O que há de novo, Sistema Solar?
Evento aborda as descobertas mais importantes dos últimos
tempos realizadas nas cercanias de nosso planeta e as missões e
tecnologias que as tornaram possíveis.
Publicado em 04/06/2014
|
Atualizado em 04/06/2014
Embora os exoplanetas sejam o assunto do momento na
astronomia, nos últimos anos foram feitas muitas descobertas sobre
nossos vizinhos mais próximos, aqui mesmo no Sistema Solar. (ilustração:
Nasa)
Nos últimos anos, a grande sensação da astronomia tem sido os
exoplanetas, mundos fora do nosso sistema solar onde o homem busca
avidamente por possibilidades de vida na vastidão do cosmos. Mas, nas
cercanias da Terra, muitas descobertas importantes também têm acontecido
– e elas foram tema de um debate realizado no Planetário do Rio de
Janeiro no último sábado (31/05). Pesquisadores abordaram as missões
exploratórias que perambulam por nossas redondezas, trazendo muita
informação sobre os vizinhos mais próximos, e falaram sobre as
tecnologias que permitem um estudo mais profundo do espaço e um maior
entendimento sobre o passado do nosso pedacinho do universo.
Outro que começa a revelar seus segredos é Saturno, estudado pela missão Cassini-Huygens desde 2004. “Penetramos na atmosfera opaca de sua maior lua, Titan, o que revelou a existência de lagos e rios na superfície feitos de metano líquido, dada sua baixa temperatura”, destacou Ribas. “Recentemente também descobrimos que outra de suas luas, Encelador, tem um oceano interno aquecido e gêiseres na superfície.”
A Cassini também tem ajudado a entender a dinâmica de formação das muitas luas do planeta: uma imagem produzida este ano mostra o surgimento de um possível novo satélite, a partir dos destroços que compõem os anéis planetários.
Ribas destacou que o modelo ajuda a explicar diversos fatos misteriosos sobre nosso passado. “Nossa Lua apresenta evidências de grandes impactos 800 milhões de anos após a formação do Sistema Solar, bombardeio tardio que pode estar relacionado à interação com os planetas gigantes”, disse. “O mesmo processo aconteceu na Terra, mas as atividades geológicas posteriores apagaram as marcas desse período.”
O modelo também explicaria o tamanho reduzido de Marte, segundo o astrônomo. “Terra e Marte nasceram de uma nebulosa homogênea, então o esperado seria que tivessem tamanho parecido, mas a forte interferência de Júpiter ‘limpou’ a região e deixou Marte sem matéria para crescer”, explicou. “Na área entre esses protoplanetas, o puxão gravitacional gerava interações tão fortes que fragmentava qualquer corpo em formação, por isso, lá só existe um grande cinturão de asteroides nos dias de hoje.”
Nesse local remoto, um instigante enigma envolve as trajetórias inesperadas de dois objetos transnetunianos, o planetoide Sedna e outro similar observado este ano, únicos integrantes conhecidos da nuvem de Oort, área mais externa do Sistema Solar, após o Cinturão de Kuiper.
“Suas órbitas podem ter sido modificadas pela atração de outra estrela que fazia parte do mesmo aglomerado da nossa no passado”, ponderou Ribas. “Mas a anomalia também pode indicar a existência de outro planeta após a órbita de Netuno, com o tamanho da Terra ou mesmo de Júpiter.” Nesse caso, ele estaria tão distante do Sol que não refletiria luz suficiente para uma observação direta com os aparelhos atuais. “Essa resposta pode mudar nosso conhecimento sobre a formação de nosso sistema como um todo, trazendo novas restrições para o modelo de Nice, por exemplo.”
O estudo dos objetos transnetunianos também levou o grupo de Ribas a uma descoberta inédita, divulgada em 2014: a observação de um sistema de anéis estruturado ao redor de um pequeno objeto da classe dos centauros. “Pensávamos que só planetas maiores tinham anéis, mas é provável que existam muitos casos similares nessa região; temos até indícios de outro centauro com essa estrutura”, contou o astrônomo. “A novidade levanta muitas questões e até ajuda a entender melhor o ambiente em que se deu a formação do Sistema Solar: quando, como e sob quais condições se formaram os anéis?”
O campo não chega a ser novo: raios cósmicos são estudados desde o início do século 20, mas a tecnologia tornou a área muito mais promissora. “Nesse campo, estuda-se tudo que vem do espaço com alta energia e não é cometa, asteroide ou disco voador”, brincou. “Por exemplo: os próprios raios cósmicos, partículas solares, neutrinos cósmicos e raios gama.”
