Estudo descarta chegada de humanos às Américas pelo Estreito de Bering
Pesquisa aponta que rota só seria 'biologicamente viável' mais de 400 anos após chegada dos primeiros povos; hipótese é de caminho pela orla do Pacífico
Fábio de Castro, O Estado de S. Paulo
10 de agosto de 2016 | 19h55
A
principal teoria para explicar como os humanos chegaram às Américas é
inviável do ponto de vista biológico, de acordo com um novo estudo
realizado por um grupo internacional de cientistas e publicado nesta
quarta-feira, 10, na revista Nature.
Por
muito tempo, a ciência considerou que a rota mais provável das
populações que saíram da Sibéria e chegaram ao atual Alasca para se
espalharem pelo continente americano, há pelo menos 13 mil anos, teria
sido uma ponte terrestre que ligava a Ásia à América do Norte, onde hoje
fica o Estreito de Bering.
Com
a última glaciação chegando ao fim, a retração de duas enormes geleiras
que cobriam essa área teria formado um corredor - na região oeste do
atual Canadá -, que teria permitido a passagem dos povos asiáticos,
antes que a elevação do nível do mar deixasse o caminho submerso,
formando o Mar de Bering.
O novo estudo, no entanto, aponta que o
corredor entre as geleiras, formado há 15 mil anos, não poderia ter sido
atravessado antes de 12,6 mil anos atrás, já que não era colonizado por
plantas e animais, impossibilitando a longa viagem migratória. A
conclusão da pesquisa é que esse não foi o caminho dos primeiros povos
que chegaram à América, já que existem vestígios que confirmam a
presença humana no continente há pelo menos 13 mil anos.
De acordo
com os autores do estudo, coordenado por Eske Willerslev, da
Universidade de Copenhague (Dinamarca), a hipótese mais plausível agora é
que os povos da Ásia tenham migrado para a América viajando ao longo da
costa do Oceano Pacífico - pela orla, ou por mar. Além dos
pesquisadores dinamarqueses, o grupo inclui cientistas do Canadá, Reino
Unido e Estados Unidos.
"Embora o corredor físico já estivesse
aberto há 13 mil anos, apenas vários séculos depois tornou-se possível
usá-lo como passagem. Isso significa que os primeiros povos a entrar nas
Américas devem ter tomado uma rota diferente. Eles simplesmente não
poderiam passar pelo corredor, como foi alegado por muito tempo",
declarou Willerslev.
"O que
ninguém havia estudado até agora é quando o corredor se tornou
biologicamente viável. Sem plantas e animais disponíveis, como eles
poderiam ter sobrevivido à longa e difícil viagem por aquele caminho?",
disse Willerslev. O cientista afirmou, no entanto, que a passagem pode
ter sido usada mais tarde, em migrações mais recentes.
Análise
genética. Para descobrir que não existiam plantas ou animais no corredor
por onde teria passado a onda migratória, os cientistas analisaram os
sedimentos no fundo dos lagos Charlie e Spring, nas províncias de
British Columbia e Alberta, no Canadá. As duas regiões são as últimas
áreas do corredor a terem ficado livres do gelo que o bloqueava.
A
partir dos sedimentos locais, os cientistas conseguiram reconstruir a
história do ambiente local, analisando o DNA de animais e plantas que
viveram ali no passado. A análise demonstrou que a paisagem só começou a
ser colonizada por vegetação há 12,6 mil anos. Só a partir de então
começaram a aparecer animais, incluindo bisões e mamutes, que foram
essenciais na dieta dos caçadores que migraram para as Américas.
Com
a hipótese da migração pelo corredor descartada, os cientistas
acreditam que o caminho mais provável para os primeiros colonizadores
das Américas tenha sido uma travessia ao longo da orla do Oceano
Pacífico, caminhando pelas margens livres de gelo e expostas pelos
baixos níveis do mar naquela época, ou por navegação costeira.
A
hipótese, no entanto, será de difícil confirmação, porque as linhas
costeiras da América do Norte naquela época foram inundadas com a
elevação do nível do mar, após o fim da última glaciação, deixando as
evidências arqueológicas submersas.
https://ciencia.estadao.com.br/noticias/geral,estudo-descarta-chegada-de-humanos-as-americas-pelo-estreito-de-bering,10000068506
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