“Chegamos a nossa desordem atual por meio
de nossa inteligência e inventividade. O processo pode ter começado até
100 mil anos atrás, quando começados a atear fogo às florestas como uma
forma preguiçosa de caça. Havíamos deixado de ser apenas mais um animal
e começado a demolição da Terra.”
James Lovelock, 2006
1. A EVOLUÇÃO HUMANA
Antes de tudo, vale lembrar que através
da mutação genética, ocorreu a evolução de todos os seres. Será
ressaltada neste presente texto, em especial, a evolução humana. Vale
lembrar que a mutação genética acontece em caso de sobrevivência da
espécie e que o indivíduo, ao sofrer mutação, herda uma ou mais
características radicalmente diferentes daquelas do organismo original.
Na maioria dos casos, o ser mutante é capaz de fazer coisas muito
melhores do que seus predecessores, ou até coisas que eles não eram
capazes de fazer.
Este presente post tem como objetivo descrever uma das teorias da evolução humana, contida na obra A Aurora da Humanidade (1993) da Editora Abril. Também usou-se de base a obra A Vingança de Gaia (2006) de James Lovelock.
1.1. MACACOS
Cumpre assinalar que há trinta milhões de
anos, em uma floresta tropical africana, os macacos lá existentes foram
a raiz da evolução humana. Eles viviam nas copas da árvores e usavam
sua cauda para se equilibrarem quando estavam usando seus quatro membros
ou quando saltavam de um galho ao outro em busca de alimento. Nesta
época, um macaco mutante tirou vantagem dos outros por ter braços
maiores descobrindo uma nova técnica de recolhimento de frutos, que
consistia em balançar um galho com uma das mãos e lançar-se na direção
correta para agarrar o frutos que antes eram inacessíveis. Estes macacos
que se beneficiaram com este tipo de colheita, sofreram uma nova
mutação, desevolvendo punhos mais móveis e braços ainda mais longos ao
passarem do balanço ao salto, deseparecendo assim a cauda por não ser
mais um meio de equilibrio. Sem a cauda, não foram mais classificados
como macacos e sim como símios.
1.2 . SÍMIOS
Ao passar dos anos, o estilo de vida dos
símios apresentou novas mudanças, como um novo tipo de dieta, que
requeria uma maior mastigação. Diante de tais razões, os símios passaram
a ter molares mais fortes com cinco cúspides (pontas) ao invés de
quatro como os macacos. Sua postura, gradualmente, tornou-se cada vez
mais ereta, criando a capacidade de sentar-se ao invés de agachar-se, e
tendo as mãos livres, facilitou algumas tarefas como empurrar, segurar,
bater, examinar, entre outras. Em relação aos macacos, eles tinham mais
vantagens agora com as mãos livres: os macacos, se estiverem segurando
algum alimento com as mãos e precisarem correr por causa de algum
predador, precisam das quatro patas para correr, deixando cair o
alimento. Os símios, por sua vez, se tornavam cada vez mais inteligentes
com o uso das mãos. Passaram, portanto, a fazer cada vez mais tarefas
manuais que estimulou o crescimento do cérebro, deixando-os cada vez
mais inteligentes para fazerem tarefas mais difíceis.
Convém ponderar que através de várias
mutações genéticas, os símios ficaram superiores as demais espécies de
macacos em relação à inteligência. Por volta de quinze milhões de anos
a.C., o clima de todo o mundo sofreu algumas modificações, deixando a
região africana mais árida. As florestas tropicais africanas, em várias
regiões, viraram savanas, e os animais que ali viviam, tiveram que
adaptar-se as novas circunstâncias ou procurar um novo lugar parecido
com aquele que viviam.
O primeiro símio que se adaptou a um novo lugar fora da região africana foi o Ramapithecus,
conhecido como“símio Rama”, que foi denomidado assim em homenagem ao
deus hindu, Rama. Seus fósseis foram encontrados com abundância na
região do Himalaia, mas também em lugares tão distantes como a China e
Espanha. Vale ratificar que o que diferencia este símios dos outros são
seus dentes, que deixaram de ser afiados e ficaram tão longos quanto os
incisos, podendo movimentar a mandíbula de um lado para o outro. Essa
característica é de um animal que triturava grãos e sementes, sendo um
símio que havia descido das árvores em caráter definitivo.
