sábado, 29 de junho de 2013

Nova espécie de crocodilo pré-histórico é identificada em São Paulo

Animal pode ter ocupado nicho ecológico de grandes predadores há mais de 80 milhões de anos
RODRIGO DE OLIVEIRA ANDRADE | Edição Online 9:59 22 de junho de 2013
© RODOLFO NOGUEIRA
Gondwanasuchus scabrosus atacando indivíduo jovem do gênero Caipirasuchus, espécie de crocodiliforme da família Sphagesauridae (animais onívoros e herbívoros)

Há muito se sabe que a Bacia Bauru – depósito de rochas formadas por sedimentos localizado entre os estados de São Paulo, Minas Gerais, Goiás, Paraná, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul – foi habitada, há milhões de anos, por uma abundante fauna de crocodiliformes, um grupo de répteis em que estão inclusos os crocodilos, jacarés e seus parentes pré-históricos extintos. Entre as famílias que por lá viveram está a Baurusuchidae, que, na região, englobava outras seis espécies de crocodiliformes exclusivamente terrestres e com grande capacidade de deslocamento, crânio alto e comprimido lateralmente e longos dentes serrilhados. Agora, em um artigo publicado na versão on-line da revista Cretaceous Research, um grupo de pesquisadores das universidades federais do Rio de Janeiro e do Triângulo Mineiro, em Minas Gerais, identificaram mais um membro dessa antiga família.

Com base em um crânio e mandíbula de aproximadamente 80 milhões de anos parcialmente completos e muito bem preservados, encontrados em camadas de rochas da Formação Adamantina, sítio paleontológico da fazenda Buriti, em General Salgado (SP), o grupo pôde descrever como era e vivia esse parente recém-descoberto dos crocodilos e jacarés que conhecemos hoje. De acordo com o artigo, o Gondwanasuchus scabrosus, como ficou conhecido, foi um carnívoro terrestre de porte médio – 1,30 metros de comprimento –, com o crânio bastante comprimido lateralmente e uma dentição única com profundos sulcos que corriam da base até a ponta, o que pode ter lhes garantido maior resistência a quebras durante a alimentação e os ataques.
© MARINHO, T. S. ET AL.
O fóssil de Gondwanasuchus scabrosus representado por um crânio parcialmente completo encontrado em associação próxima a um grande indivíduo de Baurusuchus salgadoensis, um crocodiliforme também da família dos baurussuquídeos
Fóssil de G. scabrosus representado por crânio parcialmente completo

“Isso também permitiu ao Gondwanasuchus scabrosus ocupar nichos ecológicos de alguns dinossauros carnívoros de pequeno porte do sudeste brasileiro, devido ao tamanho reduzido e pelo fato de esses animais terem sido exímios caçadores”, explica o biólogo Thiago da Silva Marinho, da Universidade Federal do Triângulo Mineiro e autor principal do estudo. Além disso, completa, “os dinossauros carnívoros eram escassos na região. Isso pode ter contribuído para a proliferação desses crocodiliformes terrestres”.
Ele destaca que essa espécie de crocodilo é bastante interessante por ser o mais distinto de uma família de crocodiliformes terrestres extinta (Baurusuchidae), muito comum em rochas do Cretáceo no estado de São Paulo. Segundo o pesquisador, o G. scabrosus se diferencia das outras espécies de sua família também por possuir uma visão binocular tridimensional muito bem desenvolvida, em razão da posição de suas órbitas oculares, que, diferentemente do que foi observado na maioria das outras espécies de crocodiliformes, eram voltadas anteriormente. “É algo incomum para crocodiliformes”, ressalta. “Sua visão é semelhante à inferida para o Tyrannosaurus rex, um dos maiores predadores de que já se ouviu falar”, diz.

De acordo com o biólogo, a identificação dessa nova espécie contribui para a compreensão da diversidade ecológica e morfológica dos crocodiliformes na América do Sul no contexto da Gondwana, o supercontinente formado há cerca de 200 milhões de anos e que agrupava a América do Sul, África, Madagascar, Índia, Oceania e a Antártida no período Cretáceo, que vai de 145 a 65 milhões de anos atrás. Isso porque a própria Bacia Bauru se formou a partir do rompimento precoce desse continente, junto com a abertura do Oceano Atlântico Sul.

Justamente por isso, o nome genérico “Gondwanasuchus’” faz alusão à distribuição da família dos Baurussuquídeos, restrita às regiões do antigo supercontinente Gondwana, enquanto “suchus” significa “crocodilo”. O pesquisador explica que o nome do epíteto específico, scabrosus, é uma palavra em Latim que significa “tinhoso”, um apelido dado pelos autores que descreveram a espécie devido à aparência agressiva observada no crânio do animal. O estudo teve apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj), Coordenação de Aperfeiçoamento ao Pessoal de Nível Superior (Capes) e Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).

Artigo científico

MARINHO, T. S. et al. Gondwanasuchus scabrosus gen. et sp. nov., a new terrestrial predatory crocodyliform (Mesoeucrocodylia: Baurusuchidae) from the Late Cretaceous Bauru Basin of Brazil. Cretaceous Research. 2013 (on-line).

domingo, 23 de junho de 2013

Gás de xisto: revolução ou insanidade?

Jean Remy Guimarães trata, na coluna de junho, da nova fonte terrestre de gás natural que faz sucesso nos Estados Unidos e começa a ser cobiçada no Brasil. O biólogo aponta dados que mostram o perigo dessa fonte de energia para o meio ambiente e a saúde humana. 
 
Por: Jean Remy Davée Guimarães
Publicado em 21/06/2013 | Atualizado em 21/06/2013
Gás de xisto: revolução ou insanidade?
Planta de produção de gás de xisto em Jackson Township, na Pensilvânia (EUA). O gás, apesar dos efeitos nocivos, tem sido apresentado como a nova fronteira energética e salvador da economia norte-americana. (foto: wcn247/ Flickr – CC BY-NC 2.0) 

 
Como comentado na coluna anterior, está em curso no Brasil uma ofensiva midiática para pavimentar o caminho dessa nova fonte terrestre de gás natural, apresentada como a nova fronteira energética, a cavalaria que salvou a tempo a economia norte-americana, reduzindo o custo da energia, diminuindo a dependência externa do país, reduzindo o apoio a regimes que apoiam o terrorismo. Em suma, um combustível que, além de novo, seria também politicamente correto.

Parece bom demais para ser verdade. Como descrito mês passado, extrair esse gás exige a injeção de milhões de galões de água em cada poço. O gasto de água já é em si preocupante, mas pior é o fato de a água injetada conter centenas de produtos químicos, alguns de composição protegida pelo manto do segredo industrial, que visam facilitar o processo: dispersantes, agentes antimicrobianos, anticorrosivos, géis diversos e muitos etc. etc.

