Na Europa, aumento na população de chacais preocupa pesquisadores
Quase desconhecida no continente, a espécie agora ultrapassa o número de lobos e está se espalhando rapidamente
James Gorman, The New York Times
21 Janeiro 2019 | 06h00
21 Janeiro 2019 | 06h00
Sobre
uma colina acima de Trieste, na Itália, no limite ocidental da
Eslovênia, chacais dourados uivam. Miha Krofel, biólogo conservacionista
da Universidade de Ljubljana, na Eslovênia, mais uma pesquisava em
estradas rurais. Na noite anterior, o dr. Krofel e dois pesquisadores
voluntários - um deles fotógrafo, que se tornara uma espécie de
especialista em chacais - visitaram quatro locais onde Krofel ouvira
chacais.
Em cada lugar, eles tocaram a gravação de um bando de
chacais uivando e ficaram esperando cinco minutos por uma resposta.
Tocaram de novo. E esperaram. Repetiram o chamado três ou quatro vezes
em cada lugar.
Segundo
Krofel, os chacais estavam na área. Ele e outros 37 voluntários -
cientistas e naturalistas - monitoram os animais em toda a Europa. A
iniciativa é dirigida por Miha Krofel e Nathan Ranc, que faz doutorado
na Universidade Harvard e na Edmund Mach Foundation, no norte da Itália.
Atualmente, a população de chacais na Europa é muito mais
numerosa do que a de lobos, totalizando cerca de 117 mil indivíduos,
segundo a mais recente estimativa. Uma estimativa otimista do número de
lobos na Europa chega a cerca de 17 mil. A Eslovênia tem de 200 a 400
chacais, calcula Krofel, e cerca de 75 lobos.
Trata-se de um
aumento nunca visto deste predador de tamanho médio em um continente que
outrora ele habitava somente nas margens. E só agora começou a
despertar o interesse dos cientistas na Europa, que neste momento se
deparam com o que este aumento significa em termos ecológicos, e com as
questões implícitas quanto à conservação e à sua situação legal.
Até
então, os chacais causavam algum problema para apenas os pastores de
ovelhas. Resta saber como os animais serão recebidos pelo público em
geral com o crescimento de sua população.
O chacal dourado pesa
em média nove quilos e é nativo do Oriente Médio e do Sul da Ásia. A
espécie chegou à fronteira meridional da Europa central e oriental há
cerca de 8 mil anos, segundo sugerem evidências fósseis, e começou a se
expandir lentamente no século 19. Mas na realidade, o atual boom teve
início nos anos 1950 e acelerou nos últimos 20 anos.
O animal é
um dos predadores caninos menos estudados. Como os lobos e os coiotes,
os chacais vivem em matilhas familiares, mas os grupos tendem a ser
menores, com quatro a seis animais, enquanto as matilhas de lobos podem
chegar a 15 indivíduos. Um casal monogâmico de chacais constitui o
núcleo da matilha; os jovens podem ficar com os pais ou ir embora para
formar as próprias matilhas.
Populações consideráveis de chacais
vivem atualmente em diversos países europeus, como Grécia, Eslovênia,
Croácia, Hungria, Romênia, Ucrânia, Áustria, Itália e acima de tudo na
Bulgária, onde vive a população maior.
Os cientistas acreditam que
começaram a se deslocar em direção ao norte por causa da entrada em
vigor de medidas de erradicação dos lobos, particularmente nos Bálcãs.
Isso contribuiu para abrir uma porta, porque os chacais aparentemente
evitam as áreas habitadas por lobos.
A mudança climática não
parece ter sido um fator importante, embora provavelmente passe a ser
significativo no futuro. Os chacais não vivem em lugares onde a neve
permanece no solo por mais de 100 dias por ano. À medida que o calor se
mantém e a camada de neve declina, abre-se para eles um território
europeu mais amplo.
Em Senozece, no sudoeste da Eslovênia, o
pastor de ovelhas Leon Franetic disse que aprendeu a conviver com alguns
predadores. "Nós nos acostumamos com os lobos, porque uma matilha
vagava nas proximidades".
Mas os chacais tornaram-se predadores
caninos excessivamente numerosos. Nos últimos três anos, os ataques de
lobos diminuíram, enquanto os chacais estão matando as ovelhas. Em 2017,
Franetic contou que perdeu de 20 a 25 ovelhas.
Ao mesmo tempo,
em Trieste, Krofel tocava as gravações de chacais. Não houve qualquer
resposta aos primeiros uivos da gravação. Mas imediatamente depois da
segunda, ouviu-se um uivo fraco, e depois outro, mais próximo. Então,
por cerca de meio minuto alguns chacais alternaram seus uivos distantes.
Como é difícil distinguir os uivos individualmente à distância, Krofel e
seus colegas contam os chacais da seguinte maneira: "Um, dois, mais de
dois", disse.
Quando os chamados foram se extinguindo, ele suspirou aliviado. "Finalmente".
Estes
chacais constituíram uma matilha e estão se reproduzindo. E suas crias
têm todas as chances de constituírem, por sua vez, novas matilhas à
medida que se deslocam na Europa ocidental.
"Quem poderia
imaginar que este pequeno canídeo seria o provável sobrevivente de
campanhas de envenenamento de lobos nos Bálcãs?", disse Ranc.
Mas
na Europa Ocidental, a reação à sua presença poderá ser diferente.
Talvez medidas mais rigorosas para a disposição do lixo e o descarte do
gado morto nas fazendas venha a ter um impacto sobre os animais.
Caçadores que procuram caça de pequeno porte poderão se opor à chegada
dos chacais. O que acontecer quando estas populações crescerem mostrará
até que ponto a Europa está aberta a elas.
Para os chacais dourados da Europa, segundo Ranc, "Logo chegará a hora da verdade"
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