1.3. AUSTRALOPITHECOS
Foram encontrados fósseis do Australopithecus africanus,
também conhecido como “símio do sul da África”, no sul e no leste na
África. Eles mediam aproximadamente 1,25 m de altura e seu cérebro era
um pouco maior do que os dos chimpanzés. Tenha-se presente que sua
característica mais relevante era que estes tinham a postura ereta. Os
primeiros australopitecos viveram por volta de cinco milhões anos a.C. e
o último desapareceu por volta de um milhão a.C. Foram encontradas
várias mudanças anatômicas através dos fósseis em relação aos seus
ancestrais: o orifício na base do crânio através do qual passa a medula
espinhal localizava-se em posição quase diretamente inferior, já nos
símios dava para o exterior, na região posterior do crânio. Como nos
outros primatras da época, a espinha não formava mais um arco acentuado,
e sim mostrava-se em forma de S, ereto no centro e curvando – se
ligeiramente na altura do pescoço e na parte mais estreita das costas. A
pélvis tornou-se mais curta, mais ampla e mais bojuda, sustentado o
peso do torso. As juntas das cadeiras modificaram-se, de forma que as
pernas se alinharam com a espinha e os joelhos de juntaram, suportando
com mais eficácia o peso do corpo. Assinale, ainda, que os tornozelos
ficaram mais fortes e mais flexíveis do que os dos símios, as solas dos
pés mais arqueadas que chatas, e o maior artelho alinhou-se com os
outros, perdendo assim sua capacidade de agarrar, mas adquirindo a de
suportar todo o peso do corpo.
As duas espécies posteriores de australopitecos foi a A.robustos e a A.boisei, que viveram por volta de 2 000 000 e 1000 000 a.C. , encontrados na África do Sul em 1938. Vale ressaltar que na espécie A.boisei sua característira mais significava eram suas mandíbulas grandes, que deixaram a espécie conhecida como “homem quebra-nozes”.Outra espécie de australopiteco é o A.afarensis, que viveu por volta de 3,5 milhões de anos atrás. Vale dizer que foi descoberta pelo antropólogo Don Johanson em Hadar, na Etiópia em 1974. Ao descobrir que era uma fêmea, denomiram-na de “Lucy” devido à música “Lucy in the sky with diamonds” dos Beatles que estava tocando no momento em que comemoravam a nova descoberta.
Cumpre observar que os australopitecos
possuíam cérebros bem menores que a de um homem moderno, mas eram
maiores que o de um chimpanzé. A capacidade média do crânio de um
australopiteco adulto media aproximadamente 450 centímetros cúbicos, 65 a
mais que o de um chimpanzé, mas cerca de mil centímetros cúbicos menor
do que o de um homem moderno.
Os australopitecos adultos das menores
espécies mediam cerca de 1,20 metros de altura e não pesavam mais de 30
quilos. Já os das maiores espécies mediam 1,55 metros de altura e
pesavam cerca de 70 quilos.
Vale lembrar que eram herbívoros por possuírem grandes molares, ideais para triturar plantas e vegetais duros.
Em termos biológicos e biomecânicos,
caminhar sobre os membros inferiores com o corpo na vertical exige um
equilíbrio difícil, sendo uma das desvantagens de andar ereto. Outra
desvantagem está relacionada à velocidade: andar com dois membros é um
modo de locomoção ineficiente. Já os símios e os macacos, que precisam
dos quatros membros para andar, são bem mais rápidos que os humanos. Por
outro lado, os bípedes tem um nível de resistência mais elevado que o
dos quadrúpedes. A maioria dos humanos consegue correr uma maratona de
42 quilômetros, enquanto um quadrúpede como a zebra, por exemplo, não
consegue correr mais do que 800 metros por ficar exausta.
Registra-se ainda que um dos fatores que
deve ter influenciado na questão dos australopitecos ficarem com a
postura ereta, foi andar sob o sol tropical. Com a postura ereta,
ficavam menos queimados, recebendo apenas dois terços da quantidade do
sol recebida pelos quadrúpedes e ainda menos quando o sol está a pino.