A indústria de gás norte-americana obteve da corte suprema a sua isenção do Safe Drinking Water Act em manobras iniciadas na administração Bush, em 2005. Isto liberou a indústria de revelar a composição de seus fluidos de perfuração e desobrigou a administração federal de monitorar os impactos ambientais da atividade.

As principais críticas de moradores, cientistas e ambientalistas a essa atividade é a contaminação da água subterrânea, traduzida na presença de lama, metais pesados e hidrocarbonetos na água dos poços e córregos locais e, portanto, nas torneiras. Em algumas casas próximas a áreas de perfuração nos EUA, a água da torneira contém tanto metano que é inflamável, como documentado no imperdível filme Gasland, de Josh Fox.
Gasland
Fotograma do filme 'Gasland', de 2010. O documentário norte-americano, dirigido por Josh Fox, mostra comunidades nos Estados Unidos impactadas pela extração de gás de xisto. A contaminação da água por metano – que chega a torná-la inflamável – é um dos principais problemas abordados.


Emissões e tremores

Em maio de 2010, o Conselho dos Presidentes de Sociedades Científicas, entidade que congrega cerca de 1,4 milhão de cientistas, alertava em carta ao presidente Obama que a política nacional de incentivo ao gás de xisto seria temerária, na falta de maior embasamento científico, e que a atividade poderia ter um impacto no aquecimento global bem maior do que anteriormente estimado.
De fato, em fins de 2010, a Agência de Proteção Ambiental Norte-Americana, em seu relatório de atualização sobre as emissões de gases de efeito estufa da indústria de óleo e gás local concluía que a extração de gás de xisto emite mais metano que aquela de gás convencional.

No ano seguinte, um estudo publicado na Climatic Change Letters, previsível e vigorosamente contestado pela indústria, aponta que a produção de eletricidade com gás de xisto emite tanto ou mais gases de efeito estufa ao longo de seu ciclo produtivo quanto àquela baseada em gás ou carvão.
Estudo aponta que a produção de eletricidade com gás de xisto emite tanto ou mais gases de efeito estufa ao longo de seu ciclo produtivo quanto àquela baseada em gás ou carvão.
 
Ai, essa doeu! Carvão, o combustível mais sujo que a humanidade já usou? Vai ver, então, que chamar isso de revolução energética é, no fundo, uma homenagem à revolução industrial, em que a humanidade descobriu o custo ambiental do desenvolvimento, em cidades sufocadas pela fuligem.
Pesam ainda sobre a atividade a suspeita de ter culpa no cartório no aumento significativo na frequência de tremores de intensidade igual ou superior a 3 na escala Richter na região central do continente norte-americano. O serviço geológico dos Estados Unidos, coletando dados desde 2001, concluiu que a atividade sísmica na região, em 2011, seria seis vezes superior à média do século 20.
Um pesquisador do Centro para Pesquisa e Informação sobre Terremotos dos EUA, da Universidade de Memphis, opina que a injeção de água em falhas geológicas tende a causar sismos devido ao escorregamento das mesmas. Há pelo menos um caso de sismo inequivocamente relacionado à extração de gás de xisto, no noroeste da Inglaterra, em 2011. Ele levou a empresa Cuadrilla Resources a suspender todas as suas operações. Quadrilha Recursos? Não podia mesmo dar certo.
Protestos contra gás de xisto
Manifestantes protestam contra método usado para extração do gás de xisto, em que rochas são quebradas por um líquido pressurizado para a obtenção do gás. (foto: JustinWoolford/ Flickr – CC BY-NC-SA 2.0)

Ofensa ao bom senso

A batalha de relatórios, publicações, pressões e desmentidos segue a pleno vapor. Já vimos esse filme, as empresas e seu pesado lobby juram que a presença de hidrocarbonetos na água que antes era potável não tem nada a ver com o início da extração de gás de xisto, mas se furtam a fornecer uma hipótese alternativa para explicar o fato de a água de torneira passar a ter odor repugnante, aspecto idem e gosto… deixa pra lá.

Apesar desse retrospecto para lá de suspeito, o Brasil está tratando o gás de xisto com muito carinho, partindo talvez da premissa de que o que é bom para os Estados Unidos é bom para o Brasil. Resta saber se ele é mesmo bom para os Estados Unidos e, em caso positivo, para quem nos Estados Unidos.

Apesar desse retrospecto para lá de suspeito, o Brasil está tratando o gás de xisto com muito carinho, partindo talvez da premissa de que o que é bom para os Estados Unidos é bom para o Brasil
Para os moradores das vizinhanças das áreas de extração, certamente não é, condenados que estão a beber água fornecida pelas empresas de gás. Certo, e vacas e galinhas, beberão o quê? O press release não esclarece.
Apesar disto, os felizardos que arrematarem lotes nos leilões de blocos terrestres para exploração no Brasil deverão, por cláusula contratual, dimensionar as reservas de gás de xisto nos mesmos.
Já disse aqui mês passado e repito hoje: injetar um coquetel químico de composição não revelada em camadas de solo que contêm reservas geológicas de água potável acumuladas ao longo de milhões de anos para gerar mais gases de efeito estufa por uns míseros 20 anos é uma ofensa ao bom senso, à sustentabilidade, à racionalidade e à razoabilidade. Lembra vagamente do princípio de precaução, trazido à tona na saudosa Rio 92? Pois pode esquecer de novo, ele foi morto e muito bem enterrado.

Jean Remy Davée GuimarãesInstituto de Biofísica Carlos Chagas Filho
Universidade Federal do Rio de Janeiro

P.S: A maioria das informações deste texto foi obtida na Wikipedia. Queda de padrão de qualidade da coluna? Pura provocação? Acertou quem acha que é provocação. A ideia é mostrar que os nós dessa questão estão claramente expostos em uma base de acesso irrestrito, sim, que por isso mesmo não está imune à infiltração por interesses corporativos. Portanto, se ainda assim a Wikipedia diz que algo pode ser incerto e perigoso, é porque deve ser mesmo.

No Google a busca por 'shale gas and economy' devolve quase 30 milhões de resultados e a por 'shale gas and US economy', 28 milhões. Interessante. Já a busca por 'shale gas and water contamination' gera apenas 566.000 resultados e, por 'shale gas and groundwater contamination', só 194.000. Isto talvez dê uma medida da importância relativa da economia e das considerações ambientais.

quarta-feira, 12 de junho de 2013

O desastre do Mar de Aral

12/06/2013 17:29

Por: Marcus V. Cabral
 
O encolhimento do mar de Aral (que apenas trata-se de um lago gigante) é resultado de um projeto de transferência de água em grande escala em uma área da antiga União Soviética onde o clima é o mais seco da Ásia Central. Desde 1960, enormes quantidades de água de irrigação foram desviadas do mar de Aral, no interior, e dos dois rios que o alimentam para criar uma das maiores áreas irrigadas do mundo para plantações de arroz e algodão. O canal de irrigação, que é o mais extenso do planeta, alonga-se por mais de 1.300 km.

