à arqueologia e à etno-história do Estado de São Paulo, podendo ser utilizada como leitura paradidática para subsidiar disciplinas de História, Geografia e Sociologia do Ensino Médio e aulas dessas áreas, além de Antropologia, em diferentes cursos superiores.
Oscar D'Ambrosio

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