Fósseis brasileiros à mercê da sorte
- Criado em 15/02/2014
"O pterossauro está em consignação para um dos meus clientes", contou David Guery, dono da Geofossils. Desde 1942, a legislação brasileira proíbe a venda e a exportação comercial de fósseis, considerados patrimônio da nação. Ainda assim, a peça já recebeu quatro lances e alcançou, por enquanto, US$ 262 mil (mais de R$ 600 mil) em ofertas. Ao mesmo tempo, o Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM) reconhece a dificuldade para fiscalizar a coleta de fósseis em áreas de mineração intensa, como a Chapada do Araripe, de onde saiu o pterossauro.
"O controle ainda é deficiente e falta pessoal técnico qualificado", constata Felipe Barbi Chaves, chefe da Divisão de Proteção de Depósitos Fossilíferos do DNPM. "Infelizmente, fósseis como esse são extremamente atrativos no exterior. O problema de descaminho lá (na Chapada do Araripe) é muito grande. O poder público não tem perna para fazer um acompanhamento rotineiro, 24 horas por dia", afirma.
Ele diz que, desde 2006, o órgão intensificou a atuação, mas faltam funcionários para coibir o roubo de fósseis. No escritório do DNPM no Crato (CE), há apenas dois geólogos especializados em paleontologia. Lotado em Brasília, Chaves faz visitas constantes ao local, assim como três pesquisadores que ficam no Rio de Janeiro.
Quando um fóssil é encontrado nas placas de calcário, os trabalhadores das frentes de lavra os separam e entregam os objetos ao DNPM ou a pesquisadores das universidades que fazem estudos na região, em particular, as federais do Ceará, de Pernambuco, do Piauí e a Universidade do Cariri. "Recebemos muito material, mas um como esse do pterossauro desperta muito interesse econômico e, às vezes, é escondido", conta. Do Brasil, os fósseis partem para o exterior por via aérea, marítima ou terrestre, podendo ser disfarçados para facilitar o envio. Em Goiânia, por exemplo, o Ministério Público Federal apreendeu uma carga de peças artesanais que vinham do Tocantins, feitas com plantas fossilizadas. As investigações apontam que o fabricante dos objetos conhecia a origem da matéria-prima e usava o artesanato apenas para tentar exportar os fósseis sem levantar suspeita.
Desconhecimento
Questionado pela reportagem, David Guery disse que não sabia que fósseis brasileiros não podiam ser comercializados. "Não conheço essa lei, mas, para mim, parece que ela é recente", afirmou. Ele disse ainda que esse é o primeiro fóssil brasileiro colocado à venda pela loja e informou que apenas 15% dos ossos são originais – o restante do esqueleto foi completado com resina, técnica de restauro bastante comum, mesmo em museus, pois dificilmente restos de um animal tão antigo são encontrados intactos. Guery disse não ter contato com vendedores de fósseis no Brasil.O caso do pterossauro Anhanguera santanae à venda no e-bay foi denunciado pelo paleontólogo Juan Carlos Cisneros, professor da Universidade Federal do Piauí, ao DNPM. De acordo com Felipe Chaves, a informação foi passada à Polícia Federal, que, com a Interpol, vai fazer a investigação. Se confirmada a procedência do Anhanguera, que foi escavado, de acordo com o anúncio, em Santana do Cariri (CE), a PF poderá solicitar a repatriação do fóssil. David Guery disse que não cabe a ele, mas a seu cliente, dizer se devolveria o animal pré-histórico ao Brasil, caso solicitado pelas autoridades brasileiras.
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