Esse projeto de desvio de água, aliado às secas e às altas taxas de evaporação em virtude do clima quente e seco da região, causou um desastre ecológico, econômico e de saúde. Desde 1960, a salinidade do mar triplicou, sua área superficial diminuiu em 58% e ele perdeu 83% de seu volume de água. A retirada da água para a agricultura reduziu a meras gotas os rios de abastecimento do mar.
                                                                                                                          Mar-de-Aral
O mar virou sertão: imagem do Mar de Aral em seus dias de maior seca (Foto: Aral Sea Foundation)
Cerca de 85% das áreas úmidas da região foram eliminadas e aproximadamente metade das espécies locais de aves e mamíferos desapareceram. Além disso, uma grande área, que antes era o fundo de um lago, foi transformada em um deserto feito pelo homem, coberto de sal branco e brilhante. Presume-se que o aumento na concentração de sal tenha provocado a extinção de 20 das 24 espécies de peixes nativas da região. Isso devastou a indústria de pesca local, que já chegou a fornecer trabalho a mais de 60 mil pessoas. Os vilarejos e barcos de pescadores que ficavam ao longo da costa do lago agora estão abandonados no meio de um deserto de sal.

O vento arrasta o pó salgado incrustado no leito agora exposto do lago e o leva para os campos a uma distância de até 300 km. Conforme o sal se espalha, polui a água e mata animais selvagens, plantações e outros vegetais. O pó do mar de Aral depositado nas geleiras do Himalaia está fazendo que elas derretam a uma velocidade mais rápida que o normal - um exemplo de conexões e consequências não intencionais.
Para fazer crescer a produção, os agricultores aumentaram o uso de herbicidas, inseticidas, fertilizantes e água de irrigação em algumas plantações. Muitos desses produtos químicos infiltraram-se na terra e se acumularam em níveis perigosos na água subterrânea - fonte de boa parte da água potável da região.

A diminuição do mar de Aral alterou o clima da região. O grande mar de antes atuava como um isolador térmico que moderava o calor do verão e o extremo frio do inverno. Agora há menos chuva, os verões são mais quentes e secos, os invernos são mais frios e a temporada de cultivo é mais curta. A combinação de tal mudança climática e da grave salinização reduziu a produção de grãos de 20% a 50% em quase um terço das terras de cultivo da região.
Por fim, muitas das 58 milhões de pessoas que vivem na área da bacia vertente do mar de Aral passaram a ter cada vez mais problemas de saúde em virtude da combinação de poeira tóxica, sal e água contaminada.

O mar de Aral pode ser salvo e os graves problemas ecológicos e de saúde podem ser revertidos? Desde 1999 as Nações Unidas e o Banco Mundial gastaram cerca de US$ 600 milhões para purificar a água potável e modernizar os sistemas de irrigação e drenagem, o que melhora a eficiência de irrigação e enxagua o sal das terras de cultivo. Além disso, algumas áreas úmidas e lagos artificiais foram construídos para ajudar a restaurar viveiros de peixe, animais selvagens e vegetação aquática.
Mar-de-Aral-pescador
Esperança renovada: pescador do Mar do Aral do Norte posa em agosto de 2005 (Foto: Nick Micklin - National Geographic)
Os cinco países que cercam o lago e os dois rios que o abastecem trabalharam para melhorar a eficiência da irrigação e substituir parcialmente culturas como de arroz e algodão, que exigem muita água, por culturas que exigem menos água. Como resultado, o volume total anual de água na bacia do mar de Aral estabilizou-se. Entretanto, especialistas preveem que a maior parte do mar de Aral ao sul continuará a encolher.
                                                                                                                             
MILLER JR., G.T. Ciência Ambiental. São Paulo: Cengage Learning, 2011.



Cianobactérias: aliadas contra o arsênio

Cianobactérias encontradas em lagos podem ser poderosas armas para remover elemento tóxico à saúde humana de ambientes aquáticos. Experimentos revelam potencial de atuação de duas espécies em amostras contaminadas. 
 
Por: Célio Yano
Publicado em 10/06/2013 | Atualizado em 10/06/2013
Aliadas contra o arsênio
Lago Dom Helvécio, localizado no Parque Estadual do Rio Doce (MG), onde foram coletadas cianobactérias da espécie ‘M. novacekii’ para estudo feito na UFMG. (foto: Fernando Marino/ Wikimedia Commons) 
 
Capazes de absorver arsênio em ambiente aquático, duas espécies de cianobactérias podem se tornar aliadas do homem e ajudar a limpar rios e lagos contaminados com a substância tóxica. O potencial de Microcystis novacekii e Synechococcus nidulans foi descoberto em testes feitos por pesquisadores do Laboratório de Limnologia, Ecotoxicologia e Ecologia Aquática (Limnea), da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).

Nos experimentos, soluções com diferentes concentrações de arsênio foram adicionadas a culturas de cianobactérias. As misturas foram então expostas a luz e agitação constante para permitir o crescimento dos microrganismos.

Após nove dias, M. novacekii removeu da água 21% de arsenito (forma de apresentação mais tóxica da substância), em uma solução de 15mg/L do metaloide. Já S. nidulans absorveu 21% de arseniato (forma da substância mais comum no ambiente, encontrada sobretudo em áreas de mineração), em uma concentração de 0,05 mg/L, quatro dias depois da exposição.
‘Microcystis novacekii’
‘Microcystis novacekii’ em imagem de microscopia óptica com aumento de 1.000 vezes. (foto: Fernanda Aires Guedes/ Limnea)
O arsênio é considerado elemento não essencial, ou seja, não tem função fisiológica conhecida em organismos vivos. Devido à semelhança química com o fósforo, pode substituí-lo em determinadas moléculas, modificando sua estrutura e função. Com base em estudos epidemiológicos, a Agência Internacional de Pesquisa sobre Câncer o classifica como agente carcinogênico para humanos.
Em ecossistemas aquáticos, o arsênio pode contaminar peixes e moluscos, provocando a morte das espécies mais sensíveis. Devido à bioacumulação, a substância torna-se disponível ainda nas diferentes rotas da cadeia alimentar, passando para níveis tróficos superiores.

A principal fonte de exposição humana ao arsênio, considerado agente carcinogênico, é a ingestão de água contaminada
 
Análises feitas no fim do ano passado pela Proteste Associação de Consumidores revelaram a presença de arsênio em níveis alarmantes em peixes frescos vendidos em São Paulo. De acordo com a instituição, 72,5% das amostras testadas apresentavam a substância em taxa superior à estabelecida por lei.

