Rocha da minha rocha
Artigos publicados pela revista ‘Science’ reforçam a
hipótese de que a Lua teria se originado de um grande impacto da Terra
com planeta primitivo.
Publicado em 18/10/2012
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Atualizado em 19/10/2012
Resultados obtidos por equipes dos Estados Unidos parecem
superar limitações e reforçar hipótese de que a Lua teria surgido após
um choque entre a Terra e outro planeta primitivo, bilhões de anos
atrás. (foto: Nasa)
Há 4,5 bilhões de anos, nosso então jovem planeta era uma bola de rochas e lava incandescente em formação, em meio ao instável sistema solar daqueles tempos – onde certa confusão e choques entre planetas eram relativamente comuns. Segundo a hipótese mais usual, um desses protoplanetas, com cerca de metade do tamanho da Terra, ocupava a mesma órbita terrestre em torno do Sol e acabou chocando-se contra a Terra. O impacto formou uma enorme nuvem de poeira e destroços ao seu redor, formada por pedaços arrancados do nosso próprio planeta e pelos restos do astro que colidiu com ele. Em cerca de apenas um ano, esse material teria se aglutinado para formar a Lua.
Apesar de ser a mais aceita hipótese sobre a origem de nosso satélite natural, a teoria sempre apresentou limitações importantes. Não explicava, por exemplo, como as rochas presentes na Terra e na Lua poderiam apresentar uma composição similar de oxigênio e de isótopos de elementos como tungstênio, cromo e titânio. A resposta pode parecer simples: as rochas da Lua vieram do nosso planeta! Mas as simulações do ‘impacto criador’ mostravam que cerca de 60% da Lua deveria ser formada pelo material proveniente do outro protoplaneta, o que muito dificilmente permitiria à Terra e a seu satélite apresentarem uma composição geoquímica final semelhante.
Uma Terra mais rápida
Os dois artigos publicados na Science vêm desfazer esse paradoxo. Um deles, assinado pelos pesquisadores Matija Cuk, atualmente no Instituto Seti, e Sarah Stewart, da Universidade Harvard, ambos nos Estados Unidos, mostra que a interação gravitacional do Sol com o sistema formado pela Terra e a nova Lua poderia ter reduzido muito mais a velocidade de rotação da Terra primitiva do que se pensava anteriormente, o que abre caminho para a proposição de novos modelos de impacto inicial.“Uma das limitações da hipótese era justamente a velocidade de rotação atual da Terra”, explica o pesquisador Robin Canup, do Instituto de Pesquisa do Sudoeste, do Colorado, Estados Unidos, autor do outro trabalho publicado na Science. “Os resultados de Cuk e Stweart mostraram que após a colisão dos protoplanetas, a Terra pode ter passado a girar muito mais rápido do que pensávamos e sua posterior interação com a Lua seria capaz de gerar uma desaceleração bem maior, o que permitiu a proposição de novos cenários.”
O trabalho de Cuk e Stweart indica que os dias na Terra primitiva, logo após o impacto com o protoplaneta, provavelmente tinham uma duração média de 2h30 e a formação da Lua teria rapidamente aumentado esse período para cerca de 5h. Os bilhões de anos de interação gravitacional entre ela, a Terra e o Sol continuaram a desaceleração, levando o dia terrestre às cerca de 24h atuais. Em contrapartida, essas mesmas forças tornaram as noites de lua atuais menos luminosas – afinal, o satélite tem se afastado gradativamente da Terra. Quando da sua formação, localizava-se a apenas 25 mil quilômetros do nosso planeta, uma distância 15 vezes menor do que a atual.
Novos cenários
A partir das possibilidades abertas pela descoberta do grupo de Cuk e Stweart, foram desenvolvidos dois novos cenários para explicar a dinâmica envolvida no grande impacto que teria dado origem à Lua.Os próprios pesquisadores propõem em seu artigo uma hipótese que apresenta uma Terra primitiva já com um tamanho bem semelhante ao atual, girando a uma grande velocidade – mesmo antes do choque –, com um dia médio de pouco mais de 2h. Um pequeno protoplaneta, com uma massa equivalente a 0,05 da massa terrestre atual, teria se chocado contra a Terra, ejetando fragmentos do planeta. A gravidade teria, então, aglomerado esses pedaços arrancados da superfície para formar a Lua – e a interação gravitacional com o novo satélite teria diminuído a velocidade de rotação do planeta pela metade, como previsto.
Outro cenário possível – e bem diferente – foi apresentado pelo grupo de Robin Canup, no outro artigo publicado na Science. Nele, dois protoplanetas de tamanho bem similar, cada um com uma massa semelhante à metade da massa atual da Terra, teriam se chocado. O impacto teria transformado os dois corpos em um ‘terceiro’ planeta com uma grande velocidade de rotação (um período médio de 2h30) e formado uma nuvem de destroços em torno dessa nova Terra. A partir daí, os cenários são similares: os destroços se aglomeraram para formar a Lua e a configuração desse sistema Terra-Lua teria desacelerado pela metade a rotação do planeta.
Confira vídeo produzido pela equipe de Canup que simula a mecânica envolvida no segundo cenário proposto
Os pesquisadores afirmam que os novos dados reforçam a hipótese que relaciona o surgimento da Lua a uma grande colisão planetária, mas destaca que é cedo para saber qual dos dois cenários seria mais provável para explicar a formação do satélite. “As duas simulações mostram que um grande impacto poderia realmente ter originado uma Lua com sua composição atual, formada principalmente por material oriundo do manto terrestre e com uma pequena quantidade de ferro, originada do núcleo de nosso planeta”, afirma. “Mas serão necessários mais estudos sobre a dinâmica do início do nosso sistema para termos mais clareza sobre qual cenário seria o mais provável.”Ele também destaca a importância dos resultados para o entendimento do processo de formação dos sistemas planetários. “As descobertas também são importantes por trazerem mais entendimento sobre o início do nosso sistema solar e sobre o processo de formação de planetas como a Terra em todo o Universo”, explica.
Marcelo Garcia
Ciência Hoje On-line
Este texto foi atualizado para incluir a seguinte alteração:
Diferentemente
do que afirmava a versão anterior da matéria, os resultados divulgados
não são importantes para o entendimento da mecânica cosmológica, e sim
para a melhor compreensão do processo de formação dos sistemas
planetários.
Agradecemos o comentário do cosmólogo Martin Makler, do
CBPF, que nos sugeriu a correção.
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