Hadeano
Por: Marcus V. Cabral - by Ikessauro
Terra durante o Hadeano © Don Dixon |
O nome "Hadeano" tem origem na palavra "Hades", o nome do antigo deus grego do submundo, uma referência às condições "infernais"
do planeta naquele tempo: a Terra havia acabado de se formar e ainda
estava muito quente devido à grande quantia de atividade vulcânica, uma
superfície parcialmente derretida, sem falar nas frequentes colisões com
outros corpos vindos de outras regiões do universo, lembrando os
cenários concebidos como sendo equivalentes ao do inferno ou submundo em
algumas culturas.
Realmente, uma vista infernal © Bullet-magnet |
O
geólogo Preston Cloud (1912 - 1991) foi quem cunhou o termo em 1972,
originalmente para batizar a faixa de tempo anterior à das rochas mais
antigas da Terra. Mais tarde W. Brian Harland criou um termo que é
praticamente um sinônimo menos utilizado: o "Período Priscoano". Outros
textos mais velhos simplesmente se referem a esse éon como o
"Pré-Arqueano", porque antecede esse outro éon chamado Arqueano.
Uma
vez que só restam alguns poucos indícios geológicos deste éon na Terra
não há uma subdivisão oficial. Muitas fontes inclusive indicam o Hadeano
como sendo uma faixa de tempo informal e não um éon geológico, pela
falta de rochas dessa época na crosta do planeta. Muito do que se
descobriu dessa época vem de análise de meteoritos. No entanto, a tabela
geológica lunar abrange várias subdivisões principais relacionadas ao
Hadeano e por isso são algumas vezes usadas informalmente para se
referir aos mesmos períodos de tempo na Terra.
Hadeano: oficialmente sem divisões © Patrick Król Padilha |
- Pré-Nectariano, durou desde a formação da crosta da Lua até 3,9 bilhões de anos atrás.
- Nectariano desde 3,9 até 3,8 bilhões de anos.
Uma
escala geológica alternativa recentemente proposta inclui a adição de
um Éon novo, o Caotiano (ou Chaotiano, vindo do termo Caos), para
designar o tempo entre o surgimento do sistema solar e o início do
Hadeano. Também, essa proposta feita por Goldblatt et.al. (2010),
subdivide o éon Hadeano em três eras com dois períodos cada. Observe que
neste caso o Hadeano termina há 3,9 bilhões de anos e não 4 bilhões de
anos atrás. Nesta nova proposta temos a seguinte divisão (ver tabela a
seguir).
Cristais de zircônio individuais redepositados em sedimentos no Oeste do Canadá e na região de Jack Hills no Oeste da Austrália são muito velhos e dão pistas sobre a idade e condições da Terra primitiva. Os cristais de zircônio mais velhos datam de cerca de 4 bilhões de anos atrás, apenas 500 milhões de anos após a formação do planeta. Em 2001 foi coletado em Jack Hills na Austrália, um cristal de zircônio muito pequeno, porém o resultado que sua análise revelou foi de grande importância. Seu estudo sugere que ele data de aproximadamente 4,4 bilhões de anos, e análises extras feitas e restos de meteoritos indicam que a Terra já existia há 4,5 bilhões de anos.
Somente,
com um maior resfriamento do planeta os fragmentos se tornaram mais
numerosos e grandes o suficientes para criar uma cobertura sólida, ainda
fina, mas que já poderia ser considerada uma crosta primitiva. Essa
crosta se desenvolveu à medida que finas camadas de rocha eram
perfuradas por meteoros que abriam continuamente buracos na crosta, por
onde o magma fluía e acumulava sobre as placas, sendo que com o tempo
se solidificavam para formar novas camadas de rocha. .
O retrabalhamento e reciclagem das rochas terrestres apagou a maior parte dos indícios desse bombardeio, mas nas rochas lunares as evidências são claras e mostram as crateras de impacto e fluxos de lava.
Nesta
época a Lua ainda estava queimando, a apenas 16,000 quilômetros de
distância da Terra, o que é muito próximo se considerarmos que hoje ela
se situa a 384,000 quilômetros da Terra. Se estivéssemos no planeta
nessa época, e olhássemos para o céu boa parte da paisagem seria
ocupada pela Lua.