A principal fonte de exposição humana à substância, no entanto, ainda é a ingestão de água contaminada. Estudos toxicológicos mostram que há risco à saúde quando a concentração de arsênio é superior a 10 µg (microgramas) por litro de água.

Escolha

Cianobactérias são organismos encontrados em solos úmidos, águas marinhas e continentais e em associação com outros organismos, como líquens e plantas aquáticas. Para os testes, os pesquisadores da UFMG – que participam do programa Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Recursos Minerais, Água e Biodiversidade – coletaram bactérias da espécie S. nidulans em área de mineração do município de Nova Lima (MG). M. novacekii foi retirada do lago Dom Helvécio, no Parque Estadual do Rio Doce (MG).
Cada espécie foi escolhida por um motivo, segundo o ecólogo Francisco Barbosa, coordenador do Limnea. Enquanto S. nidulans é mais fácil de estudar em laboratório, por crescer e se adaptar a diferentes condições de cultivo rapidamente, M. novacekii raramente é citada na literatura em trabalhos de ficologia. “Isso nos instigou a escolhê-lo como organismo-modelo de novas pesquisas”, diz Barbosa.

Os resultados confirmaram a hipótese de que as cianobactérias podem ser cultivadas em laboratório com o propósito de descontaminar corpos d’água
Os resultados confirmaram a hipótese de que as cianobactérias podem ser cultivadas em laboratório com o propósito de descontaminar corpos d’água. Mas, além disso, os microrganismos podem, segundo o ecólogo da UFMG, servir como bioindicadores.

“Verificamos em nossos estudos que o estado de oxidação trivalente do arsênio é duas ordens de grandeza mais tóxico que o pentavalente”, afirma. “Portanto, avaliar a contaminação ambiental por arsênio total, como é previsto pela legislação sanitária brasileira, pode não ser suficiente para estimar as concentrações seguras do metaloide para a saúde humana e para o meio ambiente.”
“Por causa da capacidade de reconhecer essas formas químicas diferentes e de reagir a elas, pretendemos testar futuramente as cianobactérias como organismo modelo de bioindicação.” No momento são feitos estudos para desvendar o comportamento do arsênio assimilado pela cianobactéria. “Nossa hipótese é que durante o processo de bioacumulação do metaloide pelo microrganismo ocorrem mudanças na substância e possivelmente formas mais tóxicas se transformam em menos tóxicas”, diz Barbosa.
‘Synechococcus nidulans’
‘Synechococcus nidulans’ em imagem de microscopia óptica com aumento de 1.000 vezes. (foto: Maione W. Franco/ Limnea)
Há cinco anos o Limnea desenvolve testes com o uso de cianobactérias para remoção de poluentes. Grande parte das pesquisas foi feita com M. novacekii, que já se mostrou viável como agente para biorremoção de metais (chumbo e cádmio) e semimetais (arsênio), e como agente de biodegradação de pesticidas, herbicidas e até de hormônios. Estes últimos vão parar em corpos d’água por estarem presentes em produtos como anticoncepcionais.

Célio YanoCiência Hoje On-line/ PR

segunda-feira, 10 de junho de 2013

DOCUMENTÁRIO

BBC - Pacífico Sul

Título Original: BBC - South Pacific
Gênero: Natureza | Ciências
Tempo de Duração: 59 min
Ano de Lançamento: 2009
Qualidade: DVDSCR
Áudio: Inglês
Legenda: Português
Tamanho: ~ 800 Mb
 
A fauna extraordinária, a cultura, a história deste imenso oceano e suas ilhas são reveladas em detalhes impressionantes nesta aclamada série da BBC.
Com os seus recifes de corais, lagoas de azul turquesa e atóis, o Pacífico Sul é um paraíso arquétipo.
A partir das margens do
Hawaii
até a Ilha de Páscoa, há milhares de pequenas ilhas remotas deste oceano que detém algumas das surpresas mais bizarras e intrigantes da Terra.
As descobertas desta série são surpreendentes: vulcões em erupção submarina, recifes tropicais, captura de tubarões tigre filhotes, caranguejos gigantes abrindo cocos, etc.
Revela também percevejos com anticongelante em suas veias, um papagaio noturno com uma chamada de acasalamento estranha e o macaco de cauda réptil.
Um oceano, vinte mil ilhas; um quarto da água do planeta.
O Pacífico Sul parece um paraíso, mas não é bem assim.
Apesar das impressionantes belezas naturais, é também um mundo de violência, onde cada espécie precisa lutar ferozmente por sua sobrevivência.
Tempestades aterradoras, vulcões submersos, tsunamis, tudo isto é um lembrete de que a vida não é nada fácil, as aparências enganam; tudo está tranquilo e de repente vem uma catástrofe.
Veja aqui alguns dos segredos do Pacífico Sul.
Com incríveis espetáculos naturais, filmes dramáticos e histórias fascinantes, “South Pacific” irá mudar a forma como vemos este oceano para sempre.





domingo, 9 de junho de 2013

Caminho inverso

Estudo indica que árvores da serra da Mantiqueira captam água pelas folhas e a transportam para o solo 

IGOR ZOLNERKEVIC | Edição 208 - Junho de 2013
© RAFAEL OLIVEIRA / UNICAMP
Entre nuvens: neblina se adensa sobre trecho de mata atlântica na serra da Mantiqueira, interior de São Paulo
Entre nuvens: neblina se adensa sobre trecho
de mata atlântica na serra da Mantiqueira,
interior de São Paulo

De Campos do Jordão

Em uma expedição no início de maio à serra da Mantiqueira, o biólogo Paulo Bittencourt parou diante de um córrego de água fria e cristalina numa estrada de terra entre fazendas de criação de ovelhas próximas ao Parque Estadual de Campos do Jordão. “Pode beber que não tem como estar poluída. Essa água vem lá de cima”, disse, apontando para o local onde nasce o riacho, a cerca de 2 mil metros de altitude, em um morro coberto por uma mata de árvores baixas com folhas pequenas. “São riachos assim que descem a serra para alimentar e manter estáveis os rios maiores lá embaixo”, explicou. Paulo faz mestrado na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) sob a orientação do ecólogo Rafael Oliveira, que trabalha para quantificar a contribuição desse tipo pouco conhecido de mata atlântica para o abastecimento de água do Vale do Paraíba.

“Há uma importante relação entre essas matas e as nascentes da serra da Mantiqueira”, afirma Oliveira. Sem essa vegetação, a chamada floresta tropical montana nebular, a neblina que sobe a serra seguiria continente adentro, carregando a umidade que obtém a partir da evaporação dos rios e a transpiração das plantas no vale. As pequenas matas nebulares nas encostas montanhosas retêm umidade quando o vapor da neblina se condensa em gotas sobre suas folhas e escorre para o solo. Estudos em matas nebulares tropicais da Costa Rica sugerem que a captação de água da neblina pelas árvores pode contribuir com até 30% do volume dos rios de uma região.

