terça-feira, 3 de julho de 2012

Sem clima para utopia


ECO 92 X RIO+20

Sem clima para utopia

Há 20 anos, a retórica ambientalista seduzia com a promessa do novo; como repetir o êxito daquele encontro em um mundo em crise nada propenso a discutir o futuro?

Adi Leite - 19.jan.92/Folhapress


ANDREA VIALLI
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA



Vinte anos depois da Eco-92, o Rio de Janeiro se prepara para ser palco de um novo encontro de líderes internacionais, que discutirão como conciliar preservação ambiental e desenvolvimento econômico.
A conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, mais conhecida como Rio+20, é a quarta filha de uma série de cúpulas da ONU sobre ambiente iniciada em 1972, em Estocolmo, Suécia.
Depois, vieram a Eco-92, que resultou em vários acordos importantes, como as convenções sobre mudanças climáticas, biodiversidade e a Agenda 21.

Em 2002, foi realizada a Rio+10, em Johannesburgo, África do Sul, com o intuito de fazer um balanço dos avanços obtidos até então. Agora, a Rio+20 promete uma agenda ainda mais ampla -o que já vem sendo alvo de críticas.

O tema central da conferência é a transição para a economia verde, que propõe a adoção de um novo sistema produtivo, com base na baixa emissão de poluentes, na eficiência no uso dos recursos naturais e na erradicação da pobreza. O segundo tema que será discutido é governança global: como os países se organizarão, em termos de acordos, protocolos e instituições, para colocar esse novo modelo em prática.
O governo brasileiro e a ONU esperam repetir o sucesso da Eco-92, quando 108 chefes de Estado e 17 mil ativistas de ONGs colocaram o Rio de Janeiro sob os holofotes da mídia mundial. Segundo o Itamaraty, mais de 130 países confirmaram presença e o Rio se prepara para abrigar 50 mil visitantes.

As atividades paralelas à conferência começam no dia 13 de junho e estão espalhadas por uma dezena de locais, como Aterro do Flamengo, Forte de Copacabana e Píer Mauá. O Riocentro, mesmo local que abrigou a Eco-92, sediará a cúpula propriamente dita, com os chefes de Estado, de 20 a 22 de junho.
Apesar das ambições do governo de atrair o maior número de chefes de Estado para a Rio+20, é notório que a conferência ocorre em um momento geopolítico crítico. Com 7 bilhões de pessoas, nunca se falou tanto nos limites físicos do planeta. No entanto, falta vontade política para discutir o futuro.

"As lideranças dos países ricos estão mais preocupadas em resolver seus problemas econômicos deflagrados pela grave crise que teve início em 2008, no mercado imobiliário americano, com reflexos posteriores nos países europeus", afirma Maurice Strong, ex-secretário-geral da Eco-92 e hoje professor da Universidade de Pequim.

Ao mesmo tempo, potências emergentes, como Brasil, China, Rússia e Índia, saboreiam o crescimento e a nova importância que ganharam no contexto mundial.

Aos 83 anos e prestes a carimbar o passaporte rumo à Rio+20, Strong é enfático: a cúpula não produzirá tantos acordos relevantes como produziu a Eco-92.

"A Rio+20 atrairá muita gente e muita atenção, mas questões políticas e econômicas vão dificultar que obtenhamos progresso. Não será dessa vez que veremos nascer novos acordos", diz.

Em 1992, o cenário era bem diferente. O fim da Guerra Fria, cujo símbolo foi a queda do Muro de Berlim, em 1989, deixou o mundo menos polarizado e mais aberto a novas ideias. A retórica ambientalista ganhou força com a publicação do Relatório Brundtland, de 1987, que definiu o desenvolvimento sustentável como "aquele que atende as necessidades presentes sem comprometer a capacidade das gerações futuras se desenvolverem".

PEGADA MAIOR
 
Hoje, mais do que em 1992, a ciência comprova o agravamento da crise ambiental. No campo das mudanças climáticas, já é dado como certo que a temperatura vai subir mais de 2 graus centígrados, por causa da concentração de CO2 na atmosfera.

A demanda por recursos naturais dobrou desde a década de 1960 e a biodiversidade encolheu 30% em todo o mundo entre 1970 e 2008, vítima do avanço das atividades humanas, como agricultura, pesca e mineração, sobre florestas e oceanos.

"A ciência traz evidências de que não estamos em uma situação muito confortável. No entanto, é alto o risco de que a Rio+20 produza um documento final fraco, sem objetivos concretos", diz o ex-ministro do Meio Ambiente Rubens Ricúpero.

A percepção de que os resultados da conferência serão enfraquecidos vem da posição do governo, que tenta dar mesmo peso às questões sociais, ambientais e econômicas -o "tripé" da sustentabilidade.
Além disso, o "Rascunho Zero", esboço do documento final da cúpula, não se aprofunda em nenhum tema específico. Há muitos itens entre colchetes (o que indica falta de consenso) e poucas sugestões concretas.
Um dos poucos pontos próximos de um acordo global é a criação dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável, um conjunto de metas sociais e ambientais a serem perseguidas a partir de 2020.

O Brasil, anfitrião, defende que o mérito da Rio+20 será traçar um plano de ação rumo à economia verde para o próximos anos. "Teremos um documento político, reafirmando o compromisso dos países rumo a um desenvolvimento inclusivo e com tecnologias limpas", diz o embaixador André Corrêa do Lago, negociador-chefe do Brasil. "A Rio+20 vai marcar mais o início de processos do que a conclusão deles", diz.


Cr$ 2.000

Para comemorar a Eco-92, o governo Collor lançou uma moeda de prata no valor de 2.000 cruzeiros; vendida hoje por R$ 100 no site do Banco Central, tem na face a figura de um beija-flor e no verso a imagem do Pão de Açúcar.
5,5 bilhões

Em 1992, um relógio colocado na sede da cúpula no Riocentro contabilizava a população mundial e a quantidade de terra disponível no planeta para cultivo de alimentos.

Folha de S.Paulo
05/06/2012 

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