Ao
contrário do que se vê na ilustração acima, algumas pessoas supõem que a
partir de certo ponto a Lua já exercia uma força gravitacional forte o
suficiente para influenciar nossos oceanos primitivos, gerando marés
mais violentas e instáveis do que hoje inclusive, afinal a lua estava
mais próxima e sua força de atração seria superior. Esse efeito foi
retratado por um artista, como visto abaixo.
Pouquíssimas
localidades terrestres preservam rochas datando do final do Hadeano.
Essas rochas preservam sinais confusos do estado da crosta na época. Nas
últimas décadas do século 20 os geólogos identificaram algumas rochas
do Hadeano no Oeste da Groenlândia, Norte do Canadá e Oeste da
Austrália. Formações rochosas na Groenlândia contém sedimentos datados
em 3,8 bilhões de anos, cuja estrutura foi alterada por um dique
vulcânico, uma estrutura de rocha formada por magma que penetrou e
solidificou em rachaduras de outras rochas já formadas. Algumas
pesquisas indicam que estas rochas estão entre as mais antigas rochas
sedimentares conhecidas.
A
informação obtida do estudo dos cristais de zircônio australianos
(mencionados no tópico anterior) indica que pouco tempo após sua
formação a Terra já apresentou um resfriamento e a formação da crosta,
que deve ter decorrido durante o Hadeano. Estima-se que cerca de 500
milhões de anos após o surgimento da Terra é que a crosta começou a
esfriar e enrijecer em locais de temperatura mais baixa, menor que
1000º Celsius.
A taxa de isótopos de chumbo sugere que a subdução da crosta (processo em que uma placa tectônica desliza para debaixo de outra), estava ocorrendo, indicando que nosso planeta já possuíam uma crosta reconhecível com placas tectônicas bem formadas. No entanto, apesar de que a crosta já havia se diferenciado do manto, sua composição era basáltica em vez de granítica, como é hoje.
De um ponto de visto petrográfico, a crosta primitiva era similar, porém não igual, ao basalto que conhecemos, uma rocha vulcânica preta, com menos de 53% de SiO2 por peso.
Dividida pelos movimentos convectivos altamente energéticos, a fina cobertura litosférica teria se fragmentado em numerosas placas pequenas em movimento contínuo, separadas e deformadas por intenso vulcanismo. Durante esse rederretimento contínuo da protocrosta, as rochas mais pesadas gradualmente afundavam para o manto, deixando para trás o magma mais leve rico em silicatos. Daí, apareceram andesitos (rochas granulares, cujo nome deriva dos Andes, onde vários vulcões as formam) em torno dos basaltos . Gradualmente a crosta granítica surgia.
Portanto, qualquer chumbo no cristal deve ter se originado por decaimento radioativo de um elemento aprisionado na formação original do cristal. Em outras palavras, um dos metais pesados originais se transformou em chumbo com o tempo, ao perder radioatividade.
Um problema em potencial com este método é que os cristais de zircônio podem crescer por adição de material ao seu exterior quando expostos à temperaturas de centenas de graus Celsius, bem abaixo do ponto em que eles começam a "vazar" chumbo.
Trail tornou esse problema em vantagem. Usando uma microssonda de íons, mediu as taxas de U/Pb para dois diferentes isótopos de urânio, que tem meias-vidas diferentes e que produzem diferentes isótopos de chumbo quando deterioram-se.
A microssonda permitiu esses pesquisadores fazer centenas de medidas em diferentes profundidades no cristal - essencialmente descascando o zircônio de dentro pra fora, cerca de 100 nanômetros por vez, para reconstruir sua história de crescimento e entender como era o ambiente em que se formou.
Zircônios mais velhos que 3,9 bilhões de anos são incrivelmente raros, mas, depois de procurar entre milhares, Trail e seus colegas encontraram quatro cristais que:
Análises dos cristais de zircônio como este visto abaixo, mostram indícios da presença de água no Planeta muito cedo. Uma quantia considerável de água pode ter existido, segundo Bruce Watson e Mark Harrison, que inclusive afirmam que essa água estava na superfície! Analisando um grão de zircônio microscópico, perceberam que o cristal havia se formado em um ambiente de temperaturas aproximadas a 680 graus célsius. Isso pode ser dito porque sabe-se que na Terra há uma constante, só as rochas que foram expostas à água se formam (cristalizam) a estas temperaturas.