Uma porção menor da água da neblina retorna ao solo de um modo surpreendente: por dentro das árvores. Em artigo publicado on-line em março na New Phytologist – será a capa da edição de julho –, a equipe de Oliveira mostra que, quando o solo está seco e a neblina aparece, as folhas da casca-de-anta – Drimys brasiliensis, a árvore mais abundante nessas matas – são capazes de absorver a água que se deposita em sua superfície.
Os pesquisadores observaram que o sistema vascular da árvore conduz essa água até suas raízes e libera parte dela no solo. Segundo Oliveira, é a primeira vez que se observa essa forma de transporte de água em uma árvore tropical. “Essa constatação muda como enxergamos a interação entre as árvores e a atmosfera”, afirma.

Até pouco tempo atrás, achava-se que era impossível as árvores absorverem água pelas folhas. Afinal, a superfície das folhas é coberta por uma fina camada de cera impermeável, a cutícula, que evita a perda de água para o ambiente. Mas, nos últimos tempos, segundo o botânico Gregory Goldsmith, da Universidade da Califórnia em Berkeley, foram identificadas 70 espécies de plantas com folhas capazes de absorver água. A botânica Aline Lima confirmou a absorção de água pelas folhas em seu mestrado, orientado por Oliveira e parte do projeto Biota Gradiente Funcional, financiado pela FAPESP. Ela pingou gotas de água contendo cristais fluorescentes sobre folhas de casca-de-anta em uma estufa, para depois observar ao microscópio o caminho percorrido pela água. O trabalho comprovou que a água atravessa a cutícula e penetra na folha. Segundo Oliveira, estudos recentes feitos na Alemanha mostram que os cristais de cera da cutícula são dinâmicos. Numa atmosfera muito úmida eles se rearranjam e deixam a folha permeável.

Na contramão

Esses resultados contrariam o que dizem os livros-texto de biologia. Esses livros ensinam que o fluxo de água nas plantas segue um sentido único. Segundo a visão clássica, as folhas estão sempre transpirando, perdendo água para o ar por meio dos estômatos, orifícios na superfície inferior das folhas que abrem e fecham segundo a disponibilidade de luz e água. Como alguém que sorve líquido por um canudo, a perda de água por transpiração exerce uma força de sucção no interior dos vasos condutores fazendo a água subir até as folhas enquanto mais água é retirada do solo pelas raízes. “É o que a maioria das plantas faz o tempo todo”, explica Oliveira. Estudos sugerem que até 50% da umidade que circula na atmosfera em certas regiões venha da transpiração de suas florestas.

Imagem de microscopia mostra que a água atravessa a cutícula...
Imagem de microscopia mostra que a água
atravessa a cutícula…

Nos últimos anos, entretanto, alguns pesquisadores começaram a observar que esse fluxo pode ser invertido em situações em que o ar está mais úmido do que a terra. O biólogo Todd Dawson, que orientou Oliveira durante seu doutorado na Universidade da Califórnia em Berkeley, descreveu em 2004 como as sequoias transportam água na contramão.

As florestas de sequoias, árvores com até 115 metros de altura, ocorrem em regiões da Califórnia onde cai uma quantidade de chuva comparável à do sertão nordestino. O que salva essas árvores da seca é a neblina vinda do mar, que satura o ar de vapor-d’água. Nessa condição, as folhas das sequoias absorvem água e param de transpirar, cessando o fluxo de baixo para cima. Ao mesmo tempo, a secura no interior do tronco cria uma força de sucção capaz de puxar a água da atmosfera para baixo, até a árvore se reidratar.
Tentando identificar um fenômeno semelhante em árvores brasileiras, Oliveira procurou por florestas nebulares em todo o país até encontrar as matas da serra da Mantiqueira, onde nascem vários rios, embora seja uma região com secas frequentes. Nas matas do Parque Estadual de Campos do Jordão, onde  trabalha desde 2009, chove um pouco mais do que no cerrado. O clima é seco de junho a agosto, embora quase sempre haja neblina no começo e no fim do dia.

Para entender como a casca-de-anta sobrevive nessas condições, Cleiton Eller, aluno de doutorado de Oliveira, cultivou essas árvores em uma estufa na Unicamp em três condições: recebendo água pela terra, hidratadas por meio de uma neblina artificial borrifada sobre as folhas ou sem irrigação. As plantas tratadas só com neblina sobreviveram por dois meses.

© ANA PAULA CAMPOS
... e penetra na folha quando a atmosfera está saturada
… e penetra na folha quando a atmosfera está saturada.

A fim de confirmar que a água absorvida pelas folhas podia ser transportada até a terra, os pesquisadores realizaram um experimento complementar. Tomando cuidado para não molhar o solo, eles borrifaram as folhas da casca-de-anta com água pesada. A água pesada contém átomos de um tipo de hidrogênio mais pesado que o normal, o deutério, que podem ser detectados por um espectrômetro de massa. Segundo o raciocínio desse teste, o deutério encontrado posteriormente na terra serve como prova de que a água teria sido absorvida pelas folhas, transportada até as raízes e injetada no solo. Pelos números obtidos no experimento, Oliveira estima que, se uma árvore transpira 10 litros de água por dia, ela é capaz de transportar em seu interior, no mesmo dia, 2,5 litros de água da atmosfera para o solo.
“Esse é o nosso resultado mais impressionante”, afirma Oliveira, que encontrou apenas outro registro na literatura científica de água absorvida pelas folhas chegando ao solo. Em 1969, a botânica Fusa Sudzuki, da Universidade do Chile, demonstrou o mesmo fenômeno em um experimento com o tamarugo, árvore típica do deserto do Atacama. “O trabalho dela é bonito, mas seus resultados foram rejeitados na época”, conta Oliveira.

Possível e relevante

“O estudo do grupo da Unicamp mostra que o fluxo de água da atmosfera para o solo não só é fisicamente possível, mas fisiologicamente relevante”, observa a botânica Lúcia Dillenburg, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, que publicou evidências de que as araucárias também absorvem água pelas folhas.
“Esse é um trabalho muito original”, afirma o botânico Marcos Buckeridge, da Universidade de São Paulo. Ele, no entanto, comenta que nem toda a água com deutério detectada no solo corresponde à água captada pelas folhas. Segundo Buckeridge, a planta pode ter usado a água que captou pelas folhas para produzir compostos orgânicos, como os açúcares, normalmente liberados pelas raízes. “Em questão de segundos, os açúcares trocam deutério com a água do solo”, explica. Na sua opinião, um modo de desfazer a dúvida seria repetir o experimento usando água pesada contendo oxigênio-18, que interage menos com outras substâncias do que o deutério. “Seria um experimento mais caro e complicado”, diz.