Outro fator foi o uso das mãos cada vez mais frequente: eles se
comunicavam por um meio primitivo de sistema vocal, usando as mãos para
carregar objetos, deixando a boca livre para a comunicação. Com as mãos
livres podiam executar tarefas manuais e levar alimentos para seus
companheiros. Nos grupos familiares dos símios, cada indivíduo vai em
busca de seu próprio alimento, e já os australopitecos compartilham os
alimentos com seus familiares, usando as mãos para carregar alimentos.
Essa técnica os benefiaram muito em relação à sobrevivência.
1.4. HOMEM1.4.1. HOMO HABILIS
Cumpre assinalar que não se sabe como e quando ocorreu a transformação do australopitecos para o homem, mas há relatos que o Australopithecus e o Homo
viveram lado a lado na África durante aproximadamente 800 mil anos. Os
australopitecos que não evoluíram para humanos extinguiram-se devido à
ineficácia adaptação nas savanas africanas, por estarem cercados por uma
quantidade grande de herbívoros, e depois por um número cada vez maior
de outras espécies, incluindo o primitivo Homo, que passou a
incluir a carne em sua dieta. Vale dizer que com um número cada vez
superior de herbívoros e onívoros mais eficientes, o australopiteco foi
desaparecendo cada vez mais, sendo que o último morreu por volta de 1
milhão de anos a.C.
O Homo, o ser humano, surgiu na Terra por volta de 2 300 000 a.C., enquanto os australopitecos declinavam em sua escala evolutiva. O Homo
era carnívero e herbívoro e seu cérebro era 50 % maior do que o dos
australopitecos. Sua característica mais relevante era sua habilidade de
criar utensílios de pedra, coisa que nenhum outro australopiteco era
capaz de fazer.
Esse era o Homo habilis, o “homem hábil”. Seus fósseis foram encotrados na mesma região do Australopithecus boisei,
em Olduvai, na África oriental. Media apenas 1,25 metros e pesava cerca
de 50 quilos. Convém ressaltar que seu cérebro media 800 centímetros
cúbicos e possuia uma nova habilidade que os australopitecos
não possuíam: quebravam pedras para construir ferramentas cortantes.
Devem ter feito o mesmo com a madeira, porém não ficou nenhum vestígio
deste porque a madeira apodrece.
Vale lembrar que pela diminuição do
vegetal disponível devido as oscilações climáticas, o homem passou a
incluir a carne em sua dieta. O homem não conseguia a carne através de
combates com outros animais, mas achava carniças que outros animais
deixavam. Utilizava os utensílios cortantes para retalhar cadáveres de
animais com couro mais espesso, que os outros animais não conseguiam
perfurar. Assim, conseguiam a carcaça antes dos outros predadores.
Ao passarem a incluir a carne em sua
dieta, os hominídeos adquiriram benefícios não só nutritivos como também
sociais. Como uma carcaça era muito alimento para apenas uma pessoa,
sempre que um indivíduo a encontrava, dividia com seus companheiros,
criando um sentido primitivo de companheirismo.
Ocorreu também a expansão das fronteiras
geográficas ao passarem a comer carne. Enquanto as plantas necessitam de
condições específicas de luminosidades e clima, os animais em geral são
menos sensíveis às variações da luz e temperatura, encontrando-se mais
espalhados e por maiores distâncias, atraindo os hominídeos.
A frequente exposição dos hominídeos sob o
sol tropical durante o dia, ao preferirem buscar a carniça nesse
período por ser quando os outros carnívoros descansam, contribuiu com a
queda dos pêlos do corpo. Ao repetir essa atividade por milhares de
anos, gradualmente ocorreu a eliminação dos pelos e a dependência da
transpiração foi tornando-se cada vez maior. O suor, por diminuir a
temperatura corporal até nas horas mais quentes, foi a melhor solução
evolutiva em relação aos problemas da vida em regiões com clima bem
quente. Por outro lado, os hominídeos tinham que ao caçar, limitar-se a
regiões que tivessem água disponível, ao perderem grande quantidade de
água corporal durante tal atividade. Sendo assim, a água tornou-se
essencial para os hominídeos que dedicavam-se a caça.
