Consórcio pretende mapear diversidade brasileira de microrganismos
08/05/2014
Por Elton AlissonAgência FAPESP – Além de abrigar grande parte da diversidade biológica de macrorganismos do mundo, sendo um dos 17 países que compartilham cerca de 70% das espécies de plantas e animais catalogados no planeta, estima-se que o Brasil também possua uma grande diversidade microbiana, na maior parte ainda desconhecida.
A
exemplo do que ocorre com a fauna e a flora, o Brasil também deve
possuir megadiversidade de fungos, bactérias e outros microrganismos,
estimam pesquisadores como Alexandre Rosado, da UFRJ (foto: Cláudio Arouca/capa: Itamar Soares de Mello, CNPMA/Embrapa)
A iniciativa foi descrita em um artigo publicado na revista Microbial Ecology e foi apresentada no Simpósio Internacional BIOTA Micro-organismos, realizado na FAPESP entre os dias 28 e 30 de abril.
Promovido pelo programa BIOTA-FAPESP, o evento reuniu pesquisadores para debater avanços recentes na pesquisa sobre diversidade microbiana, ecologia e bioprospecção.
“Uma das razões do desconhecimento da diversidade microbiana de diversos países, incluindo do Brasil, é o fato de os microrganismos serem ‘invisíveis’”, disse Alexandre Soares Rosado, diretor do Instituto de Microbiologia Paulo de Goes da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e um dos pesquisadores participantes do projeto, à Agência FAPESP.
Segundo Rosado, os microrganismos não são vistos a olho nu nem são identificados e catalogados mais facilmente, como no caso das plantas e animais. Além disso, ainda não se sabe muito bem como cultivá-los em laboratório.
Há bactérias na Antártica, por exemplo, que só crescem a partir de 5 ºC negativos. Há também microrganismos chamados termofílicos, que só crescem a partir de 65 ºC e bactérias que só se desenvolvem se tiver outras bactérias crescendo próximas a elas e não se sabe quais são as interações entre elas, apontou Rosado.
“Ainda não sabemos exatamente quais as condições de temperatura, pH e nutrientes de que diversos microrganismos necessitam para crescer em um meio de cultura”, disse.
“Só conseguimos cultivar uma fração muito pequena de microrganismos, como algumas espécies de bactérias, que vemos em uma placa de Petri, em laboratório. Mas isso representa, provavelmente, menos de 1% da diversidade de microrganismos estimada no planeta”, ressalvou Rosado.
Por meio de observações em microscópio já era possível perceber que há uma diversidade de tipos e subtipos de microrganismos muito maior do que a cultivada hoje em laboratório.
Com o desenvolvimento, nos últimos anos, de técnicas de sequenciamento de genoma de última geração, utilizadas em novas abordagens como a metagenômica e a metatranscriptômica, ficaram ainda mais evidentes a diversidade e a abundância de microrganismos existentes no planeta, apontou Rosado.
“Com o surgimento dessas novas técnicas começamos a perceber que realmente sabemos muito pouco sobre a diversidade microbiana existente no planeta”, disse o pesquisador.
“Por meio delas é possível obter sequências a partir de amostras de diferentes ambientes, como da Antártica, do Cerrado e de regiões de manguezal, por exemplo, e fazer análises comparativas de genes funcionais importantes de comunidades microbianas inteiras”, detalhou.
Padronização de metodologias
Segundo Rosado, os avanços recentes em sequenciamento de genoma oferecem a oportunidade para se estudar o microbioma brasileiro utilizando metodologias moleculares de ponta concomitantemente a análises mais convencionais.
Para isso, no entanto, será preciso padronizar as metodologias de estudo utilizadas por diferentes grupos de pesquisa em diversas regiões do país, apontou.
“Há diversos grupos no Brasil estudando a diversidade microbiana em manguezais, só que cada um usando uma metodologia diferente. Isso impossibilita correlacionar os dados, fazer inferências ou tirar conclusões das análises”, afirmou.
A exemplo de outros projetos existentes no mundo, como o Earth Microbiome Project, o BMP pretende padronizar as metodologias utilizadas pelos diferentes grupos de pesquisa de microrganismos no Brasil e desenvolver novas ferramentas de bioinformática para facilitar a análise da enorme quantidade de dados que geram.
A ideia do consórcio brasileiro, segundo Rosado, é criar uma base de dados de metagenômica padronizados que os pesquisadores possam acessar, analisar e comparar com os já existentes e coletados por outros grupos no país ou consórcios internacionais, como o próprio Earth Microbiome Project.
“Com todos os grupos usando a mesma metodologia, será possível realmente inferir se a comunidade microbiana de um manguezal no Rio de Janeiro é a mesma de um manguezal no Amapá, por exemplo”, avaliou.
“A criação e a alimentação dessa base de dados serão a etapa mais complexa e fundamental para termos um inventário da biodiversidade microbiana brasileira”, afirmou.
Os pesquisadores estimam que, a exemplo dos macrorganismos, o Brasil também possui uma megadiversidade de microrganismos, uma vez que cada planta ou animal funciona individualmente como um ecossistema diferente para comunidades microbianas muita vezes específicas.
“Se o Brasil é um país megadiverso em flora e fauna, com certeza ele também deve ser megadiverso em microrganismos também”, avaliou Rosado.
O artigo Brazilian Microbiome Project: revealing the unexplored microbial diversity – challenges and prospects (doi: 10.1007/s00248-013-0302-4), de Rosado e outros, pode ser lido na revista Microbial Ecology em link.springer.com/article/10.1007/s00248-013-0302-4.
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