Eles
puderam saber que o cristal se formou nessa faixa de temperatura porque
as linhas de crescimento dele, visíveis na foto, indicam seu ponto de
origem, marcado como "CORE" na foto. Então observando a imagem podemos
saber que o cristal cresceu em direção ao ponto marcado como "RIM"
acima.
Analisando as camadas, pode-se descobrir quanto do elemento titânio o cristal absorveu durante a sua formação. Quanto mais quente, mais titânio o cristal absorve. Se ele estiver em ambiente mais frio, captura menos titânio. Assim pela quantia presente no cristal puderam saber que a temperatura aproximada no ambiente em que se formou era de cerca de 680º célsius.
Outra série de eventos importantes começou a se desenrolar e levou à formação de rochas sedimentares pelo processo de erosão, transporte e acumulação. Esses processos de sedimentação começaram a ocorrer tão logo a superfície esfriou o suficiente para permitir que o ciclo da água se estabelecesse. De fato, a Terra primitiva permaneceu algum tempo coberta em escuridão, envolta em densas nuvens quentes nas quais o vapor de água se acumulava constantemente vindo de emissões vulcânicas. Acredita-se que a água do planeta tenha chegado aqui via asteroides que depositaram fragmentos de gelo no planeta. Portanto, hoje acredita-se que nosso planeta, embora bem primordialmente fosse incrivelmente "infernal", em poucos milhões de anos já possuía água em sua superfície, formando oceanos primitivos, um ambiente mais agradável do que se pensava, talvez acumulando água nas crateras deixadas por meteoritos.
O
que se imagina sobre essa formação de oceanos é que quando as
temperaturas finalmente esfriaram o suficiente, as nuvens de vapor
começaram a se desmanchar em chuvas, e a atmosfera primordial produziu
tempestades de proporções inimagináveis, sob a quais a Terra rugia e
derramava.
No começo, a chuva caía em rochas incandescentes a água evaporava quase imediatamente, mas a evaporação gradualmente dissipou o calor da crosta até que a água pôde se acumular em depressões na superfície rochosa, formando os primeiros oceanos. Nos continentes primordiais, as primeiras redes de rios foram criadas e eles transportavam detritos arrancados de regiões altas e então os depositava no fundo dos mares.
Trabalhos
relativamente recentes só tem fortalecido o caso de que havia oceanos
antes de 4 bilhões de anos, segundo Wilde et al. (2001). Além do mais,
parece que as coisas esfriaram razoavelmente rápido depois que a Terra e
a Lua foram formadas cerca de 4,5 bilhões de anos atrás, dizem Wood e
Halliday (2005). Logo, os oceanos e a crosta tiveram uma chance de
estabilizar-se.
Sabendo disso, podemos levantar a seguinte dúvida. Após o Intenso Bombardeio Tardio a crosta e oceanos tiveram que recomeçar tudo do zero após sua completa destruição?
Cristais de zircônio individuais redepositados em sedimentos no Oeste do Canadá e na região de Jack Hills no Oeste da Austrália são muito velhos e dão pistas sobre a idade e condições da Terra primitiva. Os cristais de zircônio mais velhos datam de cerca de 4 bilhões de anos atrás, apenas 500 milhões de anos após a formação do planeta. Em 2001 foi coletado em Jack Hills na Austrália, um cristal de zircônio muito pequeno, porém o resultado que sua análise revelou foi de grande importância. Seu estudo sugere que ele data de aproximadamente 4,4 bilhões de anos, e análises extras feitas e restos de meteoritos indicam que a Terra já existia há 4,5 bilhões de anos.
Hadeano adaptado de Goldblatt et.al. (2010) © Patrick Król Padilha |
Este
tópico é complexo porque a geografia do Hadeano é interligada ao
processo de formação da Terra e ao clima. Continentes e oceanos ainda
estavam em processo de formação, o clima mudava constantemente, tudo era
instável, por isso vou abordar ambos (geografia e clima) juntos. Vamos
tentar entender pelo menos um pouco sobre isso.
Inicialmente
a Terra era uma esfera de rocha fundida, misturada constantemente por
movimentos convectivos (propagação de calor em fluídos devido à
diferença de densidade) entre as camadas internas quentes, enquanto que
as porções exteriores estavam em contato com a região fria do espaço. A
dissipação do calor para o espaço começou o resfriamento do nosso
planeta.
