Uma boa história de química
Artigo toma como base a penicilina e a narrativa de sua
descoberta para aguçar a curiosidade do aluno diante de uma matéria
rejeitada por muitos: a química orgânica.
Publicado em 22/10/2012
|
Atualizado em 22/10/2012
Alexander Fleming posa junto às suas culturas de bactérias: a
penicilina, descoberta pelo cientista, é tema de artigo na revista
‘Química Nova na Escola’. (foto: Wikimedia Commons)
Muitos professores já falaram isto ao ‘Alô, Professor’: quanto mais
distante da realidade do aluno for o tema, mais difícil será capturar o
seu interesse. Agora, imagine-se estudante. A aula é de química
orgânica. Muito prazer cadeias de carbono, hidrogênio, hidrocarbonetos!
Pela primeira vez você é apresentado àquelas ligações. Não deve ser
fácil o primeiro contato.
Em espanhol, vídeo que conta
A penicilina foi descoberta em 1928. O antibiótico foi produzido em larga escala apenas em 1942. “Uma das coisas interessantes da história da penicilina é que a descoberta demorou muito tempo para se transformar num benefício à sociedade”, diz Calixto.
Veja abaixo, em espanhol, vídeo que conta
Thiago Camelo
Ciência Hoje On-line
Quanto mais distante da realidade do aluno for o tema, mais difícil será capturar o seu interesse
Outro cenário. Antes de apresentar cadeias de carbono, hidrogênio e
afins, o professor conta a história da penicilina – antibiótico e, para
fins didáticos, um composto orgânico. Só depois de narrar a inesperada
história da descoberta do antibiótico, apresenta a estrutura molecular
da penicilina e suas especificidades. Relaciona assim a penicilina a
algo maior – aos acasos da ciência, à conjuntura do mundo na época, à
atual fase da indústria farmacêutica.
“A história da penicilina chama a atenção dos alunos para a
importância de certas substâncias orgânicas; além disso, constrói a aula
de modo multidisciplinar, o que sempre é mais interessante para o
estudante”, defende o químico Éder Cavalheiro, pesquisador da
Universidade de São Paulo, campus de São Carlos. Ele e sua aluna de
doutorado Carolina Calixto escreveram artigo para a revista Química Nova na Escola sobre o tema.
O acaso e a ciência
A história da descoberta da penicilina é um prato cheio para alunos
minimamente curiosos. É quase mágico o acaso que fez com que o cientista
britânico Alexander Fleming descobrisse o antibiótico natural derivado
de um fungo, o Penicilium. Não é todo dia na ciência – aliás, é
muitíssimo raro na ciência – que uma descoberta dessa estirpe é feita.
Inclusive, diante do fantástico acidente, Fleming teria dito a notável
frase: "Não inventei a penicilina, a natureza é que a fez".
Em espanhol, vídeo que conta
a história da descoberta de Fleming
A penicilina foi descoberta em 1928. O antibiótico foi produzido em larga escala apenas em 1942. “Uma das coisas interessantes da história da penicilina é que a descoberta demorou muito tempo para se transformar num benefício à sociedade”, diz Calixto.
O estudante, provavelmente, perguntará por quê. A explicação é
interdisciplinar e envolve um evento histórico: a 2ª Guerra Mundial e a
necessidade de tratar milhões de soldados feridos. Antes da guerra, não
houve mobilização suficiente para produzir o medicamento em grande
quantidade. Era caro e cientificamente desafiador. O artigo destaca um
depoimento raro do próprio Fleming sobre o feito:
“O desenvolvimento da penicilina em grande escala constitui uma história maravilhosa. Governos, fabricantes, cientistas e todos, desde o operário mais humilde, desempenharam sua parte. Havia o estímulo da guerra e grande número de colaboradores de toda espécie possuía parentes próximos nas forças combatentes. A penicilina demonstrara aumentar consideravelmente a probabilidade de cura dos feridos e diminuir o seu sofrimento físico. Os pesquisadores sentiam que estavam realizando algo para seus próprios amigos e parentes e nisto foram auxiliados pelas autoridades...”
Veja abaixo, em espanhol, vídeo que conta
a história da descoberta de Fleming
A química, a penicilina e a medicina
Calixto diz que, após ouvirem a história, os alunos estarão mais
interessados em conhecer a complexidade estrutural da penicilina. E
mais: será possível, por exemplo, explicar a eles que substâncias
análogas podem ser obtidas mudando-se a cadeia da estrutura básica do
antibiótico. “Cada mudança pode inativar a função antibiótica da
penicilina ou, ao contrário, fazer com que o remédio trate de uma
infecção específica”, explica. “Todos ouvem a história do Fleming e da
penicilina no colégio, mas ela pode ser mais bem explorada, o professor
pode atiçar a curiosidade do aluno para a química orgânica”, completa.
Calixto destaca que ela e seu orientador se preocuparam em mostrar no
artigo a grande variedade de penicilinas que podem ser criadas a partir
da fórmula estrutural da substância. É um jeito também de falar da
variedade de antibióticos e de bactérias que existem. É também uma forma
de tocar em outro assunto: o uso indiscriminado de antibióticos e a
resistência bacteriana a esse tipo de medicamento. “Podemos falar, nesse
tópico, das adaptações biológicas das bactérias”, explica Cavalheiro.
No final do artigo, eles escrevem: “Deve ficar evidente desse debate a
importância da penicilina e, consequentemente, das moléculas orgânicas
em geral na sociedade contemporânea, provocando assim o efeito motivador
para o estudo das funções orgânicas no ensino médio e dos conteúdos
mais avançados de química (e bioquímica) no ensino superior”.Thiago Camelo
Ciência Hoje On-line
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