Determinação do Sexo
Referência
Moreira, C.,
(2013)
Determinação do Sexo,
Rev. Ciência Elem.,
V1(1):073
Resumo
A determinação sexual resulta no desenvolvimento de
indivíduos com características que permite os permite serem
identificados como machos, fêmeas ou hermafroditas – isto é, espécies
com dimorfismo sexual. Estas diferenças podem ser mais ou menos notórias
– por exemplo, o pavão macho possui grandes e exuberantes penas na
cauda, mas as fêmeas não. Em muitos casos a determinação do sexo é
genética, existindo uma grande variedade de mecanismos
regulatórios.
Uma das principais descobertas para a compreensão da
determinação sexual foi a dos cromossomos sexuais no início de 1900. Na
maioria dos animais as diferenças entre os sexos são determinadas por
diferenças cromossômicas. Animais com dois cromossomos sexuais
diferentes são designados heterogaméticos e produzem consequentemente
dois tipos de gametas (rever Meiose). Os animais com sexo homogamético,
pelo contrário, produzem apenas um tipo de gametas. Nos humanos,
geralmente os machos têm um cromossomo X e um Y e as fêmeas dois cromossomos X.
Invertebrados
A maioria dos insetos apresenta dimorfismo ao nível dos cromossomos sexuais que podem ser distinguidos citologicamente. Nas
traças e nas borboletas, da ordem Lepidoptera, as fêmeas são
heterogaméticas e os machos homogaméticos. Nos lepidópteros os cromossomos sexuais designam-se por W e Z, sendo o cromossomo W
associado ao desenvolvimento de características femininas. Se um indivíduo for ZZ então será macho, no entanto, um indivíduo ZO poderá
ter características de fêmea. Este é o caso da traça Talaeporia
tubulosa, a temperatura ambiente é crucial na determinação do
sexo dos indivíduos, quando na ausência de um cromossomo W – quando as
temperaturas são mais elevadas os ovos dos indivíduos ZO desenvolvem-se
mais como machos. Este é um exemplo de uma vantagem adaptativa que
favorece a produção de fêmeas quando as condições são mais favoráveis
(temperaturas mais elevadas) e mais recursos disponíveis aumentando a
probabilidade de reprodução.
Nos gafanhotos, o sistema de determinação sexual
baseia-se num só cromossomo: indivíduos só com um cromossoma X (XO) são
machos, que produzem dois tipos de gametas (heterogaméticos).
Na Drosophila melanogaster, conhecida por ser
um modelo laboratorial excelente, o mecanismo é relativamente raro. A
escolha entre o desenvolvimento de um macho ou de uma fêmea é feito por
uma única alteração num gene denominado sex-lethal
(sxl, sexo letal) em reposta à proporção entre o número de cromossomos X’s e o número de autossomos. O balanço entre os fatores
que determinam a feminização (cromossomo X) ou a masculinização
(autossomos) determina a ativação do padrão de transcrição que será
iniciado. O cromossomo Y, presente nos machos, não interfere no
processo, sendo apenas funcional na espermatogénese durante a
diferenciação da linha somática (do inglês germline) masculina.
Assim indivíduos XX, XXY e XXYY são fêmeas, e indivíduos XY e XO são
machos.
Vertebrados
Répteis
Nos répteis existem vários padrões de determinação
sexual. As cobras possuem um padrão ZZ/ZW de cromossomas sexuais,
semelhantes ao das aves (ver abaixo). Nos lagartos, podemos encontrar
padrões ZZ/ZW ou XX/XY semelhante ao dos mamíferos. Existem também casos
de espécies que não possuem cromossomas sexuais distintos nem genes
cujas presença ou ausência determine o sexo, por exemplo, muitas das
tartarugas terrestres, os crocodilos e tartarugas marinhas. Nestes
organismos, a temperatura ambiental durante um período específico –
período termosensitivo – da incubação é determinante na
determinação sexual.
Durante este período termosensitivo a enzima denominada
aromatase, responsável pela conversão de androgénios (hormona masculina)
em estrogênios (hormônio feminino), inicia a sua atividade, a
temperaturas diferentes consoante as espécies. Por exemplo, para as
tartarugas marinhas e de água doce, a elevadas temperaturas a aromatase
tem um pico de atividade, e a baixas temperaturas encontra-se a baixas
concentrações e, por isso, com baixa atividade. Os diferentes níveis de
atividade da aromatase condicionam o desenvolvimento das estruturas das gônadas indiferenciadas em ovários ou testículos. Passado este período
sensível à temperatura e determinado a diferenciação da ggônada,
alterações na temperatura aparentemente não têm qualquer efeito. Estudos
mais recentes sugerem que não só a temperatura mas também outros
parâmetros como os níveis de prostaglandina podem afetar a atividade
da aromatase.
Anfíbios
Em anfíbios tal como nos répteis a diferenciação das
gônadas é termossensível, e este mecanismo atua combinado com uma
determinação genotípica sexual, quer através de machos heterogaméticos,
fêmeas heterogaméticas ou poligénicas, resultando num fenômeno designado
por reversão sexual (do inglês sex reversal), onde os efeitos
da temperatura poderão ser antagónicos, dando origem a indivíduos
genotipicamente e fenotipicamente discordantes em relação ao sexo (isto
é, podem ser de um sexo ao nível do genótipo, mas do sexo oposto
fenotipicamente).
