Fósseis apontam que mar cobria o interior de SP há 260 milhões de anos
Sítio arqueológico foi descoberto durante escavação em mina de calcário em Santa Rosa de Viterbo. Pesquisadores de universidades brasileiras e portuguesas reuniram dados em inventário geológico.
Um levantamento realizado por pesquisadores de sete universidades
brasileiras e portuguesas apontou que há 260 milhões de anos o interior
de São Paulo era coberto por água. O chamado “mar de Irati” tinha 1
milhão de quilômetros quadrados e acabou secando após uma série de
mudanças geológicas.
Entretanto, fósseis de animais marinhos e vestígios de algas ainda
podem ser encontrados em algumas regiões, como no município de Santa
Rosa de Viterbo (SP), a 300 quilômetros da capital paulista, onde ficava
uma das praias de água salgada, limpa, clara, rasa e quente, como
descreve o estudo.
As primeiras descobertas ocorreram na década de 1970, durante os
trabalhos de escavação em uma mina de calcário que, mais tarde, se
tornou um sítio arqueológico. Agora, as informações foram reunidas em um
inventário geológico, publicado na revista científica GeoHeritage.
O documento é assinado por geocientistas da Universidade de São Paulo
(USP), Universidade de Campinas (Unicamp), Universidade Estadual
Paulista (Unesp), Universidade Federal de São Carlos (UFScar),
Universidade Federal do Paraná (UFPR), Instituto Florestal e Instituto
Geológico de São Paulo.
Segundo os pesquisadores, os elementos que comprovam a existência do
mar de Irati estão embaixo da terra, a até 25 metros de profundidade: os
estromatólitos são rochas que se formam no fundo de mares rasos a
partir de microrganismos solidificados, que se acumulam como um tapete
de limo.
Em Santa Rosa, com a retirada do calcário pela mineração, foram
descobertos estromatólitos gigantes, que só haviam sido encontrados na
Namíbia. O engenheiro de minas Marco Antônio Cornetti explica que esse
tipo de rocha geralmente é pequeno, mas no interior de São Paulo há
alguns com até três metros.
“Uma infinidade de algas morreu e o calcário começa a sedimentar em
cima delas. Ninguém sabe por que essas algas não sedimentavam de forma
plana, elas formam uma estrutura. Por que elas assumiram essa forma,
ninguém sabe o motivo”, diz.
Cornetti trabalhou na pedreira em 1972, quando os primeiros indícios de
vida marinha foram descobertos, e também atuou ao lado dos
pesquisadores entre 2012 e 2015, na elaboração do inventário atual. Ele
conta que o grupo também achou coprólitos, fezes fossilizadas de peixes e
tartarugas.
“Elas têm formas diferentes: uma mais cilíndrica e outra mais redonda.
Isso vai mostrar a origem de um e de outro [animal]. Esses coprólitos e
os restos de conchas estão nessa camada [de rocha], o que comprova
ambiente marinho nesse local”, afirma.
Nas áreas de mineração, os geocientistas ainda identificaram fragmentos
de ossos de um vertebrado que antecedeu os dinossauros, o Mesosaurus
brasiliensis. O animal vivia no mar de Irati e era parecido com um
lagarto com um metro de comprimento, segundo Cornetti.
“Ele ficava em cima do estromatólito, morria e caía entre dois
estromatólitos. A onda ficava balançando e, por isso, você não encontra o
corpo do Mesosaurus completo, porque a água do mar ficava balançando e
separava todos os pedacinhos”, explica.
Extinção
O mar de Irati se estendia pelos estados de São Paulo, Goiás, Minas
Gerais, Paraná, Rio Grande do Sul e até partes do Uruguai, Paraguai e
Argentina. Segundo os pesquisadores, movimentos geológicos fizeram quase
toda água escoar para o oceano Atlântico.
“Na região de Uberlândia o solo foi levantando e foi expulsando o mar
em direção à foz do Rio Paraná. Em Santa Rosa, ficou um mar fechado, com
mais ou menos 3 mil hectares. Não entrou mais água, esse mar secou e na
hora que foi secando, foi depositando calcário”, diz Cornetti.
O engenheiro explica que o Irati era um mar raso, com aproximadamente
200 metros de profundidade, e levou cerca de 20 milhões de anos para
secar. Logo depois, a região virou um deserto e, lentamente, a vegetação
foi se recompondo. As rochas existentes no local ajudaram a formar o
maior reservatório de água do mundo: o Aquífero Guarani.
“Depois do mar, se formou um lago com lama argilosa. Aí, aparecem os
derrames basálticos e a formação do que, todo mundo conhece, os aquífero
Guarani, Botucatu e Pirabóia, que estão muito acima topograficamente
dessa formação, são bem mais recentes”, diz.
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