Neste oceano de magma blocos começaram a aparecer,
compostos de minerais com alto ponto de fusão. Essas placas
incandescentes, porém sólidas, eram similares às crostas finas que vemos
se formar sobre fluxos de lava atuais, mas deveriam ser bem instáveis,
facilmente reabsorvidos pelo magma líquido e carregados para as
profundezas.Observe a fina crosta acima do magma © Autor desconhecido |
Processo de formação da crosta © Patrick Król Padilha |
O retrabalhamento e reciclagem das rochas terrestres apagou a maior parte dos indícios desse bombardeio, mas nas rochas lunares as evidências são claras e mostram as crateras de impacto e fluxos de lava.
Retrabalhamento, segundo o site do Serviço Geológico do Brasil, é um "processo em que um determinado evento geológico confere à rocha pré-existente uma nova característica."Uma das hipóteses mais aceitas para explicar a atual composição e estrutura da Terra e da Lua é que há cerca de 4,6 bilhões de anos, quando a Terra primitiva havia acabado de se formar, um corpo celeste do tamanho aproximado de Marte se chocou contra nosso planeta, que na época tinha o tamanho de Vênus. O enorme choque detonou parte do globo, liberando magma do manto e material rochoso no espaço e na superfície do planeta. A porção que espalhou-se para o espaço permaneceu na órbita do planeta e aos poucos tomou forma originando o nosso satélite natural, ao qual denominamos Lua. Por isso é possível se basear na estrutura geológica lunar para estimar a composição ou idade do éon Hadeano na Terra, que contém as rochas mais antigas já datadas.
Processo de formação da crosta © Dana Berry |
A Lua gigante no horizonte © D. Aguilar |
As primeiras marés lunares © Don Dixon |
Rochas da Ilha Ikilia, na Groenlândia © Wild Stone Arts |
A taxa de isótopos de chumbo sugere que a subdução da crosta (processo em que uma placa tectônica desliza para debaixo de outra), estava ocorrendo, indicando que nosso planeta já possuíam uma crosta reconhecível com placas tectônicas bem formadas. No entanto, apesar de que a crosta já havia se diferenciado do manto, sua composição era basáltica em vez de granítica, como é hoje.
De um ponto de visto petrográfico, a crosta primitiva era similar, porém não igual, ao basalto que conhecemos, uma rocha vulcânica preta, com menos de 53% de SiO2 por peso.
A título de curiosidade, pelo que eu entendi pesquisando online (meu forte não são os números), essa fração de massa (por peso) se refere à soma de todas as massas dos componentes da mistura e posteriormente a divisão da massa de cada componente pela massa total da primeira soma.De qualquer modo, esse basalto era formado do material do manto, mas tinha uma composição um pouco diferente. Talvez fosse similar à crosta primordial da Lua, da qual boa parte ainda existe. A crosta lunar é largamente composta de anortosita, um feldspato rico em alumínio, mas que de resto é similar a basaltos lunares. De acordo com uma corrente de pensamento, a composição da crosta começou a mudar por um tipo de destilação.
A crosta era reciclada o tempo todo
© Steve Munsinger |
Dividida pelos movimentos convectivos altamente energéticos, a fina cobertura litosférica teria se fragmentado em numerosas placas pequenas em movimento contínuo, separadas e deformadas por intenso vulcanismo. Durante esse rederretimento contínuo da protocrosta, as rochas mais pesadas gradualmente afundavam para o manto, deixando para trás o magma mais leve rico em silicatos. Daí, apareceram andesitos (rochas granulares, cujo nome deriva dos Andes, onde vários vulcões as formam) em torno dos basaltos . Gradualmente a crosta granítica surgia.
Mas
existem problemas ainda a ser esclarecidos. Além aos sinais confusos
das análises de isótopos das rochas Isuanas, pesquisadores também se
confundem pelas questões relacionadas ao "Intenso Bombardeamento
Tardio".
A
teoria é que a Terra foi atingida por um grande número de corpos
celestes relativamente massivos durante o Hadeano, em um período curto
de 50 milhões de anos aproximadamente, uma espécie de chuva de meteoros
gigantesca. A evidência para isso é bem forte. Vem da astronomia lunar e
das rochas lunares recuperadas na exploração espacial.
