A seca e o desmatamento
Pesquisador alerta para os fatores que podem ter
influenciado a queda atual no padrão de chuvas no Sudeste, como a
destruição da floresta amazônica e o aquecimento global, e cobra mudança
na posição brasileira em relação a questões ambientais.
Publicado em 04/03/2015
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Atualizado em 04/03/2015
O desmatamento na Amazônia e os efeitos do aquecimento
global podem ter influenciado a drástica seca que atinge o Sudeste
atualmente. (foto: Freeimages.com)
A ligação entre a reciclagem de água pela floresta amazônica e o transporte de vapor d’água do Norte do país para o Sudeste, nos chamados ‘rios voadores’, é bem documentada. Escrevi sobre esse tema na Ciência Hoje há uma década (‘A água de São Paulo e a floresta amazônica’, em CH 203). No entanto, a redução das chuvas no Sudeste, este ano, é muito desproporcional em relação ao aumento da área desmatada de 2013 para 2014. Algum tipo de quebra nos jatos de nível baixo – ventos que transportam vapor d’água na baixa atmosfera – poderia explicar a diferença, mas os dados existentes não permitem afirmar que isso aconteceu.
A ligação entre a reciclagem de água pela floresta amazônica e o
transporte de vapor d’água do Norte do país para o Sudeste, nos chamados
‘rios voadores’, é bem documentada
Apesar da incerteza sobre as causas da seca, é importante aprender as lições que essa ocorrência nos ensina. A primeira lição diz respeito ao ‘desenvolvimento’ da Amazônia: se este continuar a seguir o curso atual, com planos para a construção de rodovias, barragens e outras estruturas que contribuem para o desmatamento, e com subsídios para a destruição da floresta, em uma larga gama de políticas perversas, faltará água, sim, em São Paulo. Nesse caso, porém, a falta não estará associada apenas a uma variação de chuvas de um ano para outro: será permanente.
Já a segunda lição está ligada aos efeitos do aquecimento global. A variabilidade climática dita ‘natural’ vem aumentando devido a esse aquecimento. Isso significa que eventos extremos do clima, como secas e inundações, serão cada vez mais severos e mais frequentes, em comparação com os padrões históricos.
Fica evidente a necessidade não apenas de adaptação às novas condições, mas também de luta contra o chamado efeito estufa
Espera-se que os eventos atuais – como a drástica seca em São Paulo – levem a uma mudança na posição brasileira em relação às mudanças climáticas: com isso, o país assumiria um papel de liderança nessa questão, em vez de adotar a estratégia de ser o último a ‘entrar no bonde’. Essa mudança estaria fortemente vinculada ao interesse nacional, porque o Brasil está entre os países que mais sofrerão se uma redução nas emissões globais não acontecer a tempo.
Philip M. Fearnside
Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa)
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