Essas novas atividades e os desafios que
tinham que enfrentar ao fazê-las, estimulou a inteligência nos
hominídeos. Durante três milhões de anos, o cérebro de um australopiteco
médio permaneceu tão grande quanto de um chimpanzé. Já o do homem,
depois de um processo lento de aumento, ficou três vezes maior que de um
australopiteco.
Diversos fatores contribuíram para o
crescimento do cérebro do homem. Entre eles, a caça e a procura da
carniça foram os mais significativos. Esses dois exigiam mais
inteligência do que o simples consumos de ervas, principalmente em uma
espécie que não possuia um físico próprio para tal tipo de atividade.
Convém ponderar que a proteína da carne foi a fonte essencial de energia
para o desenvolvimento de um cérebro maior.
Outra atividade que estimulou o
crescimento do cérebro foi a fabricação de ferrementas, sendo que já
comprovou-se que animais que possuem um certo grau de habilidade manual
como os chimpanzés, são mais inteligentes que os outros. O simples ato
de lascar uma pedra com o objetivo de transformá-la em um ferramenta,
deve ter ampliado a mente do Homo habilis, sendo que através
das ferramentas forneceu-lhes capacidade de fazer tarefas ainda mais
dificeis, estimulando ainda mais o crescimento do cérebro.
O Homo habilis passou a ter um
novo nível de imaginação e percepção ao enxergar uma ponta afiada em uma
pedra arredondada, indo além do simples conhecimento de como fazer um
instrumento. Enquanto o australopiteco apenas precisava saber onde
encontrar alimento, o Homo precisava saber também onde
encontrar a matéria prima para fabricar suas ferramentas. Atividades
como esta requeria previsão, memória e planejamento, coisa que a
colheita de frutas não exigia.
A postura ereta no caminhar limitava a
expansão da pélvis humana, sendo que se ela aumentasse, as pernas iriam
ficar mais afastadas e ineficientes, e o homem voltaria à condição de
quadrúpede. A pélvis se limitando, limitou a largura do canal de parto
da fêmea, restringindo a 350 centímetros cúbicos a capacidade craniana
máxima do recém-nascido que iria passar por este canal ao nascer. Ao
passar dos anos, os seres humanos passaram a criar um novo padrão de
desenvolvimento: ao nascer, o cérebro do indivíduo conheceria a maior
parte de seu crescimento fora do ventre materno. Hoje, quando um
indivíduo nasce, possui um cérebro de 25 por cento do tamanho que
atingirá quando for adulto. No chimpanzé, por sua vez, essa proporção é
de 65 %. A vantagem dos seres humanos de nascerem com o cérebro com tal
tamanho, é que ele pode se quadruplicar durante a vida. Por outro lado,
nos primeiros anos de vida do hominídeo, no qual o crescimento cerebral é
mais intenso, o crescimento do corpo é mais lento.
Cumpre examinarmos neste passo que
enquanto um cavalo recém-nascido é capaz de levantar e caminhar sozinho
duas horas depois de nascer, e um babuíno cuida de si próprio aos doze
meses, os bebês humanos neste momento da evolução passam a ser
totalmente dependentes de suas mães pelo menos nos seis primeiros anos
de vida, exigindo uma estrutura social totalmente nova. Antes, as fêmeas
dos primatas, após o acasalamento, tinham seus filhos sozinhas.
Todavia, diante dessa nova situação, os dois sexos começam a cooperar na
criação de seus bebês indefesos, necessitando uma relação mais estável e
complexa entre os indivíduos. Algumas características humanas foram se
desenvolvendo diante dessas interações sociais, como o ciclo reprodutivo
da fêmea, que mantém as mulheres sexualmente receptivas durante a maior
parte do tempo e não apenas no período do acasalamento, que pode ter
surgido da necessidade comunitária de ligações estáveis entre os pais,
bem como da maior intimidade pessoal entre o macho e a fêmea, provocada
por esta estabilidade. O mesmo deve ter acontecido com a capacidade da
fêmea humana de chegar ao orgasmo, o que não acontece em outras
espécies. Vale ressaltar que a fidelidade sexual entre o homem e a
mulher surgiu pelo fato de a postura ereta permitir uma relação frente a
frente, e o contato entre os olhos produzir um efeito conectador,
desconhecido pelos outros animais, obrigados a cobrir a fêmea por trás.