O Intenso Bombardeamento Tardio © Don Dixon |
Isso
implica que, para muitos geólogos, a crosta granítica pós-hadeana não
foi um produto de destilação gradual como dito anteriormente, mas
resultado do retrabalhamento catastrófico depois que a protocrosta foi
destruída pelo Intenso Bombardeamento Tardio.
Estudos realizados
por Trail et al. (2007) nos cristais de zircônio mais velhos que o
bombardeio a partir de afloramentos próximos a Jack Hills na Austrália
mostram resultados interessantes. Observe que os cristais de zircônio
são frequentemente usados para datação porque eles são completamente
inertes em temperaturas de até 900º C e porque os cristais
frequentemente aprisionam metais pesados (U, Th, Lu entre outros), mas
não capturam chumbo (Pb).Portanto, qualquer chumbo no cristal deve ter se originado por decaimento radioativo de um elemento aprisionado na formação original do cristal. Em outras palavras, um dos metais pesados originais se transformou em chumbo com o tempo, ao perder radioatividade.
Um problema em potencial com este método é que os cristais de zircônio podem crescer por adição de material ao seu exterior quando expostos à temperaturas de centenas de graus Celsius, bem abaixo do ponto em que eles começam a "vazar" chumbo.
Trail tornou esse problema em vantagem. Usando uma microssonda de íons, mediu as taxas de U/Pb para dois diferentes isótopos de urânio, que tem meias-vidas diferentes e que produzem diferentes isótopos de chumbo quando deterioram-se.
A microssonda permitiu esses pesquisadores fazer centenas de medidas em diferentes profundidades no cristal - essencialmente descascando o zircônio de dentro pra fora, cerca de 100 nanômetros por vez, para reconstruir sua história de crescimento e entender como era o ambiente em que se formou.
Zircônios mais velhos que 3,9 bilhões de anos são incrivelmente raros, mas, depois de procurar entre milhares, Trail e seus colegas encontraram quatro cristais que:
- Passaram nos testes internos de concordância entre os dois pares de isótopos e...
- ... eram mais velhos que 4 bilhões de anos nos níveis mais profundos.
Análises dos cristais de zircônio como este visto abaixo, mostram indícios da presença de água no Planeta muito cedo. Uma quantia considerável de água pode ter existido, segundo Bruce Watson e Mark Harrison, que inclusive afirmam que essa água estava na superfície! Analisando um grão de zircônio microscópico, perceberam que o cristal havia se formado em um ambiente de temperaturas aproximadas a 680 graus célsius. Isso pode ser dito porque sabe-se que na Terra há uma constante, só as rochas que foram expostas à água se formam (cristalizam) a estas temperaturas.
Pedaço de zircônio de 4.4 bilhões de anos © Bruce Watson/Rensselaer |
Analisando as camadas, pode-se descobrir quanto do elemento titânio o cristal absorveu durante a sua formação. Quanto mais quente, mais titânio o cristal absorve. Se ele estiver em ambiente mais frio, captura menos titânio. Assim pela quantia presente no cristal puderam saber que a temperatura aproximada no ambiente em que se formou era de cerca de 680º célsius.
Outra série de eventos importantes começou a se desenrolar e levou à formação de rochas sedimentares pelo processo de erosão, transporte e acumulação. Esses processos de sedimentação começaram a ocorrer tão logo a superfície esfriou o suficiente para permitir que o ciclo da água se estabelecesse. De fato, a Terra primitiva permaneceu algum tempo coberta em escuridão, envolta em densas nuvens quentes nas quais o vapor de água se acumulava constantemente vindo de emissões vulcânicas. Acredita-se que a água do planeta tenha chegado aqui via asteroides que depositaram fragmentos de gelo no planeta. Portanto, hoje acredita-se que nosso planeta, embora bem primordialmente fosse incrivelmente "infernal", em poucos milhões de anos já possuía água em sua superfície, formando oceanos primitivos, um ambiente mais agradável do que se pensava, talvez acumulando água nas crateras deixadas por meteoritos.
Os primeiros mares © Don Dixon |
No começo, a chuva caía em rochas incandescentes a água evaporava quase imediatamente, mas a evaporação gradualmente dissipou o calor da crosta até que a água pôde se acumular em depressões na superfície rochosa, formando os primeiros oceanos. Nos continentes primordiais, as primeiras redes de rios foram criadas e eles transportavam detritos arrancados de regiões altas e então os depositava no fundo dos mares.