Os cromossomos sexuais descritos nos anfíbios podem ser
do tipo XY/XX e WZ/ZZ. O efeito da temperatura na determinação sexual
embora ainda não totalmente descrito parece não estar associado à
atividade da aromatase tal como acontece nos répteis.
Peixes
A diversidade de espécies de peixes é equivalente à diversidade de potenciais mecanismos de
determinação sexual. A investigação neste grupo é dirigida a apenas algumas espécies modelo muito utilizadas em
laboratório. Entre os mecanismos já observados podem-se referir 1. Existência de hermafroditas verdadeiros, 2.
Determinação sexual dependente da temperatura ambiente e 3. Existência de cromossomos sexuais (XY/XX e
ZW/ZZ).
O Xiphophorus maculatus possui no seu genoma, possivelmente, três cromossomas sexuais
distintos, X, Y e W, o que permite um leque de combinações maior no seio da populações do que nos tradicionais
sistemas com apenas dois cromossomos sexuais. Assim, WX, WY e XX são fêmeas e XY e YY são machos. Até à data não
foi descrito qualquer gene determinante para o sexo, no entanto a presença do cromossoma W coincide sempre com
um fenótipo feminino, tornando-o num bom candidato à investigação. Noutras espécies, no entanto, já se
descobriram genes importantes na determinação sexual.
Aves
Nas aves o sexo é determinado pelos cromossomas sexuais Z e W, sendo as fêmeas o sexo
heterogamético (ZW). O gene DMRT1 presente no cromossoma Z das galinhas é necessário ao desenvolvimento
dos testículos, que ocorre em machos que possuem duas cópias do gene. Para o desenvolvimento das fêmeas, os
genes FET1 e ASW são fundamentais. Nas aves, tais como nos mamíferos, as gónadas permanecem
indiferenciadas até cerca do quarto dia do desenvolvimento embrionário, a partir daí a atividade hormonal (do
estrogénio, por exemplo) é determinante no desenvolvimento das gónadas. O estrogénio é crucial no inicio da
diferenciação e embriões machos do ponto de vista genético podem ser convertidos em fêmeas se se injetar
estrogénio no ovo durante determinado estádio do desenvolvimento em que o embrião é sensível a esta hormona.
Mamíferos
Em animais placentários a presença do cromossoma Y determina o sexo. Normalmente as células
femininas contêm dois cromossomas X e as células masculinas um X e um Y.
Os marsupiais possuem um cromossoma Y o mais pequeno entre os mamíferos, mas que ainda retém a
capacidade de converter as gónadas indiferenciadas em testículos. Esta conversão dos testículos, no entanto, não
controla o resto da diferenciação sexual. A formação de glândulas mamárias e do escroto ocorre antes da
diferenciação das gónadas e é independente das hormonas das gónadas, estando sob controlo de genes localizados
no cromossoma X. Animais XXY possuem testículos mas com uma bolsa com glândulas mamárias em vez do escroto,
enquanto animais XO não têm testículos mas sim um escroto vazio em vez da bolsa.
Em humanos a determinação inicial do sexo ocorre na fecundação, com a presença dos cromossomas
sexuais transmitidos pelos gâmetas parentais. A presença de dois cromossomas X leva a um fenótipo feminino
enquanto que a presença de um cromossoma Y leva a um fenótipo masculino. No entanto, existem casos de indivíduos
com fenótipos femininos mas com genótipos XY e com fenótipos masculinos e genótipos XX, significando que a
presença dos cromossomos sexuais não é isoladamente determinante para o sexo do indivíduo.
Os órgãos sexuais diferenciam-se em média a partir da sexta sétima semanas do desenvolvimento
embrionário, até a essa alturas as gônadas são indiferenciadas. O gene SRY no cromossomo Y codifica o
fator de transcrição que ativa o mecanismo de diferenciação dos testículos. O gene leva à produção da proteína
TDF (fator de crescimento dos testículos, do inglês testis development fator) que promove o
desenvolvimento do tubérculo genital em testículos. Após a formação dos testículos inicia-se a produção de
testosterona que leva à diferenciação dos restantes órgãos do aparelho reprodutor masculino. Nas mulheres,
portadoras de dois cromossomos XX não existe o gene SRY o desenvolvimento dos ovários é ativado por
outras proteínas. Os ovários completamente desenvolvidos produzem estrogênios que despoletam o desenvolvimento
do útero, dos ovidutos e outros órgãos do sistema reprodutor feminino.
Referências
- 1 Hake, L. e O’Connor, C (2008) Genetic Mechanisms of sex determination. Nature Education 1(1)
- 2 Manolakou, P; Lavranos, G. e Angelopoulou, R. (2006). Molecular patterns of sex determination in the animal kingdom: a comparative study of the biology of reproduction. Reproductive Biology and Endocrinology 4:59
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