© RAFAEL OLIVEIRA / UNICAMP
Oliveira concorda que há incerteza sobre a quantidade de água que as raízes liberam para o solo, mas ressalta que seus experimentos comprovaram o fluxo inverso da água das folhas até as raízes. “Como a maioria das plantas não tem um mecanismo que previna a liberação de água das raízes para o solo e como há um gradiente de potencial hídrico grande o suficiente para permitir o movimento de água das folhas para as raízes”, diz Oliveira, “o mais provável é que a água tenha saído das raízes para o solo”. Nos testes feitos na serra da Mantiqueira, a equipe de Oliveira traçou o fluxo de água nas árvores com sensores conectados por fios a um equipamento que armazena as informações. Agora o grupo se prepara para iniciar o monitoramento de matas nebulares com sensores sem fios, a serem desenvolvidos por engenheiros da Microsoft, com apoio da FAPESP. A ideia é acompanhar as transformações que esses ambientes podem sofrer com as alterações climáticas.

Projeto

Mudanças climáticas em montanhas brasileiras: respostas funcionais de plantas nativas de campos rupestres e campos de altitude a secas extremas (nº 2010/17204-0); Modalidade: Linha Regular de Auxílio a Projeto de Pesquisa; Coord.: Rafael Silva Oliveira – IB/Unicamp; Investimento: R$ 566.468,84 (FAPESP).

Artigo científico

ELLER, C. B. et al. Foliar uptake of fog water and transport belowground alleviates drought effects in the cloud forest tree species, Drimys brasiliensis (Winteraceae). New Phytologist. 2013. No prelo.

Plantas ameaçadas do cerrado são identificadas na Grande São Paulo

Biólogos identificam 273 espécies exclusivas da vegetação de cerrado no Parque Estadual do Juquery, na Região Metropolitana de São Paulo 

RODRIGO DE OLIVEIRA ANDRADE | Edição Online 13:24 21 de maio de 2013
© J. B. BAITELLO
Vista geral do Parque Estadual do Juquery
Vista geral do Parque Estadual do Juquery

A apenas 38 quilômetros do centro da capital paulista, entre os municípios de Franco da Rocha e Caieiras, o Parque Estadual do Juquery guarda centenas de espécies características do cerrado, algumas delas, inclusive, consideradas extintas em outras regiões do Estado. A constatação é de um grupo de pesquisadores do Instituto Florestal (IF), vinculado à Secretaria do Meio Ambiente do Estado de São Paulo. Com base em um levantamento florístico realizado no parque, eles identificaram 420 espécies, das quais 273 são exclusivas da vegetação de cerrado, do tipo campestre e savânica. Detalhes do estudo foram publicados em março na Série Registros, editada pelo próprio IF.

Segundo João Batista Baitello, botânico do Instituto Florestal e responsável pela pesquisa, impressiona a quantidade de espécies presentes no parque que fizeram ou ainda fazem parte oficialmente do chamado livro vermelho de espécies ameaçadas. Na última edição deste catálogo (Resolução SMA 48 de 2004), cinco espécies com populações dentro dos limites do parque foram consideradas “presumivelmente extintas”. É o caso da Oxypetalum capitatum, subarbusto da família Asclepiadaceae recorrente em vegetação de campo-cerrado. Isso porque não havia registros de sua ocorrência nos herbários nos 50 anos anteriores à publicação.

A Ipomoea argentea, arbusto da família Convolvuloaceae, com maior ocorrência em áreas de campo-cerrado, também já esteve na penúltima edição do mesmo livro (Resolução SMA 28 de 1998). Baitello explica que esse tipo de levantamento já havia sido feito antes, mas em escala muito menor. “Nosso estudo foi o primeiro a ser realizado naquela área. Concluímos que o Parque Estadual do Juquery engloba fragmentos de cerrado do Estado com elevado valor biológico”, afirmou.

© J. B. BAITELLO
Ipomoea argentea, especie fez parte da listagem das ameacadas
Ipomoea argentea, espécie fez parte da listagem das ameacadas.

A partir das espécies identificadas, os pesquisadores constataram que o parque está protegendo 28 espécies de plantas ameaçadas de extinção. “O resultado desse levantamento poderá implicar em uma revisão e enquadramento de novas categorias, de menores graus de ameaça, nas próximas edições do livro vermelho, visto que as espécies estão protegidas em uma unidade de conservação de proteção integral localizada em plena Região Metropolitana de São Paulo”, explicou o botânico. Para ele, essa ocorrência reforça a importância do parque como uma das principais unidades de conservação dessas populações no Estado.

O cerrado é o nome dado ao bioma brasileiro caracterizado principalmente pela vegetação campestre e savânica – formada, sobretudo, por gramíneas, subarbustos, arbustos e pequenas árvores que se desenvolvem em regiões de áreas planas e de clima tropical com recorrência de períodos de seca. Atualmente, ele cobre cerca de 2 milhões de quilômetros quadrados (km²), o que representa quase 23% do território nacional – é menor apenas que a Amazônia, que ocupa cerca de 3,5 milhões de km².


Um dos 25 biomas terrestres mais biodiversos e ameaçados do planeta, o cerrado em São Paulo ocupava 35 mil km² do território em 1800. Até 1962, 96,9% de sua cobertura original manteve-se preservada. Mas, segundo Baitello, a forte expansão da ocupação humana por todo o Estado a partir da segunda metade do século XX reduziu significativamente a vegetação original do bioma. “Em 39 anos de análise, o cerrado no Estado perdeu 94,1% de sua área original”, disse.

Hoje, o cerrado remanescente encontra-se altamente fragmentado e comprometido biologicamente, visto que ocupa apenas 0,83% da superfície do Estado. “Apenas 8,5%, aproximadamente, dos fragmentos remanescentes estão protegidos em unidades de conservação, o que corresponde a cerca de 17 mil hectares (170 km²)”, ressaltou o botânico. Na sua avaliação, não bastasse isso, o processo de fragmentação das vegetações de cerrado tem desencadeado a perda de habitats e de biodiversidade, reduzindo drasticamente o tamanho das populações, especialmente das de espécies raras. “Ela [a fragmentação] afeta o ecossistema em todos os níveis, interrompendo interações entre insetos e plantas, fauna e flora em geral, além de diminuir a rede de polinização, fragilizando e diminuindo a capacidade de recuperação dos ecossistemas”, explicou.
© J. B. BAITELLO
Oxypetalum capitatum, especie considerada presumivelmente extinta nos livros vermelhos
Oxypetalum capitatum, especie considerada presumivelmente extinta nos livros vermelhos.