As primeiras chuvas © Don Dixon |
Sabendo disso, podemos levantar a seguinte dúvida. Após o Intenso Bombardeio Tardio a crosta e oceanos tiveram que recomeçar tudo do zero após sua completa destruição?
Até
o momento, a resposta parecia ser "não". Ou seja, o Intenso Bombardeio
Tardio foi um cataclismo menos "cataclísmico" do que imaginado. Como
Ryder (2003) apontou, nossa melhor informação do Intenso Bombardeio
Tardio vem da lua. O pensamento lógico aqui é baseado no fato que muito
da crosta original da lua ainda existe, porque resistiu ao bombardeio,
então porque deveríamos acreditar que a crosta da Terra (que é bem
maior) foi destruída por completo? A resposta mais plausível
(parcimoniosa) é que esse evento não destruiu toda a crosta já formada.
No
entanto há quem discorde disso. Uma pesquisa recente de 2014, feita por
um grupo de cientistas e publicada com o título "Widespread Mixing and
Burial of Earth’s Hadean Crust by Asteroid Impacts" na revista Nature,
indica que os meteoros ou asteroides que se chocaram com a Terra no
período do Intenso Bombardeio Tardio teriam sim capacidade de aniquilar
boa parte da crosta e até vaporizar o oceano terrestre. No entanto eles
não negam que já havia água na Terra tão cedo quanto 4.4 bilhões de anos
e que podem ter existido regiões não tão afetadas pelos choques, assim
como períodos de "tranquilidade" entre um cataclismo e outro.
Mas
eles afirmam que é bem provável que estes corpos celestes que se
chocaram com a Terra obliteraram muito das rochas originais do planeta e
que praticamente forçaram a Terra a reciclar toda sua superfície.
Alguns
pesquisadores, Russel e Arndt (2005), até argumentam que a vida evoluiu
antes do Intenso Bombardeio Tardio e sobreviveu para contar a história.
Russel e Arndt estão dizendo que, precisamente pelo fato de a crosta
oceânica ser pouco diferenciada do basalto do manto, ela era grossa,
rígida e não condutora, oferecendo tanto estabilidade física e térmica
contra efeitos de impactos.
A
crosta continental, por outro lado, era muito densa, fina e se revirava
rapidamente. Isso promovia hidratação do manto superior e também levou a
um processo parecido com o de destilação que criou uma crosta mais leve
em tempos pós-hadeanos. O Intenso Bombardeio Tardio, se não foi tão
extensivo, teria apenas acelerado esse processo de evolução.
De
todos esses processos, tais como o rederretimento de parte da crosta
basáltica primitiva, acompanhada por metamorfismo e derretimento de
grandes quantias de sedimento, houve uma gradual formação de magmas
similares em composição aos granitos e portanto capazes de flutuar" em
basalto.
A Terra no Hadeano © Simone Marchi |
Fragmento
por fragmento a crosta continental nasceu, formada no começo de cadeias
de ilhas similares aos arcos vulcânicos de ilhas modernas, originando a
cobertura de terra externa do planeta. Esse novo tipo de crosta tinha
uma única característica de importância fundamental: sua baixa densidade
fazia com que ficasse "boiando" na superfície. Por isso era capaz de
passar por intensas transformações, tais como deformações mecânicas
(tectônicas) ou metamorfismo, mas sempre ficando na proximidade da
superfície. Embora a crosta basáltica primitiva tenha sido
permanentemente perdida, geólogos encontraram traços dos primeiros
contornos da crosta continental. Em 1938, no oeste da Austrália, foram
encontradas rochas mais antigas (exceto pelos cristais de zircônio)
conhecidas até hoje. Essas rochas datam de 4.2 bilhões de anos.
Incrivelmente, são arenitos! Isso significa que elas são derivadas da
erosão de outras rochas, ainda mais antigas!
Estando
formado o planeta, já começou a formar-se uma atmosfera primordial,
derivada do vapor de rocha originário do choque entre a Terra e outro
corpo celeste, o mesmo evento que originou a Lua. Esses vapores teriam
se condensado dentro de 2 mil anos, deixando para trás substâncias
voláteis quentes que provavelmente resultariam na nossa atmosfera.
Como
um resultado das altas temperaturas no centro da Terra, e devido à
intensa atividade vulcânica, a crosta também emitia gases halogênios,
amônia, hidrogênio, dióxido de carbono, metano, vapor de água e outros
gases. Nos 100 milhões de anos seguintes esses gases se acumularam e
formaram a atmosfera primordial.