1.4.2. HOMO ERECTUS
Pode-se supor que pelos locais onde foram encontrados fósseis do Homo habilis, ele não foi além dos limites da África oriental. Todavia, a evolução prosseguiu. Surgiu o hominídeo mais avançado, o Homo erectus. Este, era descendente direto do Homo habilis,
porém sua constituição física era mais avançada. Vale dizer, que os
maiores representantes devem ter tido até 50 cm a mais que seus
antecessores, pesando 20 Kg a mais que o Homo habilis. O
aumento do corpo deve ser conseqüência da escassez de alimentos.
Ponderando o assunto, quanto maior é o animal, menor é a exigência de
energia em relação ao tamanho de seu corpo. Por exemplo, um sagüi
precisa, proporcionalmente, de três vezes mais energia que um ser
humano, e, portanto, necessita de alimentos muito energéticos – como
nozes ou carne – ou precisará passar o dia todo ingerindo alimentos de
baixa energia, como folhas. Nessa linha de análise, diante de um
ambiente onde encontrava-se em maior abundância os alimentos de baixa
energia, pode-se dizer que os hominídeos desenvolveram um físico mais
avantajado para compensar esse desequilíbrio.
Tenha-se presente que o cérebro do Homo erectus media aproximadamente 950 cm³, em oposição aos 800 cm³ do Homo habilis. Com um cérebro maior, o Homo erectus passou
a fabricar utensílios simétricos, em forma de pêra, conhecidos como
machados de mão. Com estes novos instrumentos, fabricados a partir de um
pedaço de pedra, o Homo erectus podia esquartejar com mais
facilidade as carcaças de animais. Também aprenderam a confeccionar
raspadores de pedras, para utilizá-los em tarefas como tirar animais de
seus esconderijos, fazendo saltar pedaços menores de um bloco maior.
1.5. FOGO
Convém ressaltar que, a certa altura,
descobriram como usar o fogo. Foram achados pedaços de argila queimada
datados de 1.400.000 a.C. em Chesowanja, na África oriental. Ossos de
animais e utensílios de pedra encontrados nas proximidades mostram que o
Homo erectus estivera ali. Foram realizados testes com a
argila que indicam que ela foi aquecida a 400°C – temperatura específica
de uma fogueira. Todavia, a argila pode ter sido queimada por um
incêndio da vegetação.
Não há evidências definitivas que
comprovem o uso controlado do fogo pelos humanos no milhão de anos
seguinte. Vale dizer, portanto, que a data exata em que o Homo erectus conheceu o uso do fogo permaneceu desconhecida. No entanto, o Homo erectus viveu não apenas no clima quente da África, como o Homo habilis,
mas também nas regiões mais frias da Europa e da China. Conclui-se que,
para sobreviver nos continentes mais frios, o fogo deve ter sido
essencial.
A parte inicial do período Quartenário,
de 2.000.000 a 8.000 a.C., tampouco foi particularmente hospitaleira em
qualquer parte do mundo. O Homo erectus sobreviveu
obstinadamente a essa alternância de climas, sofrendo poucas mudanças
notáveis, físicas ou mentais, durante um período de cerca de 1,5 milhões
de anos. Vale dizer que ele aprendeu a fazer ferramentas um pouco
melhores e conseguiu construir cabanas de gravetos, mas seu maior
progresso foi na caça. Por volta de 300.000 a.C., bandos de caçadores
nômades do gênero Homo erectus atacavam e matavam animais tão
grandes quanto o elefante e utilizavam o fogo para levar grandes animais
a áreas fechadas, onde podiam ser mortos mais facilmente.