No Parque Estadual do Juquery, a área de ocorrência de cerrado é de 1.173 hectares, o que representa 0,5% da área total remanescente no Estado de São Paulo, que é de 238 mil hectares. “Embora não tenhamos dados concretos é provável que o remanescente de cerrado periférico no Planalto Paulistano não represente mais que 0,8% da área restante do bioma no Estado”, disse.

De acordo com os pesquisadores, a ocorrência de vegetação de cerrado em áreas de influência da mata atlântica se deve, entre outros fatores, à presença de solos de baixa fertilidade e as chamadas “stones lines” – uma linha de pedra a cerca de 30 centímetros de profundidade –, condição que dificulta o desenvolvimento de vegetação de porte maior. A região onde se insere o parque revela um regime climático com estação seca menos severa do que nas áreas principais de ocorrência dos cerrados no Estado.
Por isso, os pesquisadores recomendam a busca de outras áreas de ocorrência desses cerrados periféricos no domínio da mata atlântica na região de entorno do parque, com o intuito de criar novas unidades de conservação que preservem a diversidade biológica particular da região. “O cerrado é um banco de moléculas ainda a explorar e a sua biodiversidade é matéria-prima para a biotecnologia com ilimitadas possibilidades futuras”, afirmou Baitello. “É preciso estimular políticas públicas que levem à criação de novas unidades de conservação, instrumento que ainda está longe do mínimo requerido para uma proteção efetiva dessas particularidades”, concluiu.

Publicação científica

BAITELLO, J. B., AGUIAR, O. T., PASTORE, J. A. e ARZOLLA, F. A. R. D. P. Parque Estadual do Juquery: refúgio de cerrado no domínio atlântico. Série Registros. IF Sér. Reg. São Paulo n. 50, p. 1-46. mar. 2013.

Escassez de aves pode afetar evolução de plantas

Queda na população de espécies pode ajudar a explicar redução no tamanho de sementes de palmeira da mata atlântica 

RODRIGO DE OLIVEIRA ANDRADE | Edição Online 16:47 30 de maio de 2013
© LINDOLFO SOUTO/SCIENCE
Tucano-de-bico-preto: aves cumprem funções ecossistêmicas importantes em relação às plantas, seja por polinizar suas flores ou por comer seus frutos e dispersar suas sementes, favorecendo a regeneração natural das florestas
Tucano-de-bico-preto: aves cumprem funções ecossistêmicas importantes em relação às plantas, por polinizar suas flores e dispersar suas sementes, favorecendo a regeneração das florestas.

A queda na população de aves frugívoras de grande porte, como tucanos e arapongas, capazes de comer frutos com sementes grandes, pode estar associada à diminuição do tamanho das sementes de certas espécies de plantas da mata atlântica, e, consequentemente, a mudanças em seus padrões evolutivos.  

Essa relação foi observada por um grupo de pesquisadores de várias instituições brasileiras e internacionais, liderados pelo biólogo brasileiro Mauro Galetti, do Departamento de Ecologia da Universidade Estadual Paulista (Unesp) em Rio Claro. Com base em análises estatísticas, genéticas e em modelos evolutivos, eles estudaram a ecologia de uma palmeira conhecida como palmito-juçara (Euterpe edulis) – importante fonte de alimento para mais de 50 espécies de aves da mata atlântica, como papagaios, sabiás e tucanos, que se alimentam de seus frutos, além de ter importância econômica. Para isso, coletaram nove mil sementes de 22 populações da palmeira espalhadas ao longo da costa sudeste do Brasil.

Ao combinarem todos esses dados, os pesquisadores verificaram que em locais onde as aves de maior porte haviam sido extintas há mais de 50 anos, tanto pela caça predatória quanto pelo desmatamento, as populações das palmeiras produziam apenas frutos pequenos, enquanto em áreas de floresta mais conservada, e com quantidade de aves suficiente para desempenhar sua função ecológica de dispersão de sementes, as palmeiras produziam frutos de tamanhos mais variados, com sementes pequenas e grandes. Os detalhes do estudo serão publicados na edição desta sexta-feira (31) da revista Science.
Há algum tempo se sabe que as aves cumprem funções ecossistêmicas importantes em relação às plantas, seja por polinizar suas flores ou por comer seus frutos e dispersar suas sementes, favorecendo a regeneração natural das florestas.

Contudo, aves de bicos menores, como os sabiás, não conseguem engolir e dispersar as sementes grandes, que geralmente caem embaixo da palmeira. Isso acaba dificultando o surgimento de novas plantas da espécie. Na ausência das aves grandes, as novas plantas acabam sendo geradas a partir de sementes pequenas e, como consequência, também produzem sementes pequenas. Com o tempo, a tendência é que somente as sementes menores sejam encontradas na natureza, em um efeito cascata induzido pela ação humana que pode desencadear mudanças ecológicas significativas.

De acordo com Galetti, a redução do tamanho das sementes dessas populações pode trazer consequências negativas, inclusive para as próprias plantas, já que sementes pequenas apresentam maiores índices de mortalidade devido ao dessecamento. “Como os modelos climáticos sugerem períodos de seca mais severa no futuro, em decorrência das mudanças do clima, uma proporção maior de sementes pequenas pode não germinar”, explica. Isso também pode resultar em um menor potencial de resposta evolutiva às mudanças climáticas.  “Acreditava-se que os efeitos da seleção natural demonstrada por Charles Darwin há mais de 100 anos poderiam levar gerações para se manifestar”, diz Galetti, “mas nossos dados mostram que o impacto humano sobre a população das aves ajuda a selecionar rapidamente as plantas com sementes pequenas”, disse.

A mata atlântica é um dos principais e mais degradados ecossistemas brasileiros, do qual restam, segundo algumas estimativas, aproximadamente 12% de sua cobertura original – mais de 80% da vegetação remanescente encontra-se altamente fragmentada em áreas com menos de 50 hectares. “Essas áreas são pequenas demais para manterem populações de grandes aves frugívoras”, afirma Galetti. A fragmentação mais intensiva da mata Atlântica teve início em 1800, com o desenvolvimento dos cultivos de café, cana-de-açúcar e a exploração madeireira.