A Terra e sua atmosfera primitiva © Don Dixon |
Essa
atmosfera era muito parecida com a atmosfera de Titan, uma das maiores
luas de Saturno. A atmosfera primordial atingiu, acredita-se, pressões
de 250 atmosferas e teria sido extremamente tóxica para a vida como
conhecemos. Mas, pouco a pouco nosso planeta assumiu um visual mais
familiar, com uma densa zona gasosa de nuvens que poderíamos chamar de
atmosfera, uma zona líquida com oceanos, lagos e rios, ou hidrosfera e
uma zona sólida, ou litosfera, com os primeiros contornos do que um dia
se tornariam continentes.
O planeta começa a se tornar familiar © Don Dixon |
O
processo de resfriamento e consolidação da superfície da Terra era
acompanhado, assim como ocorre em vulcões, por fortes liberações de
gases da nova atmosfera, formada essencialmente de metano (CH4),
hidrogênio (H2), nitrogênio (N2) e vapor de água, com menores quantias
dos gases nobres e dióxido de carbono. A maioria do hidrogênio, o
componente mais leve, escapava para o espaço, assim como ocorre hoje.
À medida que o resfriamento continuou, devido à subdução e dissolução na água do oceano, o CO2 foi
removido em sua maioria da atmosfera, mas os níveis oscilaram muito à
medida que novas superfícies se formavam e manto realizava seu ciclo.
A
Teoria da Terra Primitiva Fria trata de um período de tempo de 4.4 a 4
bilhões de anos. Se as placas tectônicas realmente estavam presentes
tão cedo quanto 4 bilhões de anos atrás o tempo em que a Terra terminou
sua transição de uma superfície quente e derretida com atmosfera cheia
de CO2 para
algo similar ao que é hoje pode ser datado em cerca de 4 bilhões de
anos. A ação das placas tectônicas e os oceanos aprisionam grandes
quantias de CO2, por isso eliminam o efeito estufa e resfriam a terra, permitindo a formação de rocha sólida e até de vida.
A lua e os mares primitivos © Don Dixon |
Até
o presente momento não há no registro fóssil nenhum indício de vida
animal, uma vez que as condições do planeta ainda estavam adequadas para
suportar este tipo de organismo. O inicio da vida em si só teria
ocorrido no próximo éon, o Arqueano e nem sequer ainda estava perto de
gerar animais verdadeiros, uma vez que a vida era exclusivamente (até
onde se sabe) unicelular.
Os depósitos sedimentares da Groenlândia incluem as famosas Banded Iron Beds (Camadas
listradas de Ferro). Elas possivelmente contém carbono orgânico e
implicam na possibilidade de que vida fotossintética já tivesse surgido
naquele tempo. No entanto, os fósseis mais antigos conhecidos, vindos
da Austrália, datam de aproximadamente 3,5 bilhões de anos, pertencendo
ao éon Arqueano e não ao Hadeano.
Até
o presente momento não há no registro fóssil nenhum indício de vida
vegetal, uma vez que as condições do planeta ainda estavam adequadas
para suportar este tipo de organismo. O inicio da vida em si só teria
ocorrido no próximo éon, o Arqueano.
Enfim.
Se você leu o texto todo até aqui, lhe agradeço e parabenizo pelo
interesse e dedicação. Escrevi o texto com carinho e esforço, embora não
seja uma área em que eu tenha muitos conhecimentos me esforcei de
buscar informações, tanto decritivas quanto visuais. Agradeço a todos os
artistas pelo uso das imagens. Algumas imagens não contém créditos,
pois não consegui encontrar as informações dos autores. Por favor, se
você é o autor ou sabe quem é, entre em contato.
Caso
prefira ter sua arte removida do texto, também pode entrar em contato
pelo formulário do blog, atenderei seu pedido com rapidez.
Thank
you all the artists for your artwork. Science becomes so much easier to
digest and is more fun with your talent involved. Some pictures and
artwork do not have copyright credit information. This is due the fact
that I could not find online any information regarding the author of
such work. If you know who the author/artist is, please let me know and
proper credit will be arranged.
If
you do wish your artwork or pictures removed from the page, please
contact me and I will arrange it's removal as soon as possible.
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