Para tanto, temos empregado alguns dos equipamentos mais complexos e avançados de nossos tempos. Entre eles, Shellard destacou as longevas sondas Voyager, que há pouco ‘deixaram’ os limites do Sistema Solar, o Espectômetro Magnético Alpha, aparelho de 2,5 bilhões de dólares acoplado à Estação Espacial Internacional, o Observatório de Neutrinos IceCube, com sensores enterrados dois quilômetros no gelo antártico, e o telescópio de raios-gama Fermi, que estuda as emissões de nossa galáxia. A América do Sul tem destaque no campo: pelas ótimas condições de visualização, suas regiões desérticas têm recebido diversos projetos recentes e em construção, muitos deles com participação brasileira.
Para Felipe Ribas, os próximos anos reservam muitas novidades sobre o Sistema Solar, como a caracterização e o maior entendimento de objetos mais afastados, que podem revelar detalhes sobre nosso próprio passado. “Em 2015, por exemplo, a sonda New Horizons passará por Plutão e poderá nos trazer mais dados sobre este e outros planetas anões”, afirmou. “O avanço nas pesquisas pode ajudar, ainda, a entender peculiaridades do nosso sistema em relação a outros que vierem a ser descobertos na busca por exoplanetas e a começar a esclarecer grandes mistérios atuais da astronomia, como a matéria e a energia escuras.”
Marcelo Garcia
Ciência Hoje On-line
Ribas: “A grande questão sobre Marte é a presença
de água: será que já houve rios e mares por lá? O que aconteceu com
eles? E ainda existe água líquida no subsolo do planeta?”
O astro mais popular de nossa região no momento é Marte, que já
recebeu diversas sondas robóticas (como a Opportunity e a Curiosity) e
satélites artificiais. “A grande questão sobre Marte é a presença de água: será que já houve rios e mares por lá?
O que aconteceu com eles? E ainda existe água líquida no subsolo do
planeta?”, indagou o astrônomo Felipe Braga Ribas, do Observatório
Nacional, no II Encontro de Ciências do Universo, realizado pelo Núcleo
de Pesquisa de Ciência (Nupesc). “Já sabemos da existência de sedimentos associados à presença de água, de gelo e de outros sinais positivos sobre essa questão, por exemplo.”Outro que começa a revelar seus segredos é Saturno, estudado pela missão Cassini-Huygens desde 2004. “Penetramos na atmosfera opaca de sua maior lua, Titan, o que revelou a existência de lagos e rios na superfície feitos de metano líquido, dada sua baixa temperatura”, destacou Ribas. “Recentemente também descobrimos que outra de suas luas, Encelador, tem um oceano interno aquecido e gêiseres na superfície.”
A Cassini também tem ajudado a entender a dinâmica de formação das muitas luas do planeta: uma imagem produzida este ano mostra o surgimento de um possível novo satélite, a partir dos destroços que compõem os anéis planetários.
Origens
O processo de formação do nosso sistema como um todo, aliás, tem sido alvo de muitos estudos. Os astrônomos têm trabalhado, por exemplo, com o chamado modelo de Nice, uma simulação que tenta explicar os primórdios de nossa vizinhança espacial e segundo a qual os planetas começaram a se formar muito mais próximos uns dos outros do que estão hoje, mas foram espalhados pela influência dos gigantes Júpiter e Saturno.Ribas destacou que o modelo ajuda a explicar diversos fatos misteriosos sobre nosso passado. “Nossa Lua apresenta evidências de grandes impactos 800 milhões de anos após a formação do Sistema Solar, bombardeio tardio que pode estar relacionado à interação com os planetas gigantes”, disse. “O mesmo processo aconteceu na Terra, mas as atividades geológicas posteriores apagaram as marcas desse período.”
O modelo também explicaria o tamanho reduzido de Marte, segundo o astrônomo. “Terra e Marte nasceram de uma nebulosa homogênea, então o esperado seria que tivessem tamanho parecido, mas a forte interferência de Júpiter ‘limpou’ a região e deixou Marte sem matéria para crescer”, explicou. “Na área entre esses protoplanetas, o puxão gravitacional gerava interações tão fortes que fragmentava qualquer corpo em formação, por isso, lá só existe um grande cinturão de asteroides nos dias de hoje.”
Um nono planeta de novo?
