Menos mata, menor deslocamento
Em matas fragmentadas, dispersão espacial do mico-leão-dourado cai de oito para 2 km
Laboratório de Ecologia Espacial e Conservação (LEEC) - UNESP
20/06/2018
O
mico-leão-dourado, um dos símbolos da biodiversidade da Mata Atlântica,
sofre com a fragmentação das florestas e tem sua movimentação e fluxo
gênico reduzidos. É o que reporta um estudo recém publicado na revista “Biological Conservation”,
uma das principais revistas de conservação no mundo. O estudo ocorreu
na Bacia do Rio São João, estado do Rio de Janeiro, e foi realizado
por pesquisadores da UENF, Associação Mico-Leão-Dourado (AMLD), UNESP e
UFSCar.
O mico-leão-dourado, Leontopithecus rosalia,
é um primata endêmico da Mata Atlântica. Sua área de ocorrência é
restrita à remanescentes florestais na Bacia do Rio São João, que fica
no estado do Rio de Janeiro, em uma região altamente fragmentada. A
espécie quase foi extinta na década de 80, quando menos de 400
indivíduos ocorriam em vida livre. Hoje, há mais de 3200 indivíduos
vivendo na natureza, graças a um projeto de conservação atualmente
liderado pela AMLD, UENF e seus parceiros.
Para salvar a espécie da extinção foram
realizadas as seguintes ações: (1) a reintrodução de micos nascidos em
cativeiro para a vida livre e (2) a translocação de grupos sociais
isolados em fragmentos florestais no litoral do Rio de Janeiro para a
Reserva Biológica da União. Até momento, porém, permanecia uma questão
em aberto que dificultava o avanço dos programas de conservação: O
mico-leão-dourado é capaz de dispersar por áreas abertas, tais como
estradas e pastagens?
“Entender como o mico-leão-dourado se
dispersa através da paisagem é importante para a elaboração de medidas
de restauração florestal”, comenta Andréia Magro Moraes, pesquisadora da
UENF e pós-doc da UNESP, responsável pelo estudo. “Por diversas vezes, a
implementação de corredores florestais que facilitam o movimento dos
animais pode demandar um alto investimento financeiro e a desão social.
Por isso, é importante que os elementos da paisagem que representam
barreiras para a dispersão de uma espécie, sejam identificados”,
complementa Moraes.
Do mesmo modo, a distância em que um
elemento da paisagem impede a dispersão, também deve ser quantificada.
Uma vez restabelecida a conectividade entre os remanescentes florestais,
os organismos são capazes de se dispersar com mais facilidade na
paisagem, garantindo o fluxo gênico interpopulacional e permitindo sua
persistência na região.
Ferramentas e metodologia de pesquisa
Para entender como o mico-leão-dourado se dispersa em uma paisagem fragmentada, o estudo usou ferramentas de genética da paisagem e medidas de fluxo gênico. O DNA de 201 micos-leões-dourados de 48 grupos sociais foi extraído de amostras de pelos e investigado. A coleta das amostras de pelos – uma tarefa que exige muita experiência, pois envolve o contato direto com os animais na natureza – foi realizada por profissionais experientes da AMLD. “Nesses 30 anos temos realizado muitos estudos com o mico. É gratificante ver que nossas milhares de horas de campo tem sido recompensadas com os avanços científicos e novas oportunidades para a espécie”, comenta Andréia Martins especialista de campo da AMLD.
As amostras de pelos foram enviadas para o
Laboratório de Biodiversidade Molecular e Conservação da UFSCar, onde
foram extraídos todos os DNAs para possibilitar as análises
genéticas.“Caracterizar geneticamente os micos nos permite conhecer as
semelhanças e diferenças de suas populações. Essas semelhanças e
diferenças nos dão um indicativo de como esses animais estão se movendo
ou não pela paisagem”, reporta Pedro Galetti, professor da UFSCar e
responsável pelas análises genéticas.
Até onde o mico consegue chegar?
