Geólogos descobrem fósseis de 29 animais em cavernas na Bahia
Eles são todos do Pleistoceno – o período retratado no filme "A Era do Gelo". E, por sorte, já haviam sido extraídos do chão pela erosão. Era só pegar.
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4 abr 2019, 19h53 - Publicado em 4 abr 2019, 16h48
Duas cavernas com 7 km de túneis cada uma,
nas redondezas do pequeno município de Serra do Ramalho, no sudoeste da
Bahia, contêm fósseis de 29 animais que viveram no Pleistoceno – o
período geológico imediatamente anterior ao atual, que vai de 2,5
milhões a 11 mil anos atrás.
Os ossos foram coletados entre 2012 e 2014 e analisados por
pesquisadores do Serviço Geológico do Brasil, em parceria com as
universidades federais do Paraná (UFPR) e do estado do Rio de Janeiro
(Unirio). Os resultados estão neste artigo científico. Os 450 fragmentos estão guardados no Museu de Ciências da Terra (MCTer), no Rio de Janeiro.
O Pleistoceno faz parte do imaginário popular: nele ocorreu o evento de glaciação mais recente, que é representado na animação A Era do Gelo.
Mamíferos como preguiças e capivaras gigantes são dessa época, bem como
tigres dentes-de-sabre, mastodontes e rinocerontes lanudos – peludos de
grande porte que foram extintos em parte graças a mudanças climáticas,
em parte por causa de predadores de outra espécie: o Homo sapiens.
Tudo começou em 2011, quando pesquisadores do CPRM (sigla pela qual é
conhecido o Serviço Geológico) analisavam cavernas de nove municípios
do sudoeste da Bahia. É sempre bom ficar de olho em fósseis nessas
situações – às vezes eles dão as caras em locais inexplorados –, mas
encontrá-los não era o objetivo principal do levantamento.
Calhou que, em duas das cavernas, havia fósseis. Muitos. E eles
sequer precisaram ser escavados: já estavam expostos graças a uma
ajudinha da mãe Natureza.
“As cavernas da região costumam apresentar muitas fendas e
claraboias, por onde a água da chuva penetra e forma pequenos córregos,
que não correm com muita energia”, explica Rafael Silva, pesquisador do
CPRM que conversou com a SUPER. “Esses córregos causam uma erosão lenta,
que carrega os sedimentos mais leves, como areia e argila, para regiões
mais profundas e inacessíveis das cavernas. Mas a água não tem força
suficiente para carregar os fósseis, que são maiores e mais pesados. E
aí eles acabam se acumulando no chão.”
A variedade era excepcional: havia tigres dentes-de-sabre,
mastodontes, lhamas – na época, elas existiam por aqui –, preguiças
gigantes, capivaras de 2 metros de comprimento, onças, porcos, veados, toxodontes (veja com seus próprios olhos) e litopternos (imagine um mamífero de corpo atlético, com cabeça de anta e pescoço comprido).
Esses animais, tão diferentes entre si, obviamente não foram
encontrados juntos porque marcavam um barzinho na caverna. Os ossos de
cada um deles foram parar lá dentro em momentos diferentes, por motivos
diferentes. “Alguns dos animais, como as preguiças gigantes,
provavelmente frequentavam as cavernas em busca de abrigo – e
eventualmente morriam lá dentro devido a inundações repentinas ou
doenças”, explica Rafael.
“Outros animais morriam no entorno da caverna, sofriam decomposição e
seus ossos eram posteriormente carregados pela água para o subterrâneo.
Também encontramos marcas de mordidas em ossos, levando a crer que um
predador possa ter carregado as carcaças para consumo no interior das
cavernas, como as onças fazem até hoje.”
Foram encontrados, ao todo, 29 taxa. Isso é quase o mesmo que dizer que foram encontrados 29 animais – mas não exatamente. É o seguinte:
Taxa é o plural de táxon. Para entender o que é táxon, vamos
voltar rapidamente ao sistema de classificação criado pelo sueco Lineu
no século 17 – que você aprendeu nas aulas de biologia do Ensino Médio.
Primeiro: todo ser vivo pertence a uma espécie – no caso de um lobo, a
espécie é lupus.
Essa espécie, por sua vez, pertence a um gênero, que é escrito em letra maiúscula (Canis lupus). Os animais que são parentes próximos do lobo são Canis também: há o Canis latrans, por exemplo (que é o coiote), e o Canis familiaris (que é o cachorro).
Os gêneros, por sua vez, são reunidos em uma família (Canidae, que inclui também a raposa). E as famílias, reunidas em uma ordem (Carnivora, que inclui… bem, os carnívoros). E assim por diante.
Às vezes, quando um paleontólogo encontra um fóssil, ele está
extremamente fragmentado – e não dá para classificá-lo ao nível da
espécie. Dá para saber no máximo a família. Ou a ordem. Então existe uma
palavra que se refere a qualquer nível de classificação, seja ele muito
ou pouco específico. Essa palavra é o tal táxon.
O Brasil é um ótimo lugar para encontrar resquícios do Pleistoceno.
As condições climáticas e geológicas da época eram propícias à formação
de fósseis, e colabora o fato de o período ser recente – ainda não houve
tempo suficiente, em termos geológicos, para a destruição dos
depósitos.
Os pesquisadores do Serviço Geológico são herdeiros de uma longa
tradição, da qual fez parte Darwin em pessoa: foi ele que descobriu os
toxodontes em sua passagem pelo Brasil durante a viagem do HMS Beagle, entre 1831 e 1836.
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