O pesquisador, que estuda os chamados objetos transnetunianos (que orbitam além da órbita de Netuno), também falou sobre novidades dos limites do Sistema Solar. A última década trouxe a descoberta de diversos corpos nessa região, como os planetas anões Makemake, Haumea e Éris (o maior deles, cujo tamanho similar ao de Plutão selou seu ‘rebaixamento’ à mesma categoria).Nesse local remoto, um instigante enigma envolve as trajetórias inesperadas de dois objetos transnetunianos, o planetoide Sedna e outro similar observado este ano, únicos integrantes conhecidos da nuvem de Oort, área mais externa do Sistema Solar, após o Cinturão de Kuiper.
“Suas órbitas podem ter sido modificadas pela atração de outra estrela que fazia parte do mesmo aglomerado da nossa no passado”, ponderou Ribas. “Mas a anomalia também pode indicar a existência de outro planeta após a órbita de Netuno, com o tamanho da Terra ou mesmo de Júpiter.” Nesse caso, ele estaria tão distante do Sol que não refletiria luz suficiente para uma observação direta com os aparelhos atuais. “Essa resposta pode mudar nosso conhecimento sobre a formação de nosso sistema como um todo, trazendo novas restrições para o modelo de Nice, por exemplo.”
O estudo dos objetos transnetunianos também levou o grupo de Ribas a uma descoberta inédita, divulgada em 2014: a observação de um sistema de anéis estruturado ao redor de um pequeno objeto da classe dos centauros. “Pensávamos que só planetas maiores tinham anéis, mas é provável que existam muitos casos similares nessa região; temos até indícios de outro centauro com essa estrutura”, contou o astrônomo. “A novidade levanta muitas questões e até ajuda a entender melhor o ambiente em que se deu a formação do Sistema Solar: quando, como e sob quais condições se formaram os anéis?”
Sem ‘sair de casa’
O mais curioso desses avanços é que, nos últimos 40 anos, nenhum humano ultrapassou a órbita da Terra; mesmo assim, estamos cada vez mais inteirados de nossa vizinhança. Sondas, satélites e telescópios têm espalhado a presença humana por todo o sistema e utilizado as mais novas tecnologias para perscrutar o espaço de forma inédita – tanto é que um novo campo da física se destaca nos dias de hoje, o estudo das astropartículas.
Sondas, satélites e telescópios têm espalhado a presença humana por todo
o sistema e utilizado as mais novas tecnologias para perscrutar o
espaço de forma inédita
“O excesso de poeira na Via Láctea torna o espectro visível menos
interessante do que outros comprimentos de onda e, nas últimas décadas,
aprendemos a olhar dessas formas alternativas para o espaço”, avaliou o
físico Ronald Shellard, pesquisador do Centro Brasileiro de Pesquisas
Físicas que também participou do evento.O campo não chega a ser novo: raios cósmicos são estudados desde o início do século 20, mas a tecnologia tornou a área muito mais promissora. “Nesse campo, estuda-se tudo que vem do espaço com alta energia e não é cometa, asteroide ou disco voador”, brincou. “Por exemplo: os próprios raios cósmicos, partículas solares, neutrinos cósmicos e raios gama.”
Para tanto, temos empregado alguns dos equipamentos mais complexos e avançados de nossos tempos. Entre eles, Shellard destacou as longevas sondas Voyager, que há pouco ‘deixaram’ os limites do Sistema Solar, o Espectômetro Magnético Alpha, aparelho de 2,5 bilhões de dólares acoplado à Estação Espacial Internacional, o Observatório de Neutrinos IceCube, com sensores enterrados dois quilômetros no gelo antártico, e o telescópio de raios-gama Fermi, que estuda as emissões de nossa galáxia. A América do Sul tem destaque no campo: pelas ótimas condições de visualização, suas regiões desérticas têm recebido diversos projetos recentes e em construção, muitos deles com participação brasileira.
Para Felipe Ribas, os próximos anos reservam muitas novidades sobre o Sistema Solar, como a caracterização e o maior entendimento de objetos mais afastados, que podem revelar detalhes sobre nosso próprio passado. “Em 2015, por exemplo, a sonda New Horizons passará por Plutão e poderá nos trazer mais dados sobre este e outros planetas anões”, afirmou. “O avanço nas pesquisas pode ajudar, ainda, a entender peculiaridades do nosso sistema em relação a outros que vierem a ser descobertos na busca por exoplanetas e a começar a esclarecer grandes mistérios atuais da astronomia, como a matéria e a energia escuras.”
Marcelo Garcia
Ciência Hoje On-line
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