Eles andavam em bandos de vinte a trinta
indivíduos. a África, a Ásia e a Europa juntas deve ter abrigado 40 mil
desses grupos – e havia menos de um milhão deles em todo o mundo.
Provavelmente, as mais complexas
articulações vocais dos homens modernos não existiam, mas a coordenação
de um bando de caçadores para abater grandes presas pode ser conseguida
pela gesticulação ou pela força de exemplo – os lobos fazem isso com
muita eficiência.
1.6. Homo sapiens; Homo sapiens sapiens e Homo sapiens neanderthalensis
Assim, o Homo erectus trilhava
sem espalhafato o caminho da evolução. Entretanto, logo após 300.000
a.C., parece ter havido um desvio. Sabe-se disso pelos restos
encontrados em toda a África, Ásia e Europa, que por essa época começam a
exibir uma mistura de características físicas: possuem os cérebros
maiores e os crânios mais delgados tal como o Homo moderno, mas
conservam os ossos pesados e a fronte achatada de um homem mais
primitivo. Estes restos encontrados pertenceram a hominídeos que foram
classificados como Homo sapiens “arcaico”. Alguns deles paracem ter evoluído naturalmente até o homem anatomicamente moderno, ou Homo sapiens sapiens.
Outros – particularmente os que foram encontrados na Europa e no
Levante – conheceram um tipo bastante diferente de transição. Por volta
de 100.000 a.C., transformaram-se no homem de Neaderthal, uma criatura
que se tornou – muito injustamente – sinônimo de irracionalidade
primitiva.
Convém dizer que os cientistas costumavam classificar esse hominídeo, Homo neanderthalensis, como uma espécie totalmente à parte, porém nos dias atuais ele é reconhecido como nosso parente mais próximo, o Homo sapiens neanderthalensis.
Comparando com seus predecessores, o
neandertalense ocupava um território muito limitado, pois havia
desaparecido inteiramente por volta de 30.000 a.C. Enquanto o Homo erectus
sobreviveu por mais de um milhão de anos, realizando poucas inovações
notáveis, o neandertalense desapareceu depois de apenas 70 mil anos,
período em que, entre muitas outras realizações, revolucionou a arte da
fabricação de ferramentas a tal ponto que até poderíamos classificá-la
como produção em série.
1.7. Homo sapiens sapiens
Os hominídeos que os substituíram tinham
uma aparência bem dirente do neandertalense. Embora não ultrapassassem a
altura dos neandertalense em mais de 20 cm, eram infinitamente mais
esbeltas e ágeis, pesando entre 30 a 45 quilos menos do que ele. Também
apresentavam traços diferentes: acima dos seus olhos erguia-se uma testa
alta e elegante – não interrompida pelos pesados supercílios do
neandertalense – que primeiro se elevava para depois se inclinar, assim
formando o crânio abobadado que abrigava o cérebro. Esse hominídeo era o
Homo sapiens sapiens, o “homem duplamente sábio”, um ser
humano que não se distinguia anatomicamente de nós. Ele surgiu no sul da
África por volta de 100.000 a.C., e nos 70 mil anos seguintes
substituiu todas as espécies anteriores de hominídeos do mundo.
É indiscutível que o Homo sapiens sapiens conseguiu
dominar o resto do mundo com sua tecnologia e cultura, mas ninguém sabe
como ele fez isso em um período de tempo tão pequeno, em termos
biológicos.
1.8. A linguagem humana
Possivelmente foi por dispor de uma
ferramenta que se comprovou mais útil do que qualquer agulha de costura
feita de osso, uma arma mais poderosa do que qualquer de suas pontas de
lança de pedra – a linguagem.
Através da linguagem o Homo sapiens sapiens pôde
passar o conhecimento tecnológico. Com a linguagem, pôde lançar-se à
complexas aventuras em conjunto, tais como a que parece ter sido uma
migração organizada para a Austrália por volta de 50.000 a.C. E por meio
da linguagem ele podia expressar pensamentos e conceitos abstratos que
manisfestou na grande produção de pinturas, desenhos e entalhes que
começaram a aparecer na Europa por volta de 30.000 a.C.