“Infelizmente, os efeitos que documentamos em nosso trabalho não refletem uma situação isolada”, afirmou. “A rápida diminuição das populações de grandes vertebrados parece estar causando mudanças sem precedentes na trajetória evolutiva e na composição de muitas áreas tropicais”, concluiu.
No entanto, o biólogo afirma que ainda há tempo para reverter esse quadro. Segundo ele, é preciso aumentar a conectividade entre os fragmentos de floresta, o que estimularia o fluxo gênico, a fiscalização em relação à caça dessas espécies de aves e o contrabando ilegal do palmito. “Isso só pode ser feito se as autoridades aumentarem a fiscalização das unidades de conservação em parques estaduais”, disse. “O que estamos vendo, porém, é o contrário. A aprovação da última versão do Código Florestal estimulará o desmatamento. Além disso, a fiscalização em áreas que deveriam estar protegidas é inócua”, completou.
Assim, a degradação de hábitats, junto da extinção de espécies, pode causar drásticas mudanças na composição e estrutura de ecossistemas importantes, já que interações ecológicas críticas estão sendo perdidas. “Isso significa funções ecossistêmicas que podem determinar mudanças evolutivas podem estar sendo perdidas muito mais rápido do que imaginamos”. Daí a importância de se identificar quais funções estão sendo afetadas, de modo a evitar o colapso desse ecossistema.

Projeto

Efeitos de um gradiente de defaunação na herbivoria, predação e dispersão de sementes: uma perspectiva na Mata Atlântica (nº 2007/03392-6); Modalidade: Auxílio Pesquisa; Coordenador: Mauro Galetti Rodrigues/Unesp; Investimento: R$692.437,03 (Biota-FAPESP)

Artigo científico

Galetti, Mauro. et al. Functional Extinction of Birds Drives Rapid Evolutionary Changes in Seed Size. Science. v. 340, p. 1086-1090. 2013.

Pesquisadores descobrem novas espécies de aracnídeos no Brasil

Espécies habitam cavernas de calcário no Ceará e no Rio Grande do Norte
JÚLIO CÉSAR BARROS | Edição Online 9:59 7 de junho de 2013
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As espécies Rowlandius ubajara e Rowlandius potiguar (imagem) como “aracnídeos de coloração marrom-avermelhada”
As espécies Rowlandius ubajara e Rowlandius potiguar (imagem) como “aracnídeos de coloração marrom-avermelhada”

Pesquisadores brasileiros apresentaram duas novas espécies de aracnídeos pertencentes à ordem Schizomida, descobertas em cavernas úmidas em regiões áridas do Ceará e do Rio Grande do Norte. Em artigo publicado na revista PLoS One no dia 22 de maio, o biólogo Adalberto J. Santos, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), e seus colegas descreveram Rowlandius ubajara (Ceará) e Rowlandius potiguar (Rio Grande do Norte) como “aracnídeos de coloração marrom-avermelhada”. Ambos estavam em cavernas profundas de calcário onde não há luz. Eles vivem em meio às fezes de morcegos, colonizadas por pequenos insetos, como os das ordens dos colêmbolos e dos tisanuros, que provavelmente são o alimento dos aracnídeos.

“As principais diferenças entre essas duas novas espécies são o formato do flagelo [rabicho] do macho e detalhes dos órgãos genitais internos da fêmea, que precisam ser dissecadas e examinadas no microscópio”, explica o professor da UFMG. “Algo interessante sobre o R. potiguar é o fato de existirem dois ‘tipos’ de machos”, diz. Uns, observa o pesquisador, têm pedipalpos [apêndices ao lado da boca] longos, enquanto outros apresentam pedipalpos curtos, parecidos com as fêmeas.

Os animais são chamados de pelos próprios pesquisadores que fizeram a descoberta de “micro escorpião-vinagre” ou “escorpião-vinagre de flagelo curto”. O nome vem de glândulas que produzem uma secreção rica em ácido acético (daí o “vinagre” do nome popular), que é lançada contra possíveis agressores.
Apesar de ocorreram somente no interior de grutas profundas, os pesquisadores acreditam ser pouco provável que o R. ubajara e o R. potiguar vivam exclusivamente na zona afótica de cavernas, que é a parte onde a luz não chega. Os exemplares de ambos não apresentam adaptações morfológicas típicas de animais que vivem em cavernas, como pernas muito alongadas e ausência de pigmentação. Santos salienta que apenas observações mais minuciosas poderão apontar se eles são habitantes exclusivos do subterrâneo.
Exemplares do gênero Rowlandius, possivelmente aparentados às duas espécies descritas pelos brasileiros, habitam em sua grande parte o Caribe – principalmente Cuba, Jamaica e República Dominicana –, mas há um tipo que é encontrado na Amazônia (Rowlandius sul) e outro na Paraíba (Rowlandius linsduarteae).
Os brasileiros Rodrigo Lopes Ferreira, da Universidade Federal de Lavras (MG) e Bruno Alves Buzatto, que trabalha para a University of Western Australia, também fizeram parte da equipe de pesquisadores que assina o estudo.

sexta-feira, 7 de junho de 2013

Museu apresenta maior fóssil de pterossauro já encontrado no país

Foi apresentado nesta quarta-feira (20), no Museu Nacional, no Rio de Janeiro, o esqueleto do maior réptil voador já encontrado no Brasil. Trata-se de um exemplar de "Tropeognathus mesembrinus" que, quando vivo, tinha cerca de 8,2 metros de envergadura.

"O que faz este exemplar particularmente especial é que se trata do fóssil mais completo encontrado até agora, com quase todo o esqueleto preservado, inclusive o crânio", explicou o paleontólogo Alexander Kellner, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), ao apresentar a reconstrução do animal, feita em resina de poliéster.

A envergadura dessa espécie normalmente é de 7 metros, mas o exemplar apresentado era excepcionalmente grande. "Este fóssil encontrado nas rochas da Chapada do Araripe, no Nordeste do Brasil, é o maior encontrado no Hemisfério Sul e é o terceiro no mundo", disse Kellner, segundo informações da agência AFP.

De acordo com o Museu Nacional, o novo fóssil confirma que a região da Chapada do Araripe, localizada entre os Estados de Ceará, Pernambuco e Piauí, reúne alguns dos mais importantes depósitos de fósseis do mundo, noticia a agência Reuters.

Modelo de poliéster mostra como é o esqueleto em seu conjunto (Foto: Vanderlei Almeida/ AFP Photo)

O especialista também apresentou uma reconstrução de como teria sido a cabeça desse animal. O estudo da estrutura óssea do réptil voador mostrou que se tratava de um adulto.
A espécie pertence à família dos Anhangueridae, animais que se caracterizam por terem uma crista na parte anterior do crânio e a parte superior da mandíbula com uma dentição que mostra que eles se alimentavam de peixes.

Os vasos sanguíneos dessa crista serviam para regular a temperatura do corpo do animal, segunfo Kellner."Podemos provar que esses répteis gigantes voadores existiam no céu do Nordeste brasileiro muito antes do que pensávamos, porque os fósseis foram encontrados em formações rochosas de 110 milhões de anos", comentou o paleontólogo. Antes se acreditava que eles viveram entre 65 milhões e 72 milhões de anos atrás.

 Outras espécies de Anhangueridae já foram achadas em diversas partes do mundo, como Marrocos Inglaterra, Mongólia, Estados Unidos e China.
G1- 21/05/2013