Após caracterizar geneticamente os animais, foram realizadas as análises espaciais. Utilizando um arsenal de mapas, imagens e ferramentas computacionais sofisticadas como o LSCorridors (do inglês “Landscape Corridors”), foram simulados corredores ecológicos para compreender como os micos estão se dispersando pela Bacia do Rio São João. Com o resultado, foi observado que os micos-leões-dourados se movem mais frequentemente dentro de seu território e vizinhança por distâncias em torno de 2 km. Porém, se a paisagem estiver bem conectada e for permeável para seu movimento, eles podem alcançar longas distâncias de dispersão, por volta de 8 km.
Após caracterizar geneticamente os animais, foram realizadas as análises espaciais. Utilizando um arsenal de mapas, imagens e ferramentas computacionais sofisticadas como o LSCorridors (do inglês “Landscape Corridors”), foram simulados corredores ecológicos para compreender como os micos estão se dispersando pela Bacia do Rio São João. Com o resultado, foi observado que os micos-leões-dourados se movem mais frequentemente dentro de seu território e vizinhança por distâncias em torno de 2 km. Porém, se a paisagem estiver bem conectada e for permeável para seu movimento, eles podem alcançar longas distâncias de dispersão, por volta de 8 km.
“Temos observado que a conectividade da
paisagem é um dos fatores mais importante para a conservação da
biodiversidade em regiões fragmentadas” comenta Milton Ribeiro, do
Laboratório de Ecologia Espacial e Conservação da UNESP, e também autor
do artigo. “Desta forma, se estamos juntos na luta pelo mico, temos que
fazer muito mais, como restaurar conexões importantes entre os
principais remanescentes e garantir que as principais estradas que
cruzam a região permitam o fluxo de indivíduos” complementa Ribeiro.
Além da estrutura da paisagem, o manejo
populacional realizado pela AMLD, que inclui medidas de reintrodução e
translocação, também influenciou a estrutura genética populacional do
mico-leão-dourado. Assim, os resultados dessa pesquisa indicam que o
fluxo gênico mediado pelo homem (manejo) pode aumentar a variabilidade
genética interpopulacional. No entanto, se as populações de micos
permanecerem isoladas, devido aos efeitos da fragmentação do habitat,
todos os esforços de conservação empenhados para garantir sua
viabilidade populacional ao longo do tempo podem ser perdidos. Barreiras
para a conectividade da paisagem tais como estradas com intenso
tráfego, rios, perímetros urbanos, estradas pavimentadas simples,
pastagens, agricultura, entre outros fatores, têm dificultado a
dispersão dos micos-leões dourados, nessa ordem de intensidade. Assim, é
esperado que alguns elementos da paisagem afetem mais drasticamente a
dispersão dos micos-leões-dourados, enquanto que outros podem permitir o
fluxo de indivíduos em curtas distâncias (por exemplo, até 100 m no
pasto).
Dentre as principais ameaças para o mico
destaca-se a duplicação da BR-101, que já divide populações importantes
de micos e de muitas outras espécies. Com sua duplicação, muito
provavelmente, as populações ao norte e sul da BR-101 serão isoladas
permanentemente, o que pode comprometer todo um trabalho de conservação
da espécie. Em uma parceria AMLD-UENF-ICMBio e a empresa que gerencia a
rodovia, foram propostas “passagens de fauna” em pontos importantes para
o fluxo do mico, buscando assim, minimizar os impactos sobre aespécie.
“Cabe saber agora, se tanto o mico como
outras espécies utilizarão tais passagens” comenta Carlos Ruiz-Miranda,
professor da UENF e um dos principais pesquisadores do
mico-leão-dourado. Atualmente, o projeto Mico-Leão-Dourado teve um
projeto de longo prazo aprovado pela Petrobras,que permitirá compreender
se as passagens funcionarão ou não. “Monitorar o uso dessas travessias
está entre nossas principais tarefas para os próximos anos e quantificar
a eficiência dessas passagens é um de nossos objetivos”, finaliza Ruiz.
O estudo contou com o apoio e financiamento da CAPES, CNPq e FAPESP.
Para saber mais:
https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0006320717311151https://github.com/ LEEClab/Landscape_genetics_GoldenLionTamarins
Para saber mais:
https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0006320717311151https://github.com/ LEEClab/Landscape_genetics_GoldenLionTamarins
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