Indiscutivelmente, ele possuía o
equipamento vocal necessário: sua faringe havia se tornado
proporcionalmente muito mais longa do que a dos primeiros hominídeos e a
língua possuía maior flexibilidade, o que lhe permitia formar e emitir
maior variedade de sons em rápida sucessão.
A capacidade de falar do Homo sapiens sapiens também
deve ter provocado algum efeito em sua aparência externa. Conclui-se
isso ao observar os bebês humanos dos dias atuais, que nascem sem a
faringe totalmente desenvolvida. Com três meses, à medida que seu
aparelho fonador começa a tomar forma, a laringe coloca-se em posição
mais baixa. Nesse ponto, a base do crânio começa a se arquear, formando
uma parede acima da faringe. É possível que ao longo de milhares de anos
esse arqueamento da base do crânio tenha tido o efeito de empurrar a
face saliente do Homo erectus para dentro. Essa pressão deve ter forçado o cérebro para trás e para cima, dando o crânio do Homo sapiens sapiens a forma mais arredondada que possui hoje.
Embora ainda não comprovada, essa teoria explicaria a grande velocidade das mudanças biológicas que transformaram o Homo erectus
e seus descendentes no homem anatomicamente moderno. As inúmeras
vantagens que um falante possuía em relação a um não-falante
transformaram-se em mais uma poderosa razão evolutiva para essas rápidas
mudanças.
Os não falantes ou possuidores de uma
linguagem muito restrita, acabariam por transformar-se em virtuais
cidadãos de segunda classe, relegados aos confins do mundo habitável,
condenados a viver apenas onde a população falante não quisesse viver e a
comer apenas o que esta última desprezasse. Muito em breve, suas
condições inferiores de vida fariam com que seu número começasse a cair,
enquanto aumentava o da população falante. É claro que boa parte disso
não passa de especulação, baseada em achados arqueológicos no Oriente
Próximo, África e Europa. Praticamente não existem evidências do que
acontecia por essa época na Arábia, na Ásia central ou Índia; ninguém
pode garantir a possível existência de fósseis a espera de uma
inundação, ou da explosão de uma pedreira, para lançar mais luz sobre o
mistério: um Neanderthal ainda vivo em 10.000 a.C. ou um Homo sapiens sapiens vitorioso,
talvez com a ajuda da linguagem, o que implica um golpe de estado
evolutivo. Por volta de 30.000 a.C., os seres humanos anatomicamente
modernos já haviam alcançado a supremacia sobre todas as outras espécies
da Terra. A partir desse momento, o desenvolvimento da história da
humanidade deixou de ser o da natureza moldando seres humanos e começou a
ser o dos seres humanos moldando a natureza.
“Como predadores inteligentes, estávamos
equipados com cérebros e mãos úteis e conseguíamos alterar os limites de
nosso nicho de formas impossíveis aos outros animais. Conseguíamos
atirar pedras, empregar ferramentas simples de pedra e madeira, e
fazíamos tudo isso melhor que os outros primatas.
Muitos animais, até insetos como abelhas e
formigas, conseguem comunicar-se. Usam alarmes e gritos de
acasalamentos e comunicam informações detalhadas sobre tamanho, direção e
distância de fontes de alimento. Nós, seres humanos, tivemos a sorte de
adquirir, através da mutação, a capacidade de modular nossas vozes para
a linguagem falada primitiva. Essa mudança foi tão profunda para o
homem primitivo como a invenção do computador ou telefone celular para o
homem moderno. Os membros da tribo podiam compartilhar experiências:
podiam fazer planos para se proteger das secas e fomes e se defender de
predadores. Éramos então o Homo sapiens emergente, e talvez
fôssemos os primeiros animais a modificar conscientemente o meio
ambiente em seu próprio benefício. E o mais notável foi que aproveitamos
incêndios naturais provocados por raios para cozinhar, desmatar a terra
e caçar.” James Lovelock (2006)
Referências Bibliográficas:
– A Aurora da Humanidade. História em Revista. Rio de Janeiro: Abril Livros, 1993.
– Lovelock, James. A Vingança de Gaia. Intrínseca. Rio de Janeiro. 2006.